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Acreditar no Ressuscitado

D. Armindo Lopes Coelho
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Homilia do Bispo do Porto na Missa do Domingo de Páscoa

Celebramos a Páscoa da Ressurreição de Cristo, que é a verdade fundamental da nossa fé (cristã). De fora (e prouvera a Deus que não de dentro) pensar-se-á que o Cristianismo consiste num compêndio de imposições e preceitos morais, e que a ressurreição, que não tem lugar na Ciência, é um elemento secundário e vago da fé católica. Acreditar ou admitir que Deus em Cristo derrotou a morte é constitutivo da nossa fé, mas não passa como mensagem para o mundo e para a cultura que nos envolvem. Apesar da atenção que se volta hoje para o tema da Paixão de Cristo, e mesmo com tentativas de releitura dos factos e reinterpretação dos seus protagonistas, e apesar das atitudes correntes do magistério da Igreja sobre a ressurreição de Cristo enquanto acontecimento da nossa fé e não como conclusão e afirmação da história propriamente dita, um autor católico actual, familiar da Casa Pontifícia, escreveu: “Morreu†e “ressuscitou†indicam factos; são afirmações, a seu modo, históricas; “pelos nossos pecados†e “pela nossa justificação†não são afirmações históricas, mas de fé; indicam o sentido místico ou, para nós, factos... É justamente este significado de fé que, noutro sentido, faz da morte e ressurreição de Cristo acontecimentos “históricosâ€, se por facto “histórico†não entendermos somente o facto de crónica, nu e cru, mas o facto mais o significado dele... Um acontecimento é histórico quando reúne, em si, dois requisitos: “aconteceu†e, a mais, assumiu um relevo significativo determinante para as pessoas que nele estiveram envolvidas e dele fizeram a narração†(Raniero Cantalamessa, Páscoa..., Paulinas, pg. 30-31, cf. Dodd, D.H., Storia ed Evangelo, Brescia, 1976, pg. 23). (A Teologia católica, ao estilo da Historiologia, costumava falar do “acontecimento†que continuava como “facto históricoâ€). O que para a fé cristã realmente aconteceu foi que Jesus Cristo passou da morte para a vida, o que acontecerá também a nós: “Se ressuscitastes com Cristo, aspirai às coisas do alto... afeiçoai-vos às coisas do alto e não às da terra, porque vós morrestes e a vossa vida está escondida com Cristo em Deus†(Cf. Col. 3,1-4). Falando da Páscoa de Cristo, que é a nossa Páscoa, um autor medieval escrevia: “Historicamente, a Páscoa acontece quando o anjo exterminador passou pelo Egipto; alegoricamente, quando a Igreja, no Baptismo, passa da infidelidade para a fé; moralmente, quando a alma, através da confissão e da contrição, passa do vício para a virtude; anagogicamente, quando passamos da miséria desta vida para as alegrias eternas†(Cf. Cantalamessa, pg.46). Esta visão da fé e de compreensão tem como fundamento o acontecimento da Ressurreição, o impacto provocado naquele lugar e naquele tempo, a história do Cristianismo e da Comunidade cristã em Igreja, e também a diversidade dos ambientes e das culturas onde o testemunho cristão de fé se fez ouvir. O Evangelho fala-nos exactamente do primeiro impacto e das primeiras testemunhas: Maria Madalena, Pedro e o discípulo que Jesus amava. Madalena, enquanto mulher, pertencia à categoria de pessoas discriminadas, sem credibilidade oficial para os seus testemunhos. Foi a primeira pessoa que Deus escolheu para dar a notícia a Pedro e ao outro discípulo: “Levaram o Senhor do sepulcro e não sabemos onde O puseram†(Jo. 20, 2). Pedro e o outro discípulo dirigiram-se ao sepulcro. João (assim interpreta a tradição cristã) chegou primeiro: “viu e acreditou†(Jo, 20, 8). Mais tarde, Pedro tomou a palavra para resumir em discurso solene de anúncio e testemunho, em nome dos Apóstolos: “Vós sabeis o que aconteceu em toda a Judeia, a começar pela Galileia... Nós somos testemunhas de tudo o que Ele fez... e mataram-nO... Deus ressuscitou-O ao terceiro dia... Jesus mandou-nos pregar ao povo e testemunhar que Ele foi constituído por Deus juiz dos vivos e dos mortos. É d’Ele que todos os profetas dão o seguinte testemunho: “quem acredita n’Ele recebe pelo seu nome a remissão dos pecados†(Cf. Act. 10, 34 ss.). Madalena, Pedro e João. Este, o discípulo que Jesus amava, representa-nos a todos nós no anonimato discreto do Evangelho que escreveu. Ele viu (o sepulcro vazio) e acreditou. Perante e por entre situações passadas e presentes, culturas favoráveis ou adversas, crenças ou descrenças, hostilidades ou indiferenças, teremos agilidade para correr... e disposição para acreditar? Acreditar exige testemunho, por palavras e sobretudo na coerência de uma vida renovada e em tensão para uma mais perfeita identificação com Cristo, nossa Páscoa.


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