O encontro com o Islamismo e o deserto transformaram-lhe a vida. Veio a Paris falar com um director espiritual. Encontrou o Pe. Huvelin que lhe disse: «ponha-se de joelhos e confesse-se». Desde esse momento tudo mudou, Deus deu-lhe a graça da conversão. «Logo que acreditei que Deus existia, escreveu, dei conta que não podia fazer outra coisa senão viver para Ele».
1. A 13 de Novembro, a Igreja beatificou na Basílica de São Pedro, em Roma, o Irmão Pe. Charles de Foucauld, uma das figuras mais atraentes da Igreja nos séculos dezanove e vinte que marcou fortemente a espiritualidade do nosso tempo. Presidiu à cerimónia da beatificação o Cardeal D. José Saraiva Martins que, em Agosto esteve na Igreja do Monte a honrar a memória do beato Carlos de Áustria.
Nos meus tempos de estudante em Roma, nenhuma outra figura da história da Igreja contemporânea me entusiasmou tanto e a outros jovens como o Pe. Charles de Foucauld. Alimentava esta simpatia a oração humilde, silenciosa e longa, na capela de madeira, na propriedade dos Trapistas em Roma, onde as Irmãzinhas de Jesus adoravam o Santíssimo Sacramento acompanhadas por centenas de jovens.
2 - Quando o Pe. Charles foi morto em 1916 num desentendimento entre tribos rebeldes no norte de África, por ocasião da I Guerra Mundial, só 49 pessoas seguiam o seu carisma, filiadas na Congregação do Sagrado Coração de Jesus.
Hoje há milhares de homens e mulheres distribuídos por onze Congregações religiosas e oito associações de vida apostólica que seguem o seu exemplo na pobreza de vida, atendendo aos mais pobres, humildes e desprezados, procurando imitar a vida oculta e ignorada de Jesus em Nazaré.
Charles de Foucauld, apesar de ter nascido numa família nobre e cristã em Estrasburgo, na França, em 1858, seguiu o caminho do filho pródigo, teve uma juventude dissoluta, delapidou uma rica herança. Perdeu a fé aos 16 anos e viveu durante 12 anos na indiferença religiosa. Por fim entrou no exército francês e partiu para Marrocos no tempo em que a França colonizou a Argélia.
O encontro com o Islamismo e o deserto transformaram-lhe a vida. Veio a Paris falar com um director espiritual. Encontrou o Pe. Huvelin que lhe disse: «ponha-se de joelhos e confesse-se». Desde esse momento tudo mudou, Deus deu-lhe a graça da conversão. «Logo que acreditei que Deus existia, escreveu, dei conta que não podia fazer outra coisa senão viver para Ele».
Começou então um longo peregrinar procurando conhecer a vontade de Deus. Descobriu que devia imitar Jesus, principalmente na sua vida oculta e pobre. Entrou num mosteiro de cistercienses, em França, soube que havia uma trapa mais austera na Síria, depois voltou para Roma onde estudou, por fim foi instalar-se como criado e jardineiro numa casita no jardim das Clarissas de Nazaré, imitando a Jesus que ali passou a maior parte da sua vida no escondimento, como operário, pobre, desconhecido, mas nosso Redentor. Passava longas horas em adoração do Santíssimo Sacramento.
Querendo viver num lugar ainda mais pobre, já ordenado sacerdote, instalou-se no deserto da Argélia, em Beni-Abés. Passa longas horas diante do Santíssimo Sacramento. O Senhor foi o seu único companheiro no deserto. Em oração, vive como irmão de todos, recebendo pobres e doentes, estudando as línguas dos tuaregues, e escrevendo dicionários e gramáticas do mais alto nível científico, para evangelizar e para que outros missionários pudessem comunicar com aqueles pobres e ignorados do mundo civilizado.
3 - Quando lhe perguntam «porque és assim?», escreveu: «Quero habituar todos os habitantes cristãos, muçulmanos, judeus ou idólatras… a verem em mim um irmão, o IRMÃO UNIVERSAL…» Charles procura descobrir o «sagrado» que existe no outro, em todos os seres humanos, amando fraternalmente fora da sua pátria e da sua parentela.
O carisma do Irmão Charles resume-se nas duas palavras do seu lema «Jesus-Caritas». Tudo começa pelo amor de Deus Pai que se revela no seu Filho. Jesus Cristo foi o grande Amor do Pe. Foucauld. Procurou imitá-lO na vida oculta de Nazaré, contemplou-O na adoração eucarística na humilde capelinha do deserto escaldante de Tamanraset, na Argélia. Ao escrever ao seu bispo em 1908, diz: «Os meios que Jesus nos deu para continuar a obra de salvação no mundo, os meios de que Ele se serviu no Presépio, em Nazaré e sobre a Cruz são: pobreza, humilhação, abandono, perseguição, sofrimento, cruz. Eis as nossas armas».
A forma como o Irmão Charles imitou Jesus, seduziu muitos jovens e menos jovens em todo o mundo que o procuram imitar, vivendo pobres no meio dos pobres, em pequenas fraternidades de irmãozinhos ou irmãzinhas de Jesus, dispostos a viver no silêncio, escondimento, a partilha de vida com os mais desprezados, até integrando-se nas cavernas dos ciganos. São contemplativos no meio do mundo, dão testemunho do amor de Deus entre os últimos e os humilhados. São felizes, muito felizes, apesar de viverem pobres entre os mais pobres.
Os discípulos do Irmão Beato Charles são construtores do Reino, apaixonados por Jesus de Nazaré, testemunhas da Ressurreição, enamorados da Eucaristia. Quando: «Só Deus basta», resta-nos dizer como o apóstolo Paulo: «para mim, viver é Cristo e morrer um lucro» (Fil. 1, 21).
Funchal, 13 de Novembro de 2005
† Teodoro de Faria, Bispo do Funchal
“Quero amar como tu”
Meu Senhor Jesus,
quero amar todos aqueles que tu amas.
Contigo quero amar a vontade do Pai.
Quero que nada separe meu coração do teu,
que no meu coração nada haja
que não esteja imerso no teu.
Tudo o que queres, eu o quero.
Tu o que desejas, eu o desejo.
Meu Deus,
dou-te o meu coração,
junto com o teu oferece-o a teu Pai,
como algo que é teu
e que te é possível oferecer,
porque ele te pertence.
Charles de Foucauld