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Carta do Bispo de Viseu ao presbitério da Diocese

D. Ilídio Pinto Leandro
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Introdução

Neste dia de Quinta-feira Santa e neste Ano Sacerdotal, sinto desejo de comunicar com todos os meus Irmãos e Amigos Sacerdotes, meus fiéis companheiros nas tarefas de anunciar o Evangelho e de viver e celebrar a beleza da Fé em Deus Trindade e, unidos a Nosso Senhor Jesus Cristo, seu Fundador e sua Cabeça, também na Igreja. A Fé na Igreja não é muito fácil, pois encontramos muitas falhas e, tantas vezes, muitas desilusões. Como Mãe, ela transmite-nos o amor terno e profundo de Deus Salvador e presente nos múltiplos sinais. Porém e porque com uma face humana e pecadora, ela precisa da nossa dedicação e compreensão, para ser santa e orientar para a plenitude do Reino todos os seus filhos.

Nesta Igreja, santa e pecadora, os crentes encontram o porto e o abrigo que acolhe, transmite serenidade, apoia, corrige e orienta. E, também os não crentes podem encontrar 2 ‘sacramentos’ salvadores dos quais os crentes são mediadores e administradores: amor fraterno e unidade na comunhão da mesma Fé. O “vede como eles se amam” com o testemunho do amor fraterno é uma consequência visível de que seguimos Jesus Cristo; o cumprimento do testamento de Jesus – “que todos sejam Um para que o mundo creia” – é testemunho decisivo para que outros se tornem discípulos do mesmo Mestre e Senhor.

Nesta Carta que vos escrevo na Páscoa de 2010 e depois de um primeiro ponto que reflecte sobre este dia e este ano, eminentemente sacerdotais, partilho convosco uma pequena reflexão sobre 3 textos vocacionais de que gosto muito. Como precisamos de atender à dimensão vocacional na nossa Igreja!...

A seguir, coloco na ordem do dia – para todos os reflectirmos e rezarmos – 2 temas pastorais: o Plano Pastoral 2009-2010 como o último ano do triénio e o Sínodo Diocesano, a realizar entre 2010-2015, para colocar a nossa Igreja a viver mais em comunhão, segundo os grandes desafios do Concílio Vaticano II.

Termino com um sentido e justo Agradecimento e com os votos de Felizes Festas Pascais.

 

1. Caríssimos Irmãos Padres

Fomos convidados, no início desta Quaresma, a “visitar” o dia da nossa Ordenação Sacerdotal, revivendo os sentimentos, as atitudes e toda a profundidade da vida que estava subjacente naquele dia e para toda a nossa vida. É sempre muito salutar e muito enriquecedor poder voltar a sentir a alegria daquele “momento” encantador, em que se cruzou o olhar amigo do Senhor com a nossa tímida mas sentida, generosa e alegre resposta. Desejo que tenha sido uma positiva oportunidade para retomarmos o convite do VI Simpósio, celebrado em Fátima, nos princípios de Setembro de 2009: «Eu te exorto a reavivar a chama do dom de Deus que recebeste pela imposição das minhas mãos. Pois Deus não nos deu um espírito de timidez, mas de fortaleza, de amor e de sabedoria. Não te envergonhes, portanto, do testemunho de Nosso Senhor (…)» (2 Tim 1, 6-8).

Reavivar não é, somente, visitar ou voltar ‘lá’, para recordar, ainda que demorada e profundamente. Reavivar é ir até ao fundo do dom, para agir a partir do dom recebido e aprofundá-lo, guardando-o no coração. Como Maria, que guardava o dom da Palavra no coração e nela meditava noite e dia (cf Lc 2, 51). Como o Cura d’Ars e tantos outros que mantinham acesa e viva a chama da alegria na entrega, cada dia e em toda a vida.  

Este ‘reacender e reavivar a chama’ é um desafio sempre actual, na nossa vida de sacerdotes e, muito mais, neste Ano Sacerdotal, inspirado na Santidade do Cura d’Ars. Para um Sacerdote, ser santo é quase uma exigência natural, tendo em conta o conteúdo e a especificidade do nosso ministério. De facto, ainda que a eficácia sacramental não dependa da santidade do Ministro, a eficácia pastoral depende e muito, certamente. Nós somos Pastores em tudo o que somos, o que vivemos, o que dizemos e o que fazemos. Por isso, não tenhamos medo do Ministério, mas unamo-nos, muito estreitamente, ao exemplo do Bom Pastor e distingamo-nos por um estilo de vida evangélico. Ecoe nos nossos ouvidos aquele apelo da nossa ordenação diaconal, ao recebermos o Evangelho de Cristo: «Crê o que lês, ensina o que crês e vive o que ensinas». Ainda, o que ouvimos na nossa ordenação presbiteral, ao recebermos as oferendas a santificar na Eucaristia: «Toma consciência do que virás a fazer; imita o que virás a realizar e conforma a tua vida com o mistério da Cruz do Senhor».

Viver estas advertências e apelos é suficiente para conformarmos a nossa vida com a grandeza do nosso ministério, com o dom da nossa vocação e com a tarefa da nossa missão. Ser santo deveria ser, para nós Sacerdotes, como falar, como agir, como viver – acções comuns e diárias do nosso ministério. De facto, não há dúvida de que o Ano Sacerdotal é um apelo muito forte à santificação de todos os Ministros ordenados. Partimos da certeza de que o chamamento e a consagração não imunizam do erro nem da infidelidade. A fidelidade e a santidade só se conseguem quando e se a escolha e a vida dos Sacerdotes tiverem como critérios os do Evangelho, na configuração muito estreita com Nosso Senhor Jesus Cristo.

O Ano Sacerdotal é esta circunstância que aviva e torna urgente a natural necessidade de sermos santos. Nestes tempos difíceis e com alguma desconfiança sobre a Instituição Eclesial, pelo facto de tantos Sacerdotes terem manchado a nobreza da sua consagração ao serviço da evangelização e da felicidade de todos, renovemos os nossos propósitos de viver a fidelidade a Cristo, com o nosso sacerdócio, na Igreja e no Mundo. Sim: o nosso Sacerdócio é um grande dom e uma grande ‘mais valia’ para o mundo, pois o mundo precisa de Jesus Cristo e Jesus Cristo quer precisar dos Sacerdotes para estar presente. “Fidelidade de Cristo, fidelidade do Sacerdote” é o lema deste ano. Que seja o lema da nossa vida!

Nesta Quinta-feira Santa de 2010, quero meditar com todos vós, caríssimos Irmãos no mesmo Presbitério, três textos que nos devem ser muito familiares e que são fundamentais neste triénio que nos propusemos viver e que estamos quase a terminar, sob o lema geral: “Jesus Cristo, Boa Nova para um Mundo Novo”.

 

2. “Vinde e vede. Foram e ficaram com Ele nesse dia” (Jo 1, 35-42)

É, para mim, um texto vocacional muito belo e muito rico. Vejo nele três momentos decisivos pelo impacto e pelas consequências que podem ter na pastoral vocacional. Esses momentos são: a força da proposta, a beleza da experiência e a coragem do testemunho. Qualquer Sacerdote – promotor vocacional por excelência – encontra aqui uma fonte de inspiração para o dinamismo da sua acção, na apresentação aos jovens de uma bela proposta de sentido para a vida, no seguimento feliz de Jesus.

Força da proposta. Somente faz uma proposta quem está seguro do seu valor e quem pode garantir o seu êxito. João Baptista faz a proposta aos seus amigos porque entende que ela constitui uma mais valia para as pessoas de quem gosta. O mesmo faz André que, depois de conhecer Jesus, apresenta a mesma proposta ao seu irmão Pedro. Na animação vocacional, há que fazer propostas válidas e pertinentes. Porém, sabemos que só as faz quem é feliz no seu caminho e tem gosto de o partilhar com aqueles que estima e que quer ver, também, felizes.

Beleza da experiência. Imaginamos quão bela foi a experiência daqueles dois discípulos no dia que viveram na intimidade da mesma casa com Jesus. Não ousam contá-la, pois as experiências mais pessoais, mais belas e mais profundas não se descrevem, mas convida-se a que as façam e vivam. Adivinhamos a sua intensidade pela transformação operada, pela mudança que se seguiu e pela pressa em partilhá-la com outros.

Coragem do testemunho. Por experiência de todos nós, sabemos como nos custa partilhar realidades íntimas e profundamente pessoais. Por vezes, acontece como neste caso concreto – dizemos algo, abrindo o jogo, mas deixando que o outro experimente o mesmo que nós. Foi o que se passou. João Baptista e André não conseguem calar o que vivem, tanto os marcou e os confunde. Então, abrem-se com alguém que estimam, em quem confiam e para quem querem o melhor e dizem-lhe, da forma mais simples e directa, o que experimentam: “Eis o Cordeiro de Deus” e “achámos o Messias”.

Estes três momentos são, como já disse, muito importantes na nossa actividade pastoral e na necessidade de sermos agentes da vocação para chamar outros que, como nós, sigam o Senhor Jesus e Bom Pastor, na vocação sacerdotal. Para que façamos isto, importa que nos sintamos felizes no nosso caminho e que a nossa vida seja experiência gratificante, da qual gostamos de falar com alegria e de partilhar com intensidade, para que outros beneficiem da riqueza da nossa vida. É necessário, também, que os outros possam ver e possam admirar o nosso estilo de vida, as nossas atitudes comuns e o nosso comportamento habitual.

O testemunho vocacional e a proposta positiva a fazer a alguns adolescentes e jovens devem acontecer no âmbito da nossa vida pastoral e, sobretudo, na vivência do serviço paroquial, nas Comunidades Cristãs. Pode haver pessoas expressamente indigitadas para a promoção vocacional. Nunca substituem nem suprem o trabalho de proximidade, de amizade, de relação e de testemunho feito por quem vive e trabalha diariamente nas comunidades e nas famílias, como é o Pároco em cada Comunidade. Entendo que, hoje, ter um bom grupo de Acólitos, com quem se faz um trabalho simples de amizade, de formação e de oração é um bom serviço vocacional. A partir daqui, a colaboração com os mediadores vocacionais na Diocese, no Arciprestado e na Zona Pastoral é importante e decisiva para um trabalho mais organizado de discernimento e de acompanhamento.

Reflexão: A cada um dos Sacerdotes do nosso Presbitério eu gostaria de convidar a “reviver” e a “revisitar” o seu encontro pessoal com Jesus Cristo, celebrando na memória, na consciência e no projecto de vida, o “momento” de receber a “proposta” e de dar o SIM. Para ajudar, sugiro esta pequena reflexão pessoal:

- Procure fazer o enquadramento da sua vocação e lembre as pessoas importantes na sua caminhada e decisão vocacional.

- Renove, na sua memória, o dia da sua Ordenação Sacerdotal e os momentos que têm sido decisivos na sua vida de Sacerdote.

- Recorda-se de ter feito a proposta vocacional, de forma directa, a algum jovem? Terá algum(s) a quem seja conveniente fazê-lo “agora”?

 

3. “Chamou os que quis para andarem com Ele” (Mc 3, 13-15)

Este é outro dos textos vocacionais com todos os elementos para nos motivarem à acção nesta importante dinâmica pastoral. Mostra o itinerário formativo fundamental de qualquer Seminário na preparação de futuros Discípulos Missionários. O Seminário, que quer formar Pastores ao jeito de Cristo e segundo o Seu Coração, deve formar jovens para andarem com Jesus e para O seguirem, como fez Jesus com os Apóstolos. Este tempo de formação é essencial para desenvolver uma relação de comunhão e de amizade profunda com o mesmo Senhor. Ao ser ordenado, o Sacerdote torna-se, pelo Sacramento da Ordem, “imagem viva de Cristo Cabeça e Pastor da Igreja” (cf PDV 42). 

Chamou os que quis. O texto do Evangelho diz-nos, em primeiro lugar, que a vocação é uma eleição do próprio Deus. Por detrás do nosso chamamento está sempre a vontade e a liberdade de Cristo. A vida cristã apresenta-se sob o signo da liberdade. Ao vocacionado importa estar atento para responder com alegria, prontidão e disponibilidade, sabendo que a eleição e a escolha são actos de predilecção. Cada um de nós, Sacerdotes, pode e deve considerar-se o discípulo predilecto do Senhor, pois Ele ama cada um preferencialmente. Deus chama quem quer – é livre. O homem responde (e em cada dia, pois a vocação está sempre a acontecer) – é livre. Aos mediadores basta estarem atentos para acompanharem e ajudarem ao discernimento, procurando que a pessoa descubra a vontade de Deus, em cada tempo e circunstância. Hoje, há falta de vocações para o sacerdócio. Não percamos a confiança, mas peçamo-las com a oração. A falta de pessoas disponíveis para abraçar a vocação ao ministério ordenado é sinal de que faltam, no mundo, pessoas disponíveis e generosas para amarem os outros. É urgente empenharmo-nos para um feliz espírito de serviço. Pensemos e digamos com alegria e de forma consciente: “A minha vocação é o meu caminho para ser feliz”.

Jesus chamou 12 para andarem com Ele… Em segundo lugar, é importante apercebermo-nos que o centro e essencial da vocação ao sacerdócio ou, genericamente, à consagração, é andar com Jesus. Ele é o Mestre e é Quem tem o segredo das condições e dos critérios para a aprendizagem. Este andar com Jesus não é parcial ou por momentos fortes ou no tempo da formação. É essencial que o Discípulo Missionário se sinta sempre Discípulo e que entenda a Missão como um anúncio da Pessoa de Jesus Cristo, veiculando, pela palavra e testemunho, a Sua mensagem de Boa Nova. Aliás, teologicamente, andar com Jesus e por Ele ser enviado a pregar não são momentos que se distingam. Na verdade, ser e estar com Jesus são atitudes de envio e de missão. Os 12 não são “actores” que fazem apostolado – são Apóstolos. Estavam na lógica do Lógos…

(Instituiu 12). É um texto que ajuda, também, a criar unidade no Presbitério. Diz que Jesus estabeleceu 12 – “criou 12”. Eles são 12. Não são “solistas”, mas são um grupo e é como grupo que são constituídos e é como grupo que aparecem a receber a missão, a ser enviados e a evangelizar. Diz o Decreto sobre o Ministério e a Vida dos Sacerdotes que “os Presbíteros, elevados ao presbiterado pela ordenação, estão unidos entre si numa íntima fraternidade sacramental. Especialmente na diocese a cujo serviço, sob o Bispo respectivo, estão consagrados, formam um só presbitério” (PO 8). Fomos ordenados no Presbitério para viver a comunhão como Presbitério. Isoladamente não existimos. É a comunhão que se abre para a missão e esta não se compreende sem aquela. Os 72 são enviados 2 a 2; é constituído o grupo dos 12…

…Para os enviar a pregar. Quando somos “enviados a pregar”, torna-se verdadeiramente essencial que as pessoas descubram que não anunciamos uma lógica nossa, ainda que numa ideologia muito cristã, fundamentada doutrinal e biblicamente. As pessoas precisam de se encontrar com a lógica de Deus, numa transparência dos valores do Reino. É a justiça, a verdade, a vida, a graça, a santidade, o amor e a paz que as pessoas precisam de ver e de sentir, de conhecer e de seguir, para se encontrarem não connosco, nem mesmo com o peso de uma instituição como a Igreja, mas com Deus e com a Sua Boa Nova de Salvação. Onde quer que vamos e o que quer que façamos, importa que seja visto e sentido que andamos com Jesus, que falamos d’Ele e O anunciamos de forma clara. A nossa missão de pastores deve, claramente – sem dúvidas nem hesitações – apontar Jesus Cristo, como fez João Baptista aos seus amigos. Devemos mostrar que andamos com Jesus e que, portanto, o que dizemos, o que fazemos, o que vivemos e a forma como nos comportamos não deixa dúvidas a ninguém. Procurai, caríssimos Irmãos Sacerdotes, estar conscientes do que dizia o Santo Cura d’Ars: “O sacerdote possui a chave dos tesouros do céu: é ele quem abre a porta, é ele o dispensador do bom Deus, o administrador dos Seus Bens”. Ele mesmo conclui: “Um bom pastor, um pastor segundo o coração de Deus, é o tesouro maior que o bom Deus pode dar a uma qualquer paróquia e um dos dons mais preciosos da misericórdia divina”.

Reflexão: A partir deste texto evangélico, podemos fazer uma profunda reflexão sobre a nossa vida e o nosso comportamento de Sacerdotes.

 

4. “Eu sou o Bom Pastor e dou a vida pelas ovelhas” (Jo 10, 1-16)

A Parábola do Bom Pastor é, para nós Sacerdotes, o máximo de inspiração para as melhores ideias, sugestões, intuições e práticas, em ordem à nossa missão pastoral. Há algumas delas que gostaria de relevar, neste Ano Sacerdotal, convidando cada um dos meus Irmãos Padres a sentir-se muito unidos ao Bom Pastor. Assim:

Jesus é a Porta. Dizer que Ele é a Porta é o mesmo que dizer que Ele é a Páscoa, isto é, a “passagem” necessária para entrar junto da Comunidade e para sair com as pessoas para todas as iniciativas que fazem parte da nossa missão. Não há outro Messias; não há outro Evangelho; não há outro Redentor. Aliás, para além de Porta, Jesus é o Caminho a seguir e, somente passando por Ele, encontramos o Pai. Como pastores, nem são nossas as pessoas da Comunidade nem agimos a partir de nós ou dos nossos sentimentos. Agimos a partir dos sentimentos de Deus e é Jesus Quem no-los revela e dá a conhecer.

Jesus é o Bom Pastor. De facto, não o esqueçamos: há défice de pastores, ao jeito e ao estilo de Jesus. Para sê-lo, Jesus apresenta algumas condições que importa conhecer e cumprir. Em primeiro lugar, importa ter consciência que ser Pastor não é uma mera actividade, mas é uma missão que envolve toda a vida. Depois, é necessário que, no seguimento do Bom Pastor, o Sacerdote viva a sua vida espiritual “como relação e comunicação com Deus”, empenhando a pessoa na sua totalidade e “na totalidade do mistério pascal”, de modo a que ela constitua “o coração que unifica e vivifica o seu «ser padre» e o seu «agir como padre»” (cf PDV 45). A partir desta experiência pessoal, o Pastor procura introduzir cada pessoa na intimidade com Deus, conhecendo-o, seguindo-o e ouvindo a Sua voz. Em terceiro lugar, o Pastor vive para a sua Comunidade e expõe a própria vida pelas pessoas que lhe estão confiadas.

Jesus conhece as Suas ovelhas. A relação de acolhimento, de atenção, de proximidade é essencial à missão do Pastor. Jesus descreve a Sua forma de ser Pastor acrescentando três pontos, verdadeiramente decisivos: “Dou a minha vida pelas minhas ovelhas” (Jo 10, 15); “Tenho ainda outras ovelhas que não são deste aprisco. Preciso conduzi-las também” (Jo 10, 16); “Regozijai-vos comigo, achei a minha ovelha que se havia perdido” (Lc 15, 6). Estes três pontos a caracterizar a missão de Jesus, o Bom Pastor, fazem toda a diferença. Para haver este conhecimento mútuo, entre o Pastor e a Comunidade, torna-se essencial a leitura meditada e orante da Palavra de Deus como escuta humilde e cheia de amor d’Aquele que fala (cf PDV 47). “A familiaridade com a Palavra de Deus facilitará o itinerário de conversão, não apenas no sentido de se separar do mal para aderir ao bem, mas também no sentido de se alimentarem no coração os pensamentos de Deus, de tal modo que a fé, qual resposta à Palavra, se torne o novo critério de juízo e avaliação dos homens e das coisas, dos acontecimentos e dos problemas” (PDV 47). Por isso e mais adiante neste mesmo número, a mesma Exortação Apostólica diz o que importa na vida do Padre: “É necessário, portanto, que o sacerdote seja formado para uma profunda intimidade com Deus”. E, como dizia João Paulo II no Angelus de 4 de Março de 1990: “O sacerdote é o homem de Deus, aquele que pertence a Deus e faz pensar em Deus”.

Reflexão: A partir das ideias e intuições desta parábola e das principais atitudes do Bom Pastor, convido cada um a fazer uma pessoal reflexão e avaliação da sua vida sacerdotal e pastoral. Pode ajudar-nos o que nos diz João Paulo II na Exortação já citada: “O Senhor estabelece assim uma estreita conexão entre o ministério confiado aos Apóstolos e a Sua própria missão: «Quem vos acolhe acolhe-Me e quem Me acolhe, acolhe Aquele que Me enviou» (Mt 10, 40); «quem vos ouve, a Mim ouve e quem vos despreza, a Mim despreza. E quem Me despreza, despreza Aquele que Me enviou» (Lc 10, 16). A nossa missão de Pastores é, assim, condição para a realização da missão de Jesus. Não podemos proceder se não como Ele…

 

5. Plano Pastoral 2009-2010

Neste último ano do Plano Pastoral que aprovámos para este triénio, propusemos formar e designar, de acordo com as propostas e intenções das Comunidades e dos seus Pastores, alguns ministérios laicais. Juntamente com os dois que já estão actuantes na nossa Diocese e com tão rica e frutuosa actividade – Ministros Extraordinários da Comunhão e Ministros de Assembleias na Ausência de Presbítero – indicámos outros sete. Não significa que deverão iniciar-se neste ano 2009-2010 e que todos serão igualmente necessários em todas as Comunidades. Significa que estão ao dispor das reais necessidades e das diferentes possibilidades de haver candidatos e de estes aceitarem a conveniente formação e a pública designação.

Este Plano supõe uma continuidade com os anteriores, desde que, por graça de Deus, fui investido nesta responsabilidade na nossa Diocese. No ano de 2006-2007 reflectíamos na beleza e grandeza da vocação de cada pessoa – “A minha vocação é o meu caminho para ser feliz”. Em 2007-2008 fundamentávamos toda a nossa vida e acção no conhecimento, vivência e anúncio da Palavra de Deus – “O Senhor enviou-nos a viver e a anunciar a Boa Nova”. Em 2008-2009 tomámos consciência da necessidade da comunhão e da corresponsabilidade na Igreja e em cada uma das nossas Comunidades, procurando organizá-las como Comunidades adultas – “A Boa Nova é semente que cresce e se torna árvore”. Neste terceiro ano, quisemos ir mais adiante, apostando na participação e no serviço dos Ministérios Laicais, ao mesmo tempo que avançámos na preparação dos primeiros Diáconos Permanentes.

No que se refere aos Ministérios Laicais, foram apontados 7, em diálogo com os Secretariados e Serviços Diocesanos que têm a missão de preparar os respectivos Candidatos. Foi, também, reflectida, com os Arciprestes e com os Vigários Episcopais, a metodologia da sua candidatura, formação e designação. Os sete que estão propostos correspondem, assim o creio, às maiores necessidades para os nossos tempos de uma Igreja presente, atenta e actuante na Sociedade actual. Integram-se nos seguintes sectores: Pastoral Profética, Pastoral Litúrgica, Pastoral Social, Pastoral Familiar, Pastoral da Juventude, Pastoral Bíblica e Pastoral Comunitária.

É absolutamente urgente e necessário investir numa Pastoral que assente numa séria Iniciação Cristã, que olhe a Igreja como Comunidade de Baptizados com diferentes carismas e ministérios e que aposte na formação e na participação de todos os cristãos, em corresponsabilidade e valorizando a comunhão como testemunho de evangelização.

 

6. O Sínodo Diocesano 2010-2015

A partir do próximo ano, iremos viver uma experiência que, acredito, será fonte de comunhão e de renovação, procurando concretizar, mais e mais, as grandes linhas orientadoras do Concílio Vaticano II. Iremos procurar colocar em Sínodo a Igreja Particular que vive na nossa Diocese de Viseu, fazendo tudo para que as grandes intuições renovadoras do Concílio se tornem operativas na vida dos nossos cristãos e das nossas comunidades. Tudo isto, tendo em conta as mudanças e as alterações culturais e sociais entretanto havidas.

No próximo mês de Maio e confiando-nos à protecção de Maria, Mãe de Jesus e nossa Mãe do Céu – a Senhora do Altar-Mor, Padroeira da nossa Catedral – farei a nomeação e o anúncio da Equipa Preparatória. Esta Equipa será bastante alargada e irá conduzir todos os preparativos para se fazer a necessária divulgação e a conveniente sensibilização, de modo a que todos os cristãos e pessoas de boa vontade participem e construam este importantíssimo projecto.

Terá como horizonte concluir-se, enquanto conjunto de dinâmicas e de trabalhos propriamente sinodais, aquando da celebração dos 50 anos do encerramento do Vaticano II (Dezembro de 2015). Seguir-se-á a celebração de um ano especial de festa para a Igreja diocesana, coincidindo este com os 500 anos da Dedicação da Catedral (2016). Ao mesmo tempo, apresentar-se-ão as linhas fundamentais do Plano Pastoral Sinodal com vigência para os 10 anos seguintes.

Este projecto deve empenhar-nos fortemente a todos, com uma especial participação dos Sacerdotes, Religiosos e Leigos em todas as Comunidades Cristãs, concretamente os membros dos diversos órgãos de corresponsabilidade.

 

7. Agradecimento ao Presbitério

Nesta Quinta-feira Santa – dia do Sacerdócio no Ano Sacerdotal – quero agradecer ao Senhor e a cada um de vós, estimados e caríssimos Irmãos Sacerdotes, a vossa vida, a vossa vocação e o vosso qualificado e generoso desempenho, no serviço do ministério e na dedicação amiga e fraterna à missão pastoral na nossa querida Diocese.

Todos sabemos que o exercício da vida e do ministério sacerdotal não é fácil nos dias de hoje. Porém, este exercício será realizador e encher-nos-á de contentamento se for assumido com alegria, fruto de uma identidade, em harmonia com os nossos compromissos e de uma vocação, em sintonia com o chamamento e as propostas de Jesus. Se assim acontece, o esforço na perseverança no SIM será compensado pela alegria da paz e da serenidade de consciência e a obediência fiel será vista como passagem do homem que vive por conta própria para o homem que vive em Deus e por Deus. Será, quando isto acontece, um sentir em comum ou, melhor, um consentir com o Pai, uma vez que será procurar fazer a vontade de Deus. Nesta altura, obedecer assim e neste sentir e consentir com Deus, isto é, fazer a Sua vontade, será sempre realizar o mais sábio uso da liberdade.

Nunca foi fácil o exercício da missão pastoral, uma vez que supõe e exige a intolerância para com o mal e a proposta, o anúncio e a vivência dos valores do Evangelho. Sabemos como a prática das Bem-Aventuranças e a realização do Reino de Deus nunca foi, não é e nunca será pacífica. Jesus o experimentou e disso mesmo nos avisou antecipadamente. A juntar a estas convicções, experimentadas e confirmadas na história bimilenar do tempo, temos a actualidade, ávida de apontar, acusar, julgar e marginalizar a Igreja e os que a servem.

Temos consciência de que a Igreja, enquanto Instituição temporal e enquanto formada por homens e mulheres, frágeis e sujeitos a quedas e a pecados, tem muitos limites e imperfeições. Porém, se a consciência destas realidades exige atenção, esforço e heroicidade por um lado e humildade conversão e purificação por outro, nada pode diminuir a verdade, a grandeza e a dignidade da nossa missão. Muito menos, nada justifica a condenação precipitada, superficial e unilateral, a generalização fácil e injusta ou a marginalização tendenciosa e abusiva.

Por tudo isto, sempre e, sobretudo nestes tempos difíceis, pede-se de nós maior qualidade e autenticidade e pede-se entre nós maior e mais forte comunhão, mais e melhor unidade presbiteral, mais forte e mais visível amor fraterno, mais fecunda e mais duradoira entreajuda na fidelidade e no sentido de missão. Pede-se e requer-se a coerência com o lema que nos é proposto para este ano: “Fidelidade de Cristo, fidelidade do Sacerdote”.

Por tudo isto, a todos e a cada um dos meus Irmãos Sacerdotes, eu quero manifestar a minha total unidade e fidelidade ao lema que me propus viver na minha ordenação e vida episcopal: “Convosco… por Cristo… Para Todos”. A todos e a cada um dos meus Irmãos Sacerdotes, os meus sinceros agradecimentos: aos mais velhos e aos mais jovens; aos que trabalham nas 208 Comunidades Paroquiais ou nos Seminários ou nos Secretariados ou em outros e quaisquer serviços diocesanos; aos que, pela idade ou pela doença, já não podem trabalhar… A todos vós, o meu agradecimento pelo que sois e fazeis; a minha admiração pela serenidade, felicidade e paz com que viveis a vossa vocação; e a minha total solidariedade pelo empenho, generoso e feliz, que colocais na vivência da vossa missão.

A vossa vida é preciosa: para a Igreja, para a Sociedade, para o Mundo. E não somente na dimensão espiritual. A qualidade do vosso testemunho de vida, da vossa generosidade e da vossa disponibilidade, está demais demonstrada no campo social, cultural e humano. Apesar de termos defeitos e apesar de sermos tão apontados e tão acusados – parecendo que só os padres e pessoas da Igreja cometem erros – não nos envergonhemos nem nos escondamos nem tenhamos a tentação de fugir nem baixemos a face. A grandeza da nossa missão vale todo o nosso sacrifício, no seguimento do único e eterno Sacerdote que é Vítima por todos nas nossas mãos. Então e nas dificuldades de hoje e de sempre, a exemplo do nosso Mestre e Modelo – o nosso Senhor Jesus Cristo – exultemos na humildade e na verdade, procurando a nossa permanente conversão e purificando a nossa mente, o nosso coração e a nossa vida.

Somos Seguidores e Discípulos Missionários de Jesus Cristo, o Enviado do Pai. Ele chama-nos e quer contar connosco. Hoje somos tão necessários como há 2000 anos, pois não há outro nome que devamos anunciar para que o mundo seja salvo. Glória a Ele pelos séculos!

 

8. Santa e Feliz Páscoa

Na tarde deste Dia Santo, inicia-se a Páscoa do Senhor Jesus, do ano da graça de 2010, o Ano Sacerdotal. Cantemos Aleluia! Cristo Ressuscitou e, com Ele e n’Ele, realiza-se a nossa Salvação. Cantemos Aleluia! Não estamos sós. Cristo está vivo e Ele é a Páscoa. Ele passa pela nossa vida e, com a Sua passagem, todos nós ressuscitamos e temos, por Ele e n’Ele, vida em abundância.

A Páscoa é mesmo a passagem de Deus na nossa própria vida. Cantemos Aleluia! Por isso, a nossa vida é chamada a ser “nova” e com sentido “novo”. Cantemos Aleluia! Mostremos esta “novidade” no que somos, no que fazemos, no que vivemos e no que anunciamos! Mostremos esta “novidade” na beleza do nosso estilo de vida e na verdade, na seriedade e na coerência do nosso comportamento! Uma vez que ressuscitámos com Cristo, vivamos como novas criaturas e aspiremos às coisas do Alto, onde Cristo vive! (cf Col 3, 1-4).

Como Sacerdotes, unidos a Jesus Cristo – o Sumo e Eterno Sacerdote – vivamos a Páscoa, procurando, também, passar na vida dos que nos estão confiados. Assim, seremos, também, ocasião de Páscoa para todos. Cantemos, pois, Aleluia! Que toda a humanidade e toda a criação cante, também, Aleluia! Cristo ressuscitou e quem acredita n’Ele tem, na realidade, a Vida Eterna – Aleluia!

Para todos e para cada um dos Sacerdotes do nosso Presbitério, Santa e Feliz Páscoa! Aleluia!

Por vós, caríssimos Irmãos Sacerdotes, votos de Santa e Feliz Páscoa para todos os Cristãos da nossa querida Diocese de Viseu! Aleluia!

Viseu, 25 / Março / 2010, Anunciação do Senhor a Maria.

Vosso Irmão e Amigo Bispo – Ilídio



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