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Cristãos devem assumir atitudes responsáveis e construtivas na transformação da sociedade

D. António de Sousa Braga
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Mensagem de Natal de D. António Sousa Braga, Bispo de Angra

Foi com alguma expectativa e esperança que a Igreja celebrou o Grande Jubileu da Encarnação, no Ano 2000. Certamente, ninguém tinha ilusões que uma data cronológica, apesar de sugestiva, fosse a fórmula mágica, para resolver os grandes problemas da humanidade. E, infelizmente, após o início do novo milénio, a situação mundial agravou-se. Vivemos hoje num mundo dilacerado pela tragédia da guerra e do terrorismo, num cenário cada vez mais violento e brutal. Na União Europeia, mesmo com os avanços verificados, com o seu alargamento e a aprovação do Tratado Constitucional, emergem os egoísmos nacionais, criando ulteriores dificuldades em fazer vingar os ideais dos pais fundadores de uma Europa unida. Na sociedade portuguesa, com a crise financeira e económica, acentuou-se, por sua vez, a depressão psicológica do povo, que acabou por ficar baralhado com a recente convulsão política do país. Esta crise nacional ainda não se fez sentir muito fortemente na Região. As eleições para a Assembleia Legislativa decorreram com normalidade. Aí está a época natalícia, com o tradicional ambiente de festa. Mas paira no ar uma certa apreensão e difunde-se o medo do futuro. Nestas circunstâncias, que Mensagem de Natal, que não seja alienante, nem fuga da realidade? Mais do que lamentar-se, importa discernir a situação com objectividade e assumir atitudes responsáveis e construtivas. A vida é mais do que permitem os mecanismos da economia de mercado. Nem tudo depende só dos políticos de profissão, das forças partidárias e dos governantes. Têm responsabilidades acrescidas, que não podem escamotear. Mas a participação cívica não se esgota na política. Cada cidadão tem a sua quota-parte de responsabilidade pelo bem comum. Para nós crentes, celebrar o Natal de Jesus compromete-nos a trabalhar para os «tempos longos» da história humana, com a firme esperança de alcançar o que ainda não se conseguiu. Não estamos no «fim da história», mas na plenitude dos tempos, em que Deus enviou ao mundo o Seu Filho, para rasgar para a humanidade um caminho de vida com abundância. «Não temais, pois vos anuncio uma grande alegria para todo o povo: nasceu-vos hoje, na cidade de David, um Salvador, que é Cristo Senhor» (Lc 2, 10-11). Foi o anúncio dos Anjos aos pastores. É o anúncio da Igreja, que, ao celebrar o Natal de Jesus, faz memória de uma presença actual e actuante do Redentor do Homem. Para Ele convergem e n’Ele se realizam as aspirações da história e da civilização (cf. GS 45). Vivemos o calor desta proximidade, sobretudo na Eucaristia. O Ano da Eucaristia, proposto pelo Papa, não é um convite a nos alhearmos dos problemas actuais da convivência humana em sociedade. É, antes, um apelo a ir à fonte da regeneração humana. «Neste Ano da Eucaristia – recomenda o Santo Padre – haja por parte dos cristãos o empenho de testemunhar, com mais vigor, a presença de Deus no mundo. Não tenhamos medo de falar de Deus e de ostentar sem vergonha os sinais da fé. A “cultura da Eucaristia” promove uma cultura do diálogo, que nela encontra força e alimento. É errado considerar que a referência pública à fé possa ofender a justa autonomia do Estado e das instituições civis, ou então encorajar atitudes de intolerância. Se historicamente não faltaram erros nesta matéria, mesmo entre os crentes – como fiz questão de reconhecer por ocasião do Jubileu – há que atribuí-los, não às “raízes cristãs”, mas à incoerência dos cristãos face às suas raízes. Quem aprende a dizer “obrigado”, à maneira de Cristo Crucificado, poderá ser um mártir, mas nunca um algoz» (Mane Nobiscum Domine, 2004, nº 26). Como os pastores, vamos também nós a Belém, para «ver» o que aconteceu. E, como os pastores, «manifestemos» o que vimos e ouvimos, dando razão da nossa esperança (cf. 1 Ped 3, 15). Com o Natal, Deus torna-Se o «Emanuel», Deus-Connosco, companheiro da viagem da vida - «cum pane»: come o pão juntamente connosco, à mesma mesa. Aliás, Ele é o Pão: alento da caminhada. Bom Natal a todos! Sempre e apesar de tudo. Não são apenas votos. Exprimem a Promessa de Deus, que não engana, nem desilude. «Glória a Deus! Paz aos homens, por Ele amados»! + António, Bispo de Angra


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