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Deus tomou a iniciativa de salvar o homem

D. Teodoro de Faria
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Mensagem de Natal do Bispo do Funchal

«Deus arrependeu-se de criar o homem» (Gen. 6, 6) «Deus amou tanto o mundo que enviou o seu Filho… (Jo. 3, 16) 1. Esta é a mensagem do Natal: alegrai-vos porque «nasceu-vos um Salvador que é o Messias, o Senhor» (Lc. 2, 11). Os pastores, aos quais foi dirigida esta mensagem, eram considerados na sociedade judia, ladrões, ignorantes e violentos. Apesar disso dizem entre si «Vamos a Belém ver este acontecimento que o Senhor nos revelou. Foram à pressa, e encontraram Maria, José e o Menino deitado na manjedoura» (Lc. 2, 15-16). Vamos, como eles, para encontrar o Príncipe da Paz e sua Mãe e com Eles derramar o óleo da consolação sobre os que foram vítimas de qualquer violência. As primeiras páginas da Bíblia, no livro do Génesis, narram como Deus responde à violência que explode irracional no coração dos homens. Caim mata seu irmão Abel, a vingança exagera o mal recebido, em Lamech que promete uma reacção 70 vezes sete mais violenta do que a recebida (Gen. 4, 23). Deus, lê-se no livro santo, «arrependeu-se de ter criado o homem sobre a terra e sentiu a aflição no seu coração» (Gen. 6, 6). Estas páginas têm um significado simbólico para toda a humanidade. Com Noé Deus opera uma nova criação, não quer mais destruir o homem como fizera com o dilúvio, vai afrontar a violência impondo um limite e proporção entre delito e castigo. Finalmente vai enviar o Seu Filho para destruir o pecado e a morte. Isaías, o profeta das grandes visões messiânicas, descreve o mundo novo como época de paz: «o lobo e o cordeiro, pastarão juntos, o leão comerá palha juntamente com o boi»; (Is. 65, 25) mas principalmente os povos «das espadas fabricarão enxadas e das lanças farão foices» (Is. 2, 4). A violência do coração 2 - É possível falar hoje da não-violência? Pode haver uma resposta para a violência activa? Muito se tem escrito e falado sobre este tema, os episódios violentos alimentam os meios de comunicação e levam a diversos modos de pensar, uns condenando as reacções armadas e homicidas, outros defendendo a repressão como forma de fazer frente aos problemas que a violência coloca à responsabilidade dos poderes públicos. Conhecemos os mapas onde impera a violência física, psicológica, cultural e também as propostas dos grandes cultores da não-violência. Neste tempo de Natal chamo a atenção dos nossos cristãos para violência do coração descrita na Sagrada Escritura. A violência desencadeia-se sobre os seres mais frágeis e os que são incapazes de se defenderem: as crianças, as jovens enganadas e tornadas mercado de prostituição, os adolescentes influenciados pela violência televisiva, as mulheres, os idosos, sem excluir a violência espiritual das religiões que impõem atitudes aberrantes como o suicídio em massa, e o engano dos chamados mestres ou gurus que resolvem os problemas do sofrimento e do coração humano com artes de lucro e mentira. A não-violência é a procura da verdade do coração, pois neste escondem-se ressentimentos, recusa dos outros, ódios, vinganças, a morte do próximo. A não-violência cresce no interior das pessoas com o sentido de solidariedade e amor por todos os homens considerados irmãos e filhos do mesmo Pai que está nos Céus. A não-violência é uma estrada longa, difícil de percorrer, que obriga a grandes sacrifícios e até ao martírio. Ela começa na educação familiar, continua na escola, na catequese, na liturgia da Igreja, depois na vida sócio política até abranger a comunidade internacional. A não-violência é responsabilidade dos cristãos e homens de boa vontade, é mensagem profética anunciada pelos anjos aos pastores de Belém na noite em que nasceu Jesus: Glória a Deus nas alturas e paz na terra aos homens por Ele amados. A história tem em Cristo o seu centro e o seu fim, os humildes e os pobres nas mãos de Deus anulam os planos dos poderosos que julgam construir a paz com métodos violentos. As muitas formas de violência 3 - Todos os anos centenas de milhares de mulheres e crianças são objecto de tráfico e reduzidas à escravidão. Uma em cada três mulheres no mundo é constrangida a abusos sexuais, geralmente por um membro da família ou por um conhecido (Relatório da ONU 12 de Outubro). A violência doméstica é a forma mais comum de violência. Muitas mulheres vivem aterrorizadas e não reagem por medo. 50% das agressões sexuais atingem jovens com menos de 15 anos. Apesar de alguns dados positivos, a situação é preocupante. Sobre o tema das crianças não falta informação de violência recebida como de actos violentos de adolescentes contra outros da mesma idade, tanto em casa como à porta das escolas ou pelas estradas. As crianças vivem em clima de ânsia, depressão e de risco. Cada vez mais abundam situações em contextos negativos, tais como: fome, pobreza, violência, guerra; faltam palavras como amor, direitos, solidariedade, misericórdia, excepto neste santo tempo de Natal. Mas faltam vozes de crianças a falarem de si próprias como acontece, por vezes, com o movimento da Acção Católica. M. A. C. Vivemos numa sociedade violenta? As sementes de violência estão escondidas no coração humano. É preciso velar para que não criem raízes nem desabrochem flores e amadureçam os frutos. Já sofremos muito com actos violentos. Adormece-se com medo dentro da própria casa. Mas, nem tudo está perdido. Deus tomou a iniciativa de salvação. À lamentação do Génesis de arrependimento por ter criado o homem, Deus, «amou tanto o mundo que enviou o seu Filho unigénito» para o salvar (Jo.3, 16). Há lugar para a esperança. Muitos cristãos não se fecham a Deus, nem ao Espírito de Amor que Ele derrama nos corações dos seus fiéis. Esta é a mensagem do Natal: alegrai-vos porque «nasceu-vos um Salvador que é o Messias o Senhor» (Lc. 2, 11). Os pastores, aos quais foi dirigida esta mensagem, eram considerados na sociedade judia, ladrões, ignorantes e violentos. Apesar disso dizem entre si «Vamos a Belém ver este acontecimento que o Senhor nos revelou. Foram à pressa, e encontraram Maria, José e o Menino deitado na manjedoura» (Lc. 2, 15-16). Vamos, como eles, para encontrar o Príncipe da Paz e sua Mãe e com Eles derramar o óleo da consolação sobre os que foram vítimas de qualquer violência. A todos os diocesanos da Madeira, Porto Santo e dispersos entre as nações, tanto nas pacíficas como nas violentas, desejo um Santo Natal e Feliz Ano, na Paz de Deus que encerra todos os bens. Funchal, 25 de Dezembro de 2005 † Teodoro de Faria, Bispo do Funchal


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