Mensagem da Obra Católica Portuguesa de Migrações no dia de Portugal, de Camões e das Comunidades
DIA DE PORTUGAL, DE CAMÕES E DAS COMUNIDADES
10 DE JUNHO DE 2004
Mensagem da Obra Católica Portuguesa de Migrações
1. A preocupação preponderantemente “administrativa” do País face à actual Imigração, em situação de emergência social, caracterizada por desordem no acolhimento e por ensaios legislativos de “gestão” dúbia, tem deixado na penumbra política e condenado ao silêncio cultural a importante realidade nacional que é a Emigração Portuguesa.
Portugal tem de assumir, sem complexos e sem medo de perder a imagem que sonha gozar como País moderno, de que é e será um país de Emigrantes! A Emigração é uma dimensão estrutural da nossa economia e cultura. Muitos portugueses residentes - cidadãos comuns e numerosos políticos – que desconhecem a Emigração real, resistem em assumir, com dignidade e memória, esta “condição da nossa alma” e de trajectória nacional. Perpetuando a estratégia de remoção (in)consciente da Emigração do nosso imaginário colectivo e também das prioridades políticas nacionais e religiosas, permanecemos uma nação que teima em respirar a um só pulmão!
2. O mundo académico ligado à Sociologia das Migrações, a Igreja, através das suas modestas estruturas pastorais cá e lá, alguns Sindicatos e Associações de Emigrantes não se têm cansado de dizer ao País que, na década de noventa, saíram mais portugueses do que entraram cidadãos estrangeiros. A Emigração ultrapassa a Imigração: por cada imigrante a residir no País há 10 emigrantes a viver longe da Pátria. Cada ano, com conhecimento das Autoridades através do Instituto Nacional de Estatística (INE), tem saído em média 30.000 portugueses. Muitos em situação de “trabalho temporário” na União Europeia, marcado pela precariedade e indignidade, outros, para outros países do mundo, recorrendo a formas de entrada e permanência irregulares. Desde 1990 partiram perto de 300.000 portugueses. É urgente que o País recupere o discurso da Emigração real para o bem comum nacional.
3. Somos um Povo que não se entende sem a Mobilidade de dentro - do Continente e das Regiões Autónomas - para fora, assim como, do interior para o litoral. A Emigração continua a carecer de estudos comparativos feitos por peritos, de auscultação diacrónica, de apoios concretos, medidas urgentes e eficazes para encontrar novas respostas e outras solidariedades que, afinal, “os portugueses no mundo” reclamam há muito, através das suas Associações, dos seus Meios de Comunicação Social e suas Famílias.
E, se algo se tem falado recentemente sobre os emigrantes é, apenas, graças ao crescente estilo reivindicativo de emigrantes já regressados ou ex-emigrantes no querer finalmente abordar e decidir questões que continuavam a prejudicá-los e que o País ignorava e adiava. É preciso dar resposta, de modo concertado, a situações e problemas “adiados” (a nacionalidade, o apoio à língua, a dupla tributação fiscal e o apoio social); é preciso ir além da visão “administrativa” que paira sobre Emigração e que se tem limitado ás tentativas de reestruturação consular e dos gabinetes de apoio ao emigrante e emissão de alguns documentos. Urge dotar a Emigração, em situação de igualdade com os residentes, de medidas concretas e meios eficazes institucionais - financeiros e políticos - que dêem seguimento real e concreto à fase consultiva efectuada através dos interessantes “Encontros para a Participação” (dos promotores sociais, dos agentes políticos e dos meios de comunicação social da diáspora, entre outros) convocados pela Secretaria de Estado das Comunidades (SEC), da acção, com repercussões ainda diminutas, no Parlamento por parte dos deputados pela Emigração e, por fim, do renovado compromisso do Conselho das Comunidades Portuguesas (CCP) de “representatividade” das próprias categorias de emigrantes junto do Poder Central.
É hora de passar com rigor à fase da intervenção e dos investimentos concretos no capital humano que a Emigração encerra para o bem-estar dos próprios emigrantes (jovens, mulheres, famílias, empresas, escolas, associações e idosos), dos trabalhadores consulares e dos professores de português, entre outros. Tudo para uma maior afirmação da imagem do Portugal universalista e humanista e da língua de Camões, também através da Comunidade de Países de Língua Portuguesa (CPLP), no mundo.
4. Ao longo de Maio – período de um invulgar dinamismo religioso e associativo das comunidades portuguesas – foram numerosos os emigrantes que, confidenciaram à OCPM, continuarem a sentir-se “esquecidos” pelo País e “desprezados” pela Igreja. Profundamente solidária, a Igreja quer continuar o seu compromisso de ser voz destes filhos nascidos no país, mas ainda “estrangeiros” e “invisíveis” para a maioria. Por isso, a Comissão Episcopal de Migrações e Turismo acaba de convocar os delegados das Missões e Comunidades Católicas Portuguesas para um Encontro Mundial de Comunidades, a realizar no Porto de 29 a 31 de Março de 2005, sob o tema “Migrações em Portugal: ousar a memória, fortalecer a cidadania”. A Igreja pretende, deste modo, ao dar a palavra aos protagonistas das Comunidades, questionar a sua forma de estar na Emigração, actualizar o seu olhar e rever as suas estruturas de acompanhamento pastoral, com vista a garantir continuidades e aprender percursos de integração, desde a presença de Comunidades portuguesas nos Países da CPLP a outros de nova Emigração.
5. Por fim, dois apelos que têm a ver, sobretudo, com a missão de Portugal na Europa. Em vésperas de Eleições para o Parlamento Europeu apelamos a que todos os portugueses, onde quer que se encontrem no espaço da União, participem com responsabilidade neste acto cívico. Que os emigrantes saibam contrariar a tentação da abstenção e vejam no acto eleitoral, não só uma oportunidade decisiva para avaliar, nas urnas, algumas ideias de forças políticas xenófobas sobre a actual política de Migração e de Asilo da União, como também uma ocasião histórica para continuar a fazer avançar a tão almejada Europa Social, da Paz e dos Povos, de que a “cidadania” dos migrantes e refugiados são o maior desafio humano e político.
O segundo apelo tem a ver com o Campeonato Europeu de Futebol 2004. Recusando as cumplicidades do tempo, este será, sem dúvida, um momento de alegria e de festa para todos os portugueses no mundo. Contudo, as efémeras alegrias desportivas não nos podem fazer esquecer as responsabilidades sociais, o sofrimento dos mais sofridos da Emigração e da Imigração, de todos aqueles que não podem fazer festa porque continua a não haver lugar para eles à “mesa da criação”. Entre outros, lembramos ao País os compatriotas que atravessam grandes dificuldades na Venezuela, Argentina e África do Sul. Alguns encontram-se entre nós para proteger as suas vidas, direitos e bens, à espera que a situação económica e política nesses países mude, para decidirem se regressar ou não para se juntarem à família.
Por isso, pensemos nos portugueses a trabalhar e a viver no estrangeiro em situação de vulnerabilidade, e que teriam muito a ganhar, tal como as Comunidades imigrantes em Portugal, se o País ratificasse a Convenção Internacional de Protecção dos Direitos dos Trabalhadores Migrantes e Membros de Suas Famílias, em vigor há quase um ano, e que é um instrumento de Direito Internacional de grande alcance humanitário e político pelas suas consequências e medidas de aplicação a nível nacional e universal.
07.06.2004
Rui M. da Silva Pedro
Director Nacional