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Eucaristia da Ceia do Senhor

D. António Francisco dos Santos
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Homilia do Bispo de Aveiro

EUCARISTIA DA CEIA DO SENHOR Quinta-feira Santa de 2007-04-05 Leituras: Ex. 12, 1-14 1 Cor. 11, 23-26 Jo. 13, 1-15 1. “Dei-vos o exemplo, para que, assim como Eu fiz, vós façais também†(Jo. 13, 15). Na noite desta Quinta-Feira reúne-nos nesta Sé Catedral o desejo de aprender o exemplo de Jesus e de cumprir este imperativo do Mestre: celebrar a Ceia do Senhor, acolher neste sacramento do Amor o mandamento novo e lavar os pés dos discípulos. É a Páscoa do Senhor que hoje se evoca, que hoje começa e que hoje se renova em perene e eterno memorial da Aliança. Uma Aliança firmada na fidelidade com o Povo de Israel liberto da opressão no Egipto e conduzido à terra da Promessa e da Liberdade; uma Aliança celebrada na plenitude da vida de Cristo por nós entregue e do seu Sangue por nós derramado; uma Aliança continuamente renovada em santo e salvifico memorial de quem por mandato apostólico ouve em permanência a voz do Mestre: “Fazei isto em memória de Mimâ€. (1 Cor. 11, 24). Este é por excelência o dia da Eucaristia, o dia do Sacerdócio e o dia do Mandamento Novo que nasce na Eucaristia e de que os sacerdotes devem ser infatigáveis mensageiros e exemplares servidores. É à luz da Eucaristia que compreendemos que “Jesus nos amou até ao fim†(Jo. 13, 1) e de que a exemplo de Jesus também a Igreja é chamada a alimentar-se da Eucaristia para ser capaz de anunciar, celebrar e testemunhar esta capacidade de um amor sem fronteiras, nem limites, nem cálculos. 2. No percurso histórico da vida da Igreja atravessando épocas de civilização tão diversificadas e momentos de cultural tão diferentes sempre a Eucaristia foi o mistério santo e sacramento de fé e de vida onde a Igreja diariamente se edifica, se alimenta e se congrega; através do qual a Igreja se torna fonte de vida para os crentes e sinal de salvação para o mundo. Retomando o dinamismo evangelizador do Grande Jubileu do Ano 2000, o aprofundamento teológico e o entusiasmo espiritual que o Ano da Eucaristia – a última iniciativa pastoral de João Paulo II – trouxe à Igreja e na continuidade do Sínodo dos Bispos de 2005, o Santo Padre Bento XVI publicou no passado dia 22 de Fevereiro uma Exortação Apostólica sobre a Eucaristia dando-lhe como título “ Sacramento do Amorâ€. Escrita em sintonia e unidade com a sua Primeira Encíclica “Deus é Amor†o Santo Padre procura dar voz, consistência e autoridade universal às sugestões, propostas e reflexões dos Bispos delegados ao Sínodo e provenientes de todo o mundo católico. Convido os sacerdotes, diáconos, religiosos(as), consagrados(as), leigos e leigas de toda a diocese a lermos demoradamente e aprofundarmos em sede de grupos e movimentos apostólicos e nos percursos das nossas Comunidades cristãs esta Exortação Apostólica. Não silenciemos com o nosso desinteresse pela leitura, pelo estudo e pela reflexão a voz do magistério da Igreja, que deve ser sempre fonte de sabedoria e de santidade a iluminar a inteligência dos crentes, a orientar o sentido da vida dos cristãos e a estabelecer pontes de diálogo entre a fé e a cultura, entre a Igreja e a sociedade. Também nós devemos interrogar-nos com S. Agostinho: “ Que pode a alma desejar mais ardentemente do que a Verdade?†3. Permito-me retomar neste dia e nesta celebração algumas das ideias sublinhadas pelo Santo Padre e que pastoralmente gostaria de ver fortalecidas na vida dos cristãos e nas Comunidades cristãs desta Igreja Diocesana. “A Eucaristia é por excelência mistério de fé: é o resumo e a súmula da nossa fé. A fé da Igreja é essencialmente fé eucarística e alimenta-se de modo particular, á mesa da Eucaristia. A fé e os sacramentos são dois aspectos essenciais e complementares da vida eclesial.†(E. A. 6). Na Eucaristia vamos ao âmago, ao essencial da nossa fé descobrindo o amor de Deus que nos dá o seu Filho “para que o mundo seja salvo†(Jo. 3,17) e descobrimos ainda pela fé que Jesus, o Filho de Deus na Eucaristia não nos dá “alguma coisa†mas dá-se a Ele mesmo: entrega o seu Corpo e derrama o seu Sangue: “Eu sou o Pão vivo que desce do Céu†(Jo. 6, 51) A missão da Igreja consiste essencialmente nisto: dar Cristo ao mundo, faminto de verdade, à procura de caminhos de liberdade e tantas vezes em desencontros múltiplos com a vida. A Eucaristia dá-nos Cristo: “caminho da verdade e da vida†(S. Agostinho). Como podem os cristãos afirmarem que têm fé se não alimentam na Eucaristia? Como podem os cristãos evangelizarem o mundo se não lhe oferecem Cristo como alimento da verdade e da vida? Como pode a Igreja ser sacramento de amor celebrado na Eucaristia se não alimentar nos cristãos o amor pelos sacramentos em procura assídua e vivência espiritual aprofundada? A Páscoa antiga passou. Já não há necessidade do Cordeiro imolado. Ele era apenas figura da nova e eterna aliança celebrada em Cristo e oferecida em cada Eucaristia. “Cristo é o verdadeiro Cordeiro pascal, Cordeiro de Deus que tira o pecado do mundo†(E. A. 9). “ A Eucaristia é, assim, constitutiva do ser e do agir da Igreja†(E. A. 14). “Na celebração da Eucaristia encontra-se na sua Igreja, isto é, na Igreja de Cristoâ€. (E. A. 15). Esta raiz Eucarística da nossa fé em nada belisca o esforço de comunhão ecuménica, pelo contrário “pode contribuir eficazmente para o diálogo com as Igrejas e com as Comunidades eclesiais que não estão em plena comunhão com a Sé de Pedroâ€. 4. Nunca esquecendo o plano pastoral da nossa diocese que nos convida sem cessar a “colocar a Igreja ao Serviço da Família†faz-nos bem sublinhar a palavra do Santo Padre no nº. 19 da Exortação Apostólica: “Na acção pastoral, sempre se deve associar a família cristã ao itinerário de iniciação, sabendo que a iniciação cristã tem como ponto de referência tornar possível o acesso ao sacramento da Eucaristia. Devemos interrogar-nos se as nossas comunidades cristãs têm suficiente noção do vínculo estreito que há entre Baptismo, Confirmação e Eucaristiaâ€. (E. A. 17 e 19). Como pode a família crescer na fé sem a Eucaristia? Como podem as nossas Comunidades ajudar as famílias e os seus filhos a consolidarem um verdadeiro itinerário catequético de iniciação cristã se as famílias não acompanham as crianças nesta experiência comum da participação da Eucaristia? “Receber o Baptismo, Confirmação e abeirar-se pela primeira vez da Eucaristia são momentos decisivos não só para a pessoa que o recebe mas também para toda a sua família.†(E. A. 19). “A família – igreja doméstica – é um âmbito primário da vida da Igreja, especialmente pelo papel decisivo que tem na educação dos filhos.†(E. A. 27). Mas o Santo Padre estabelece uma relação estruturante entre a Eucaristia e a unidade e a indissolubilidade do Matrimónio ao manifestar uma “particular solidariedade espiritual a todos aqueles que fundaram a sua família sobre o sacramento do Matrimónio†e ao afirmar que “o vínculo fiel, indissolúvel e exclusivo que com Cristo e a Igreja tem expressão sacramental na Eucaristia e esta de harmonia com o dado antropológico primordial†que defende o Matrimónio uno e indissolúvel. (E. A. 28-29). Mas a Eucaristia não é apenas um mistério acreditado. É também um mistério celebrado, adorado, contemplado, vivido, anunciado e oferecido ao mundo. A Eucaristia é verdadeiro pão repartido para a vida do mundo, alimento da verdade e da indigência da humanidade, com implicações sociais e desafios evangelizadores permanentes a oferecer-nos a possibilidade maior de promover a vida, defender a criação e santificar o mundo. 5. “Dou-vos um mandamento novo: amai-vos uns aos outros como eu vos amei†(Jo. 15, 12), disse Jesus aos discípulos reunidos no Cenáculo nesse momento sublime de maior confidência antes da hora da paixão, da condenação e da morte. Uma das formas mais benéficas e preciosas da Igreja cumprir este mandamento e de viver hoje a pedagogia do serviço de que o lava – pés é exemplo emblemático, consiste em proporcionar com renovado e infatigável empenho aos crentes baptizados o gosto, o encanto e a beleza da Eucaristia. Consiste em ajudar a sociedade e o mundo a descobrir o imenso e insubstituível contributo que a Eucaristia oferece à partilha fraterna dos bens, à atenção solidária com os pobres, à compaixão com os que sofrem, à construção da paz social e da comunhão humana, sem distinções nem descriminações de raças, de culturas ou de povos. É urgente para os cristãos reencontrar o caminho da Eucaristia e do Cenáculo. A Eucaristia, Sacramento do Amor, é sempre a fonte e o início da vida e da missão da Igreja para que as pessoas encontrem o sentido do valor da vida e o mundo o caminho da justiça, do perdão e da paz. Que Nossa Senhora, a Virgem de Nazaré, a mulher eucarística, Mãe da Igreja, que acolheu incondicionalmente o dom de Deus e desta forma ficou associada à obra da salvação nos ajude a saber acolher a doação que Jesus fez de Si mesmo na Eucaristia. Ãmen. António Francisco dos Santos Bispo de Aveiro


Diocese de Aveiro