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Homilia de D. Antoine Audo na Festa da Conversão de São Paulo, celebração nacional do Ano Paulino

Santuário de Fátima
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Caros Irmãos no Episcopado e no Sacerdócio, Amados Irmãos e Irmãs, Neste Ano Paulino, que o Papa Bento XVI (dezasseis) declarou jubilar e que tem honrado com a sua catequese semanal, a nossa celebração, na festa da conversão de São Paulo e em Fátima, neste tão importante lugar de peregrinação, tem um significado muito particular. Todos nós que viemos, de perto ou de longe, a este santuário profundamente simbólico para a Igreja em Portugal e para a Igreja universal, deixemo nos tocar pela graça da conversão de São Paulo; peçamos, por intercessão de Nossa Senhora de Fátima, a graça de nos deixarmos conduzir para Cristo; e, para todas as nações em guerra, peçamos o dom da reconciliação e da paz. Que estes países transformem «as espadas em relhas de arado e as lanças em foices» (Is 2, 4,). Estou muito reconhecido aos meus irmãos bispos de Portugal, por me terem dado a oportunidade de estar hoje no meio de vós e de presidir a esta celebração eucarística. Assim quiseram, convidando um bispo da Síria e da Igreja dos Caldeus, exprimir de um modo sensível, diria mesmo quase físico, a comunhão com as origens do cristianismo, que vive a Igreja presente em todo o mundo. É verdade, São Paulo nasceu em Tarso, na Turquia, muito perto de Alep, onde se situa a minha sede episcopal, e converteu se às portas de Damasco, capital do meu país, a Síria. Nesta região tão provada do Médio Oriente, os cristãos vivem lado a lado com os muçulmanos, em diferentes países dilacerados por guerras: Israel e Palestina; Iraque ensanguentado por conflitos étnicos e religiosos e onde os cristãos, nomeadamente da Igreja dos Caldeus, estão ameaçados de desaparecer; enfim, o Líbano, assediado entre guerra e lutando pela paz. Sim, nestas terras bíblicas das origens cristãs da nossa fé, os cristãos do Médio Oriente querem ler a experiência da conversão de São Paulo, neste ano jubilar, como um grito de esperança lançado a toda a Igreja. O encontro de Paulo com Cristo no caminho de Damasco transformou o, transfigurou o. Toda a verdadeira graça é comunicável; toda a graça tem a sua fonte em Jesus, porque «a Lei foi dada por Moisés, mas a graça e a verdade vieram-nos por Jesus Cristo» (Jo 1, 17). «É em Cristo, pelo seu sangue, que temos a redenção, o perdão dos pecados, em virtude da riqueza da sua graça» (Ef 1, 7). Hoje, deixemo nos alcançar por esta graça da conversão. Com Paulo e todos aqueles que se deixaram agarrar pela graça do Evangelho, – e são tão numerosos! – façamos a releitura das nossas próprias conversões pedindo que elas se tornem sinais do amor de Deus por cada um de nós, e lugar de verdadeiro crescimento na fé, caminhando com todos os que nos rodeiam. I. A conversão de São Paulo, que nós celebramos hoje, inscreve se numa longa história bíblica. Façamos um momento de reflexão e meditação para nos tornarmos contemporâneos dos nossos Pais na fé, e peregrinos da busca do rosto de Deus: «O meu coração anseia por ti, os meus olhos te procuram; é a tua face que eu procuro, Senhor. Não desvies de mim o teu rosto» (Sl 27, 8 9). Toda a história da revelação bíblica não pode compreender se à margem dum encontro pessoal entre Deus e o homem criado à sua imagem. Desde o começo, Deus quer se comunicar e quanto mais o homem acolhe a palavra de Deus e a medita no seu coração, mais a glória de Deus o transforma. Aprisionado pelo medo, o homem pode resistir ao chamamento de Deus, fugir e mesmo deformar o rosto do Senhor. Este combate da fé é também o nosso, como o foi dos nossos pais na fé que, pelo seu combate, abriram o caminho da conversão de Paulo. Abraão renuncia aos ídolos da sua família para escolher um Deus pessoal, aceita ser provado pelo sacrifício do seu filho Isaac, e sai desta prova com uma fé absoluta na fidelidade de Deus à sua Aliança. Moisés, sendo violento e desertor, torna se chefe do seu povo e testemunha de um Deus Salvador, lento para a ira e cheio de amor, desafiando o seu povo a crescer na confiança e na liberdade. Elias, o inimigo dos falsos profetas de Baal, defensor do pobre Nabot, aprende através de uma longa caminhada espiritual, a ler os sinais dos tempos, no murmúrio duma brisa suave, sinal da presença de Deus no coração daquele que se deixa conduzir pelo Espírito. Paulo é desta linhagem de Patriarcas e Profetas; ele era muito cioso de todos os privilégios herdados da família e da sua fé judaica; era capaz de todas as atrocidades para defender Deus e a lei de Moisés; Paulo estava cheio de ódio para com os cristãos. São Paulo, o fariseu que ardia no zelo da Lei (Fl 3, 6), uma vez convertido, descobre que este Jesus em que ele via, com horror, o destruidor da tradição religiosa de Israel, era pelo contrário o herdeiro porque era o fundador. A palavra dos profetas era já o seu Evangelho (Rm 1, 2). A Lei tinha sido dada a Israel para que, na plenitude dos tempos, Deus pudesse enviar o seu Filho, «nascido de uma mulher, nascido sob o domínio da Lei… a fim de recebermos a adopção de filhos» (Gl 4, 4 5). Todas as cartas de Paulo, todo o trabalho que realizou para fundar as Igrejas, todos os sofrimentos que suportou com determinação e alegria, têm a sua origem neste encontro com Jesus no caminho de Damasco. Jesus, morto e ressuscitado, torna se para ele a explicação última da Lei, a Boa Nova a anunciar a todas as nações. II. Permiti me agora que vos conte uma bela história da conversão de um jovem Curdo de origem muçulmana, que eu conheci em Alep. Jiwan, baptizado com o nome de João Baptista, chegado à idade de vinte anos, vivia num vazio total, na solidão que é o grande paradoxo da mundialização. Ao ver que um cristão foi excluído da sua escola e catalogado como infiel, encontrou o rosto de Cristo ao ler o Evangelho e tornou se pouco a pouco o bom samaritano deste cristão perseguido. Jiwan viveu uma experiência de conversão. De um jovem amargurado com a vida, sacudido pelos ventos dos fanatismos e dos medos, tornou se um jovem atento aos outros, membro vivo de uma comunidade cristã, testemunha da graça que o transformou. Doravante Jiwan usa o nome de João Baptista, caminhando no seguimento de Cristo e chamando outros jovens a encontrar Jesus. Numa Europa cada vez mais secularizada, e que exclui o próprio Cristo, a Igreja e os cristãos, fixemo nos na coragem deste jovem que, por causa da exclusão e do ódio, acaba por encontrar o amor de Jesus, amor de comunhão e de liberdade. III. O Deus em que acreditamos não é um Deus estático. Não nos fecha no passado e não aceita que fiquemos paralisados pelos nossos medos. O nosso Deus está vivo e faz se próximo e solidário. Não habita nos longínquos céus, nem se esconde nas distâncias inacessíveis. Pelo contrário, Deus encontra a sua alegria no seu povo: Ele é o Emanuel, Deus connosco. É Ele que vem para se dar todo, sem nada nos tirar. Assim como Cristo veio ao encontro de Paulo no caminho de Damasco, assim como estava presente no coração dos combates dos Patriarcas e dos Profetas que buscavam a sua face, assim como Cristo se deixou encontrar por este jovem Curdo muçulmano no quotidiano da sua vida distante da fé cristã, também o mesmo Cristo vem hoje, pessoalmente, ao nosso encontro. A conversão é uma graça pessoal e comunicável; a conversão é para cada dia; e significa deixar se transformar pela presença de Cristo. Na sua última encíclica, «Spe salvi», o Papa Bento XVI (dezasseis) não se refere directamente à conversão, mas, ao falar da oração, diz nos que é «um processo de purificação interior que nos torna aptos para Deus e, precisamente desta forma, aptos também para os homens». E o Papa continua: na oração, o homem «deve purificar os seus desejos e as suas esperanças. Deve libertar se de mentiras secretas com as quais se engana a si mesmo» (n. 33). Numa palavra, o homem está chamado à conversão, chamado a tornar se peregrino no seguimento de Cristo. Neste belo Ano Paulino, na festa da conversão de São Paulo, que celebramos no Santuário de Nossa Senhora de Fátima, cuja mensagem evangélica nos exorta à penitência, à conversão, façamos nossa a meditação final do Santo Padre na sua encíclica «Spe salvi»: «A Igreja saúda Maria, a Mãe de Deus, como «Estrela do mar»: Ave maris stella. A vida humana é um caminho. Rumo a qual meta? Como achamos o itinerário a seguir? A vida é como uma viagem no mar da história, com frequência enevoada e tempestuosa, uma viagem na qual perscrutamos os astros que nos indicam a rota. As verdadeiras estrelas da nossa vida são as pessoas que souberam viver com rectidão. Elas são luzes de esperança. Certamente, Jesus Cristo é a luz por antonomásia, o sol erguido sobre todas as trevas da história. Mas, para chegar até Ele precisamos também de luzes vizinhas, de pessoas que dão luz recebida da luz d'Ele e oferecem, assim, orientação para a nossa travessia. E quem mais do que Maria poderia ser para nós estrela de esperança? Ela que, pelo seu «sim», abriu ao próprio Deus a porta do nosso mundo; Ela que Se tornou a Arca da Aliança viva, onde Deus Se fez carne, tornou-Se um de nós e estabeleceu a sua tenda no meio de nós (cf. Jo 1,14)» (n. 49). D. Antoine Audo, Bispo de Alepo para os Caldeus, Síria


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