Homilia de D. Joaquim Mendes, bispo auxiliar de Lisboa, na Missa das Universidades
“Ide e anunciai”
1.Fostes convocados para esta celebração de encontro e envio.
Encontro com Cristo Palavra e com Cristo Eucaristia.
Encontro entre vós, estudantes, professores e funcionários das Escolas Superiores de Lisboa, comunidade crente, que confessa Jesus como seu Senhor e compartilha com Ele vida e missão.
Do encontro com Cristo Palavra, que acabamos de celebrar, emerge o mandato da missão universal que Cristo ressuscitado confia aos discípulos antes de parir para o Céu: “Ide por todo o mundo e pregai o Evangelho a toda a criatura”.
Jesus convida os discípulos a deixarem Jerusalém, a deixarem o mundo judaico, o seu mundo, para irem ao encontro de outros mundos, outros ambientes, outras pessoas, porventura desconhecidas, e partilharem com elas o Evangelho, a Boa-Nova da salvação, a própria experiência vivida no discipulado com Jesus.
2. Evangelizar é, antes de mais, partilhar a própria experiência cristã, o encontro com Cristo, que fez mudar a própria vida.
Tornou-se celebre o a afirmação do Papa Paulo VI, na exortação apostólica sobre a evangelização (8 dezembro de 1975): «O homem contemporâneo escuta com melhor boa vontade as testemunhas que que os mestres ou então se escuta os mestres, é porque são testemunhas” (41).
O Papa Paulo VI recorda-nos que o testemunho é indispensável para o anúncio do Evangelho. O «Ide e ensinai» tem de ser acompanhado de credenciais que tornem credível o ensino, a mensagem e o mensageiro.
O ensino pressupõe o discipulado. Foi o que fez Jesus: antes de enviar os discípulos a anunciar o Evangelho, fê-los fazer uma forte experiência de discipulado, vivendo com Ele, caminhando com Ele pelas estradas da Palestina, encontrando as pessoas, escutando e vendo com os próprios olhos os seus gestos e as suas escolhas de vida, fazendo a experiência de uma nova realidade: o Reino de Deus que se tornava forma de vida, história quotidiana.
É esta experiência de vida com o Mestre que torna os discípulos capazes de viver o Evangelho, de o testemunhar com a própria vida e de o anunciar corajosamente, realizando o mandato do «ide e ensinai».
3. Discipulado significa meter-se a caminho, como os apóstolos com Jesus, para aprender a viver a vida ao estilo do discípulo, aprender como tornar presente Deus e o Reino, na complexa realidade do nosso mundo.
Discipulado significa caminhar com Cristo, estar com Ele, e aprender dele, para dar cumprimento ao seu mandato, de «ide e ensinai».
Estou convencido que quem se sente continuamente e para sempre discípulo, quem assume o estatuto cristão de discípulo, é que é capaz de se tornar testemunha, hoje, amanhã e sempre.
Discipulado significa grande disponibilidade e abertura para aprender com todos, ter sempre sede de melhorar e fome de mudar, para poder estar à altura dos problemas de hoje, dando uma resposta sempre mais adequada, verdadeira e autêntica, estando sempre prontos a dar a razão da própria esperança a todo aquele que a peça (1 Pe 3,15).
Discipulado significa viver em permanente discernimento para compreender melhor como viver hoje a fé, como partilhá-la; como testemunhá-la, como contagiar os outros com ela; como ler e interpretar os sinais de sentido e de esperança; como decidir-se, com escolhas livres e responsáveis, para oferecer sentido e sinais de esperança.
Ser discípulo para ser apóstolo, para realizar o «ide e ensinai», para tornar percetível o Evangelho e os «milagres» que ele opera em quem o acolhe.
4. Este é o dinamismo que urge recuperar: ser discípulos para se tornarem testemunhas, e poder, de verdade, ensinar. Fazer um ensinamento novo, como o de Jesus, que se funda sobre o testemunho e não meramente sobre o conhecimento.
O mundo tem necessidade de testemunhas. Para evangelizar o mundo de hoje é necessário assumir o modelo da Igreja primitiva de Jerusalém, formada por pessoas que tiveram uma forte experiência espiritual que mudou as suas vidas, e que experimentaram a força da comunidade até ao ponto de serem um só coração e uma só alma.
A comunidade cristã, a Igreja, para cumprir a missão universal do «ide e ensinai» que o Senhor Jesus lhe confiou, não pode limitar-se a ensinar, mas a ensinar e testemunhar.
É relativamente fácil ser mestre, mas muito mais difícil ser testemunha. No mundo de hoje não faltam mestres, verdadeiros e falsos, mas escasseiam as testemunhas. A testemunha fala com a vida, com a coerência, com a humildade, com a atitude de disponibilidade, com a conceção da vida como serviço, como dom recebido para ser doado, com a generosidade, com a doação a exemplo de Cristo.
A testemunha comporta-se segunda a maneira de viver a que foi chamada, como recomenda S. Paulo, na primeira leitura. Honra a sua vocação, a sua eleição de filho de Deus e membro da Igreja, comportando-se segundo a maneira de viver própria do cristão, em que há coerência entre a fé e a vida, entre o dizer e o fazer, assumindo as virtudes cristãos da humildade, da mansidão, da paciência, da caridade, que faz dela transparência do rosto de Cristo.
5. A voz das testemunhas é muito mais forte que as dos mestres, porque nelas ressoam uma profundidade de vida que vem do discipulado. As palavras das testemunhas estão carregadas de vida e têm um peso enorme, têm a capacidade de insidiar-se no mais profundo dos corações, e de gerar novos estilos de vida.
As palavras das testemunhas são plasmadas pelas Palavras de Deus, por isso têm a capacidade de tocar os corações, de os converter, e de se tornarem luz de um novo caminho.
O desafio é pois ser testemunhas para adquirir a capacidade e a força para dar cumprimento ao «ide e ensinai». Testemunhas que tornem a Palavra de Deus vida da própria vida, pão quotidiano que alimenta os próprios compromissos, luz que faz ver que escolhas fazer para ser verdadeiros cristãos.
O desafio é pois ser mais e melhores testemunhas, para ensinar a todos a beleza e a profundidade do discipulado e do seguimento de Cristo Ressuscitado.
6. O Santo Padre Bento XVI, no encontro com jovens professores universitários, quando da recente Jornada Mundial da Juventude, sublinhou a necessidade de mestres autênticos, de homens e mulheres que se se devotem a propor e a valorizar a fé perante a inteligência dos homens, e que “para o fazer, não basta ensiná-lo, é preciso vivê-lo, encarná-lo, à semelhança do Logos que também encarnou para colocar a sua morada entre nós”.
Neste sentido, acrescentou o Papa, os jovens precisam de mestres autênticos; pessoas abertas à verdade total dos diversos ramos do saber, capazes de escutar e viver dentro de si mesmos o diálogo interdisciplinar” (Madrid, mosteiro de São Lourenço do Escorial, 19 agosto 2011).
Aos jovens, o Papa desafiou a tornar visível a presença de Deus, a abrir fronteiras e a criar espaços de amizade.
Dar visibilidade à fé e à presença de Deus no mundo, através de uma vida crente e coerente com o Evangelho. Abrir fronteiras para que o anúncio chegue mais longe. Criar espaços de amizade que abra caminhos para a fraternidade e para a universalidade da comunhão e que “torne visível que é bom estarmos com Deus e que Deus está connosco”.
7. Assumi a maravilhosa aventura de crer, de dizer e testemunhar a própria fé na própria vida, de ser discípulos que seguem Cristo e apóstolos que o anunciam.
Concluo com as palavras do Santo Padre, na homilia da missa de encerramento da Jornada Mundial da Juventude (Base Aérea dos Quatro Ventos, Madrid, 21 de agosto de 2011): “O mundo precisa do testemunho da vossa fé; o mundo necessita de Deus”. “Não guardeis Cristo para vós mesmos. Comunicai aos outros a alegria da vossa fé”. Sede discípulos que o seguem e missionários que o anunciam e testemunham!
Que o encontro com Cristo Eucaristia, que se segue, reforce a vossa fé, revigore a vossa esperança e leve “a responder com amor a Quem por amor se entregou por nós”.
Missa das Universidades, igreja do Sagrado Coração de Jesus
20 de outubro de 2011
D. Joaquim Mendes, bispo auxiliar de Lisboa
Diocese de Lisboa