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Igreja deve construir uma cidade de rosto humano

D. José Policarpo
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Introdução de D. José Policarpo à reunião sobre políticas na cidade

Agradeço-vos o terem aceite o nosso convite para uma reflexão sobre a problemática das nossas cidades. Este encontro situa-se na continuidade de outros já realizados em que, à volta desta mesma mesa, nos reunimos para reflectir sobre várias dimensões da vida da comunidade humana a que pertencemos. A Igreja faz parte da cidade e interessa-se por tudo o que é relevante para a construção de uma sociedade de rosto humano. Não eram todos crentes os que aceitaram vir reflectir connosco, mas sentimos que todos respeitavam a Igreja e reconheciam a importância do seu papel específico na construção da cidade. A temática deste encontro situa-se no contexto de uma iniciativa internacional de grande envergadura em que a Diocese de Lisboa participa: o Congresso Internacional da Nova Evangelização, que integra uma Missão na Cidade. E para isso nós precisamos de conhecer a cidade, a quem queremos anunciar uma mensagem de esperança que, assim o acreditamos, potenciará toda a generosidade, engenho e competência de quem se dedica à construção de cidades de rosto humano. E ninguém está melhor colocado do que vós para nos ajudar a conhecer a cidade. Concebemos a evangelização como um diálogo da Igreja com a sociedade e com as pessoas, um diálogo sincero e respeitador. Já desde os tempos apostólicos a Igreja é convidada, em todas as circunstâncias, a dar testemunho da esperança que tem e essa esperança tem a sua fonte na nossa fé em Jesus Cristo e na força construtiva que Ele introduziu na História. Na recente Exortação Apostólica sobre a Igreja na Europa, João Paulo II, na sequência de um Sínodo dos Bispos em que tive a alegria de participar, reafirma a convicção da Igreja: Jesus Cristo é a única verdadeira fonte de uma esperança perene e renovada para a futura evolução do Continente. Se nós acreditamos sinceramente nisto, não podemos deixar de O anunciar e a maneira mais civilizada de o fazer é entrar em diálogo com todos aqueles e aquelas que generosamente se dedicam à construção de uma “nova Cidadeâ€. O que é que a fé em Jesus Cristo pode trazer de mais valia para a edificação da cidade dos homens? É específico da fé cristã, através da acção do Espírito, potenciar e aprofundar todos os dinamismos positivos de competência e de ideal que pomos na construção da “casa comumâ€: uma cidade que promova a realização e a felicidade das pessoas, que suscite pela harmonia e pela beleza, a descoberta da beleza da vida em comunidade. Uma cidade que promova a solidariedade e a alegria de conviver, que garanta espaços e momentos de fruição cultural e de expressão espiritual. Para construir uma cidade de rosto humano, não basta o arrojo técnico das infra-estruturas; é precisa a utopia de quem acredita que a cidade só será humana se nela as pessoas tiverem espaço onde possam espontaneamente construir a sua felicidade. Raul Follereau escreveu um dia que as cidades modernas são sacrílegas porque, ao desenvolverem-se, não tiveram em conta a felicidade dos cidadãos; porque não deixaram lugar para o amor e para a contemplação, porque não coordenaram os lugares de trabalho com os transportes e a habitação. E exemplifica: quando os esposos, um pai ou uma mãe, gastam três ou quatro horas do seu tempo em transportes, foi-lhes roubado o tempo para amar e construir a felicidade. Coloca-se-nos a todos o desafio da dimensão espiritual e transcendente do homem no planeamento da cidade, o que significa saber o que é o homem, na complexidade da sua realidade misteriosa e do exercício da sua liberdade. Ajudai-nos a conhecer a cidade, na complexidade da sua realidade humana. A Igreja procurará anunciar a esperança e objectivar a utopia. Patriarcado de Lisboa, 9 de Dezembro de 2004, † JOSÉ, Cardeal-Patriarca


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