Bispo do Funchal pede respeito pelos novos imigrantes
A legislação deve assegurar o respeito pelos novos imigrantes mas exigir-lhes também a observância das regras de convivência da sociedade que os acolheu. Direitos e deveres para todos, mas evitando também que os erros e abusos de alguns não levem a uma diminuição da tutela dos direitos humanos fundamentais sobre os inocentes.
1. Celebrou-se há um mês o 92º Dia Mundial do Migrante e Refugiado. O Papa João Paulo II tinha pedido para que em todo o orbe católico, se celebrasse nesse mesmo dia, a 15 de Janeiro, o Dia Mundial sob o título «A caridade de Cristo para com os migrantes». Em Portugal, devido à celebração mariana em Agosto com a presença de tantos emigrantes portugueses, é difícil modificar uma tradição adquirida, mas o Dia Mundial vai mais além, ele dirige-se a todas as comunidades cristãs para serem «intérpretes», à luz do evangelho da «fraternidade reconciliada», «sinal do encontro do homem com Deus e da missão do género humano» como afirma o Concílio Vaticano II na Gaudium et Spes (nº1).
Os cartoons com as caricaturas de Maomé provocaram uma reacção fortíssima de actos violentos nos países muçulmanos e aumentaram a suspeita de que os discípulos do profeta não estão em condições de viverem nos países ocidentais onde a liberdade de opinião não admite barreiras. Esperamos que os Estados não se deixem atemorizar e se empenhem nos programas e legislação já anunciados a favor dos imigrantes e refugiados, principalmente no que diz respeito ao direito a viver em família, a gestão inteligente dos fluxos, a dignificação do trabalho, a cooperação com os países de origem.
2 - A emigração é um dos mais significativos factores do processo em acto da mundialização que envolve cerca de 200 milhões de seres humanos. A pressão migratória que se origina nas fronteiras da Europa, é problema dos países pobres, mas também dos países de acolhimento. Quando a nível internacional se negoceia a redistribuição da riqueza no mundo, os Estados tornam-se rígidos de mente e coração.
O processo emigratório não é porém um acontecimento transitório, é um fenómeno estrutural que diz respeito ao novo ordenamento do mundo e tende a aumentar devido à diferença gritante e cada vez maior entre os países ricos e os países pobres e os conflitos em acto nos diversos territórios.
O Livro Verde da Comissão Europeia teve a coragem e o mérito de fazer o inventário das lacunas e possíveis soluções, incluindo a permissão de estadias para procurar trabalho, o que muitos governos consideraram mais um cavalo de Tróia do que uma medida eficaz para evitar os clandestinos e irregulares. Na União Europeia o fluxo de entradas irregulares atinge meio milhão de pessoas por ano. A entrada por via marítima é relativamente pequena, a maior parte atravessa as fronteiras. Apesar disso o mar é fonte de inúmeras tragédias. Segundo dados fornecidos pela Espanha, em 2004, 500 pessoas morreram em tentativa de atingir a costa, vindos do Norte de África.
A legislação deve assegurar o respeito pelos novos imigrantes mas exigir-lhes também a observância das regras de convivência da sociedade que os acolheu. Direitos e deveres para todos, mas evitando também que os erros e abusos de alguns não levem a uma diminuição da tutela dos direitos humanos fundamentais sobre os inocentes.
Na Europa, e em Portugal também, os imigrantes não podem ser vistos apenas como reserva para enfrentar as dificuldades da economia.
Os emigrantes não são vistos hoje como novos bárbaros, chegam laureados, diplomados, com escola secundária e cursos profissionais. Entre as mulheres emigrantes o nível de instrução é mais alto do que entre os homens. Estes imigrantes lamentam que são obrigados, por vezes, a trabalhos pesados e pouco adaptados à sua instrução. Nota-se entre estas pessoas uma elevada mobilidade territorial, à procura de um lugar mais condigno com a sua formação.
3 – A Igreja pede aos cristãos para reforçar a cultura de acolhimento, da relação quotidiana, não se deixando invadir pelo medo e separação entre uns e outros. É preciso investir na integração, na solidariedade e na justiça, até para diminuir a mancha que caiu sobre nós por causa das injustiças, represálias e opressão aos imigrantes quando não dominavam a nossa língua para se exprimirem e desconheciam as leis para se defenderem. Confiaram sempre na Igreja e nas Instituições de Solidariedade Social estabelecidas entre nós.
Aos nossos cristãos pedimos para ajudar os estrangeiros a aumentar a cultura da participação efectiva, a não caírem no isolamento e marginalização, a não fugirem ao convívio.
O Papa Bento XVI exorta os cristãos a proceder de tal forma que, «quem se encontra fora do próprio país sinta a Igreja como uma pátria onde ninguém é estrangeiro».
Funchal, 19 de Fevereiro de 2006
†Teodoro de Faria, Bispo do Funchal
N.B. Dentro de algum tempo, esperamos inaugurar a sede de acolhimento aos imigrantes, sala concedida pela Câmara Municipal do Funchal e apetrechada com ofertas da Diocese e de vários benfeitores. Esperamos que ela venha colmatar uma necessidade que desde há muito se sentia na pastoral dos Migrantes e Refugiados. A todos os benfeitores o nosso agradecimento.