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Mensagem de Natal de D. António Vitalino

D. António Vitalino
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Bispo de Beja e Presidente da Comissão Episcopal para a Mobilidade Humana

No hemisfério Norte o Natal marca o fim da estação do Outono e o início do Inverno, estações sombrias, muitas vezes chuvosas e frias, dias mais curtos e noites mais prolongadas, convidando ao refúgio em lugares abrigados e quentes, modificando, em parte, o nosso ritmo de vida. Mas, com a chegada do Inverno, a natureza parece querer começar a regenerar, lutando contra a tendência outonal da morte. recisamente nesta passagem acontece o Natal, que, para crentes e não crentes, está ligado a um acontecimento bimilenar, e para os cristãos marca a plenitude dos tempos, pois Deus, o Eterno, fez-se um de nós na pessoa do Menino Jesus, nascido em Belém, insuflando no tempo transitório e precário um resquício da sua eternidade, dando ao nosso tempo a plenitude para que toda a criatura tende e o ser humano almeja. Com este nascimento começaram novos tempos e nova história, a vida venceu a morte e surgiu uma nova fonte de esperança. Com o Natal de Jesus, há dois mil anos, começou a poder afirmar-se que o Inverno não era a última estação do ano e da vida, mas sim passagem para a Primavera. O Natal está também inscrito na alma e na cultura do nosso povo. Disso são prova as numerosas tradicionais culturais, populares e religiosas, expressas quer na música, na gastronomia, nas reuniões de família, nas celebrações litúrgicas e da piedade popular. Natal contradito O acontecimento originário do Natal, com as suas expressões nas culturas de muitos povos, parece desfasado da realidade dos nossos ambientes. Os indiferentes, os que passam ao lado e não acolhem em sua casa a família de Nazaré, tal como em Belém, a violência, a guerra, a fome, as injustiças, as crises económicas, financeiras e de humanismo continuam a grassar por este mundo fora. A mensagem de paz, de liberdade, de fraternidade e de igualdade continuam no âmago do coração humano e são cerne da mensagem de Natal, mas o número daqueles que fazem disso uma força das suas vidas parece decrescer. A família, com as suas características de amor afectivo e efectivo, de renovação dos seres vivos e de apoio ao crescimento da pessoa humana, tem um papel primordial a desempenhar na sociedade e na Igreja. Pena é que não seja devidamente protegida em muitas sociedades desenvolvidas e a ponham ao nível de qualquer outra forma de associativismo, que apenas visa o bem estar dos seus membros e não gera novos membros pelo dom da vida. Acredito que muitos desequilíbrios no crescimento humano provêm do fracasso da educação na família. Preocupa-nos ver tantos desanimados na nossa sociedade, deixados ao abandono e na solidão, que tantas vezes leva à autodestruição e ao suicídio. Muitos ficam para trás na correria duma humanidade à procura desenfreada do bem-estar material, do consumo, do prazer, do poder e do dinheiro, sem critérios éticos. Belém, célula duma nova sociedade Foi na pobreza duma gruta em Belém, que há dois mil anos nasceu o germe duma nova família e duma nova humanidade. Na simplicidade duma família pobre, que acredita na vida e a acolhe no seu seio, surge uma nova possibilidade de vida plena, dando novas potencialidades à vida humana, que só em Deus encontra a sua plenitude e que é possível mesmo na exiguidade de recursos humanos, pois Deus vem em auxílio da nossa fraqueza. Foi este acontecimento que fez surgir santos e mártires através dos tempos, que têm contribuído para humanizar o mundo e dar-lhe novas dimensões. Numa cultura do individualismo atroz, do egoísmo, do consumo e da concorrência, em que o nascimento dum novo ser é sempre temido e visto como uma diminuição da nossa qualidade de vida, Natal é uma afirmação em sentido contrário. Mas, para que hoje seja também Natal para nós, temos de adquirir a simplicidade dos pastores e a sabedoria dos Magos, isto é, daqueles que buscam a Deus e não fazem das riquezas materiais o seu Deus. Natal e Ano Novo abençoados! Como bispo de Beja e presidente em funções da Comissão Episcopal da Mobilidade Humana venho por este meio exprimir junto das comunidades migrantes os meus votos sinceros de um Natal de 2008 repleto de sentido religioso, social, familiar e humano. Oxalá saibamos viver esta quadra e todo o ano com a esperança de quem acredita nas potencialidades da vida humana e com a solidariedade bem conhecida do nosso povo, apesar da sua dispersão no mundo. A todos desejo festas abençoadas de Natal, na alegria de saber-se amado por Deus, pela família e por todos aqueles que nos rodeiam, perto ou longe. Que esta certeza e esperança se consolidem ao longo de todo o ano e irradiem à nossa volta, a fim de que para todos seja Natal. Sós ou acompanhados, desfrutemos a beleza de Natal, cantando ou ouvindo as suas belas músicas, pois cantando reafirmamos a nossa identidade e fortalecemos a nossa esperança. Oxalá, fortalecidas as raízes da nossa esperança, entremos num novo ano com mais coragem e alegria, para cimentarmos a nossa coesão como povo de irmãos e filhos de Deus. Para todos, Natal abençoado e Ano Novo forte na esperança! António Vitalino, Bispo de Beja


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