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Migrantes, desconhecidos e invisíveis

Comissão Episcopal de Migrações e Turismo
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Mensagem para o Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas - Comissão Episcopal de Migrações e Turismo

A comemoração do “Dia de Portugal, de Camões e das Comunidades Portuguesas” é oportunidade histórica para augurar um Portugal sempre actual, vivido a favor de todos os seus filhos sem marginalização de ninguém, evocando com particular desvelo os que são a nossa Pátria, nas lonjuras do mundo. A nossa geografia e história medem-se por todos os mapas e ciclos de tempo onde compatriotas labutam, vivem e promovem exemplarmente a língua de Camões, a cultura portuguesa e a sua religiosidade de matriz cristã. Na formação da nossa identidade é indiscutível a presença das diferenças repartidas e dos capítulos vários que os portugueses redigem nas múltiplas zonas da sua inserção. No seguimento do I Encontro Mundial das Comunidades Portuguesas, de 29 a 31 de Março, no Porto, os participantes salientaram o júbilo da vinculação ao país de origem e das suas responsabilidades na construção do nosso projecto comum. Em simultâneo, chamaram a atenção para o seu inconformismo por estarem, em países da diáspora, privados de meios diplomáticos adequados, das mediações necessárias para defesa dos seus direitos, apoio e segurança às suas vidas, famílias e bens e o ensino da língua portuguesa aos descendentes. Manifestaram maior perplexidade perante a dupla tributação fiscal que sobre algumas situações da emigração impende, receio de regressar pela fragilidade do sistema nacional de saúde. Formularam votos de igual e fraterno tratamento de maneiras quando nos visitam, quando aplicam investimentos e poupanças ou regressam a Portugal. Apesar da referência à osmose das culturas, dos povos e religiões, e à nossa mobilidade desde o berço pátrio, os portugueses, residentes permanente ou temporariamente, no estrangeiro, ressentem-se por vezes, da frieza e do distanciamento do nosso modo de ser e de os olhar. É momento para destacar cada vez mais a pertença das nossas comunidades à condição humana e histórica da portugalidade. Viver a felicidade dos êxitos, inquietar-se diante dos desequilíbrios, desconfortar-se perante os infortúnios, cuidar do vazio e da dureza de existências é, a par das demais componentes, uma expressão de universalismo fraterno e um sentimento cívico de responsabilidade colectiva. Urge ser construtivo, como sempre, em qualquer momento da vida. Se apontamos dificuldades, é por que confiamos nos valores da lucidez, na capacidade de mudança, no sonho de conseguir o que, na prática, deve definir pessoas e sistemas de pensar. Alimentamos as pretensões de um futuro melhor, furtando-nos a fatalismos e à cumplicidade de alienação. A Igreja tem um caminho, do qual se não pode apartar: o de um Deus feito homem; o caminho da Humanidade! Não vale a pena ceder ou acomodarmo-nos. Vale sim, sempre a pena, ir até ao fim da verdade, no horizonte do Absoluto e da Paz. Mais de cinco milhões dos filhos de Portugal não conseguiram o mais desejável na sua terra. A tristeza desta verdade é motivação para as mais dignas soluções! Soluções outras, soluções diferentes, soluções de justiça e de entendimento patriótico, que a Igreja irmã atenta, escuta e preconiza, desde há cinco décadas. Os migrantes – portugueses no estrangeiro e imigrantes em Portugal – são “autocrítica” incontornável do actual modelo social, progresso e bem-estar nacional. Ser compatriota é estar com a Pátria, estando com a vida dos outros, iguais a nós. São todos estes outros – desconhecidos e invisíveis – que compõem “o Dia de Portugal” Lisboa, 9 de Junho de 2005 + Januário Torgal M. Ferreira, Comissão Episcopal de Migrações e Turismo No ano do centenário da morte de João B. Scalabrini, defensor dos direitos sociais e religiosos dos migrantes.


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