Mistério de ternura e de alegria para o mundo
Homilia de Natal de D. António Marto
1. O Natal de Cristo: ir ao coração da fé
Sede bem vindos todos vós, caros irmãos e irmãs, que acorrestes à nossa catedral para celebrar nesta noite o santo nascimento do Senhor Jesus. Com esta alegria natalícia saúdo-vos afetuosamente.
Neste ano de 2012, somos chamados a celebrar o Natal cristão no contexto eclesial do Ano da Fé e no contexto social da crise que atravessa o nosso país e toda a Europa. Recentemente, os meios de comunicação social procuraram excitar a opinião pública com a discussão sobre a presença do burro e da vaca no presépio, como se essa fosse a grande questão. Assim se desvia a atenção do centro da festa para um pormenor periférico e se dá a impressão de que o Natal é folclore e pouco ou nada tem a ver com a vida quotidiana e real da gente.
Antes de mais, o Natal convida-nos a ir ao coração da fé cristã no mistério da Incarnação – Deus connosco na nossa carne humana –, e a renovar a certeza de que Ele está sempre presente nas nossas vidas. “Deus não é uma hipótese longínqua sobre a origem do mundo; não é uma inteligência matemática muito longe de nós. Deus interessa-se por nós, ama-nos, entrou pessoalmente na realidade da nossa história, comunicou-se até fazer-se homem. Assim, Deus é uma realidade da nossa vida; é tão grande que tem tempo para nós, se ocupa de nós. Em Jesus de Nazaré, nós encontramos o rosto de Deus, que desceu do seu Céu para entrar em cheio no mundo dos homens, no nosso mundo, e ensinar a “arte de viver”, o caminho da felicidade, e para nos libertar do pecado e nos tornar filhos de Deus. Jesus veio para salvar-nos e mostrar-nos a vida boa do Evangelho” (Bento XVI). Ele continua a vir trazer aos homens a paz, a vida e a alegria verdadeira.
2. Mistério de ternura e de alegria para o mundo
Eis o encanto do mistério desta Noite Santa, a grande noite do Natal de Cristo! É narrada uma história muito humilde e todavia, precisamente por isso, de uma grandeza desconcertante: o nascimento dum menino numa manjedoura. Indica-nos assim o modo surpreendente que Deus escolheu para vir ao nosso encontro: “Um menino nasceu para nós, um filho nos foi dado. Será chamado Deus forte, Pai para sempre”(Is 9).
Na inocência e na fragilidade duma criança indefesa que se abre à vida, no estábulo de Belém e não no palácio dos poderosos, são-nos dadas a contemplar a humildade e a ternura com que Deus se aproxima, se faz próximo de nós. Neste menino pode-se, por assim dizer, tocar Deus, acariciá-Lo e deixar-se acariciar por Ele. As mãos estendidas do menino Jesus são as mãos que Deus estende à humanidade para a introduzir no seu amor; mas são também as mãos de Deus mendigo do nosso amor.
Este encontro com a humildade e a ternura de Deus traz uma enorme alegria a quem aceita vivê-lo. Assim foi anunciado aos pastores: “Não temais, porque vos anuncio uma grande alegria para todo o povo: nasceu-vos hoje, na cidade de David, um Salvador, que é Cristo Senhor”. O Papa Bento XVI comenta deste modo: “É a alegria do homem que é tocado no coração pela luz de Deus e pode ver que a sua esperança se realiza: a alegria daquele que encontrou Deus e foi encontrado por Ele”. Esta alegria motiva o canto dos anjos (Glória a Deus e paz na terra aos homens) e ajuda a compreender que “o povo simples dos crentes tenha ouvido cantar também os pastores e, até hoje, na noite santa, se una às suas melodias, exprimindo com o canto a grande alegria que desde então é dada a todos”.
É esta alegria que J. S. Bach cantava num Oratório de Natal: “Como poderei acolher-Te, de que modo poderei encontrar-Te, ó desejado de todo o mundo, ó tesouro da minha alma? Ó meu amado menino Jesus, prepara um berço puro e terno no íntimo do meu coração a fim de que eu nunca me esqueça de Ti... Ó Jesus, sê tu o meu único desejo; está sempre no meu pensamento; não permitas que eu vacile”.
Não se trata de um mero sentimentalismo intimista. O Natal de Cristo é para o mundo. Por isso, nos pede para levarmos ao mundo a alegria da ternura e do amor em gestos de proximidade, de serviço, de ajuda concreta: na carícia a uma criança, no sorriso e no afeto a um idoso, na visita a um enfermo ou recluso, na consolação a um aflito, na partilha generosa com os carenciados, na ternura e compreensão dentro do matrimónio e da família, na fraternidade das relações na comunidade cristã e na sociedade.
Como os pastores, depois de terem visto o menino, regressaram glorificando e louvando a Deus por lhes ter aberto os olhos do coração, assim também nós louvamos e anunciamos:
Um Menino nos foi dado
E um Filho nos nasceu
Glória a Deus e paz na terra
Cantam os Anjos no Céu.
Anjos no céu aparecem
Cantando glória e louvor,
E os pastores reconhecem
O Cordeiro do Senhor.
Glória seja dada ao Pai
E ao Espírito também
Glória seja dada ao Filho
Nos braços da Virgem Mãe.
A todos vós, às vossas famílias, a todos os que vos são queridos, a toda a nossa Diocese desejo um Santo Natal de alegria, de fraternidade e de esperança no Senhor!
Catedral de Leiria, 25 de dezembro de 2012
D. António Marto, Bispo de Leiria-Fátima
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