Nota Pastoral do Bispo de Angra para a Quaresma 2006
O centro do Ano Litúrgico é o Tríduo Pascal da Semana Santa, que culmina no Domingo da Ressurreição, a maior Festa dos cristãos. Desde cedo, a Igreja reservou um tempo especial para a sua preparação, que por fim veio a fixar-se nos quarenta dias da Quaresma, em que os catecúmenos, a baptizar na Vigília Pascal, intensificavam a sua iniciação cristã.
1. Daqui o carácter baptismal da caminhada quaresmal, no sentido de assumir com coerência a vida nova do Baptismo, a receber ou já recebido. O que implica a conversão - «metanóia» - mudança de vida. Isto é algo mais radical e profundo do que as simples penitências ou mortificações. É um processo de mudança de mentalidade e de critérios, de atitudes e de comportamentos, para nos identificarmos com a maneira de ser e de agir de Cristo: viver em Cristo, a filiação divina e a fraternidade humana.
A caminhada de vida cristã, na linha do Baptismo, consiste, pois, em crescer nesta atitude filial e fraternal. Viver cristãmente é ser capaz de rezar com autenticidade o «Pai Nosso». Quem diz «Pai» tem consciência de ser filho; e dizendo «Nosso» sabe-se irmão.
Por isso, a Quaresma tem de ser um tempo forte de oração e de escuta da Palavra, de intensa vida sacramental e de amor concreto para com o próximo.
«Converter-se» é voltar para Cristo, aceitá-Lo e acolhê-Lo como Salvador, segui-Lo como Caminho da verdadeira felicidade, experimentando a Sua misericórdia e libertação, nomeadamente, no Sacramento da Reconciliação e olhando para o próximo como Ele, que «ao ver as multidões, encheu-se de compaixão por elas» (Mt 9, 36).
2. «Quem age segundo esta lógica evangélica, vive a fé como amizade com o Deus Encarnado e, como Ele, provê às necessidades materiais e espirituais do próximo» - afirma o Papa Bento XVI, na sua Mensagem para esta Quaresma, em que apela ao «desenvolvimento integral do homem todo e de todos os homens... O jejum e a esmola, juntamente com a oração, que a Igreja propõe de modo especial no período da Quaresma, são uma ocasião propícia para nos conformarmos àquele “olhar”» de Jesus, apoiando iniciativas de desenvolvimento, através da chamada «Renúncia Quaresmal».
Trata-se de identificar, no início da Quaresma, algo de supérfluo ou mesmo necessário, a que renunciamos, para ajudarmos quem precisa mais do que nós. Na Missa do ofertório do Domingo de Ramos, depositamos o valor equivalente a essa renúncia, que este ano se destina à Diocese de Santiago, em Cabo Verde.
A Conferência Episcopal Portuguesa tem o empenho de ajudar as Igrejas de expressão portuguesa em África. Desta vez, com a nossa Renúncia Quaresmal, queremos apoiar esta Diocese cabo-verdiana, nomeadamente nos seus projectos de desenvolvimento: alfabetização e animação juvenil, promoção feminina e apoio às mães solteiras, particularmente no Centro Social da Paróquia de S. Miguel Arcanjo.
No ano passado, a Renúncia Quaresmal atingiu o montante de 25.791,16 Euros (vinte e cinco mil setecentos e noventa e um euros e dezasseis cêntimos). Como sabemos metade foi para os sinistrados do tsunami asiático e a outra metade para as iniciativas da Caritas Diocesana.
Vamos, pois, viver esta Quaresma, empenhando-nos numa sincera caminhada de conversão, que nos faça próximos dos irmãos necessitados, com a nossa generosidade e partilha.
O Papa acaba de publicar a sua primeira encíclica, subordinada ao tema: «Deus Caritas Est». Ora, como afirma S. João, «Deus é amor: aquele que vive no amor vive em Deus e Deus nele...; aquele que ama a Deus deve também amar o seu irmão... De facto, aquele que não ama o seu irmão, a quem vê, como pode amar a Deus, a quem não vê» ( 1 Jo 4, 7 e 20-21)?
+ António, Bispo de Angra