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O diálogo intercultural fecunda uma sociedade integrada

D. António Vitalino
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Mensagem da Comissão Episcopal da Mobilidade Humana para a 33ª Semana de Migrações: 8-14 de Agosto 2005

Nómadas da aldeia global É lugar comum dizer-se que vivemos na aldeia global, onde tudo se divulga simultaneamente, chega ao conhecimento de todos e produz reacções semelhantes nos habitantes do pequeno Cosmos. No entanto, os efeitos residuais em cada pessoa são diferentes: uns aproveitam e sentem-se bem, enquanto outros ficam inseguros, insatisfeitos; uns alegram-se com os actos de terrorismo e outros protegem-se dele; uns têm mais que suficiente para uma vida cómoda no canto da aldeia e outros passam mal no outro canto; os que têm fazem turismo no canto onde se vive mal e os outros espreitam no outro, para conseguir o mesmo bem-estar. E assim andamos, de um lado para outro, nesta aldeia, sem conseguirmos que a globalização seja também para todos em todas as dimensões: do saber, da economia, da solidariedade, da liberdade e da paz. Os E/Imigrantes são pessoas Nesta aldeia muitas vezes esquecemo-nos que os habitantes são pessoas e que têm uma igual dignidade fundamental. Não pode haver uns que são mais pessoas que outros, embora, na prática, isso aconteça. Para enfrentar os problemas que a globalização faz surgir é preciso partir da verdade fundamental: todos são pessoas e sujeitos de iguais direitos e deveres. Por isso, temos de considerar e acolher os migrantes, sejam pobres ou ricos, pessoas à procura de trabalho ou de lazer, trabalhadores ou turistas, como nossos semelhantes e interlocutores. Entrar em diálogo com eles e dar respostas adequadas, conscientes do princípio fundamental da cultura cristã: “não faças aos outros aquilo que não gostarias que te fizessem a ti”. Ou então aqueloutra recomendação do Antigo Testamento: “lembra-te que também tu foste estrangeiro em terras do Egipto” (cf. Dt 5, 15 e 10,19). Acolher o outro é factor de enriquecimento Na mensagem para o 91º Dia Mundial do Migrante e Refugiado, escrita pelo saudoso Papa João Paulo II, em 24 de Novembro de 2004, lê-se que “através do contacto com o outro se descobre o seu segredo e se contribui para um maior conhecimento mútuo”. Pelo diálogo intercultural vão-se esbatendo as barreiras e as agressões e constrói-se uma sociedade pacífica, onde as diferenças étnicas, linguísticas, religiosas e culturais são factor de enriquecimento das pessoas e da sociedade. Não se trata “de assimilar o estrangeiro, mas de integrá-lo na nossa convivência”, deixando de ver nele apenas um concorrente ou um factor de progresso económico, para ter nele um amigo, um irmão que caminha ao nosso lado e connosco luta por um mundo mais justo e fraterno. É preciso ultrapassar os limites da tolerância, que muitas vezes é indiferença e se traduz em consequências negativas na convivência humana, para passar à atitude do diálogo acolhedor do outro, à simpatia que respeita as diferenças e as interpela para as compreender e integrar e, em alguns casos, esbater e superar numa síntese cultural de outra dimensão, que pode ser o princípio de uma nova cultura. Não devemos considerar as culturas como bens estáticos e imutáveis, mas como caminhos fecundantes da evolução social. Da sociedade multicultural desenraizada à cidade integrada e pacífica Sem cair num sincretismo cultural ou religioso, os diálogos intercultural, ecuménico e interreligioso ajudarão a construir uma nova sociedade, uma nova civilização, baseada no amor e no respeito da pessoa humana. É para esta atitude que apela a mensagem papal. Ela será aurora duma sociedade aberta e solidária, universalista, global em todos os sentidos, conforme a visão do profeta Isaías, que no exílio antevia um povo formado de todos os povos e de todas as línguas, reunido em volta de um único Deus e Senhor (Is 66). Se enveredarmos por este caminho, temos futuro. Mas resta-nos um longo caminho a percorrer. Como cristãos somos fermento dessa nova sociedade, testemunhas da esperança, peregrinos do Reino de Deus, sentinelas duma nova aurora. Beja, 22 de Julho de 2005 † António Vitalino, Bispo de Beja Presidente da Comissão Episcopal da Mobilidade Humana


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