O «Justo» Aristides de Sousa Mendes D. Teodoro de Faria 29 de Junho de 2004, às 17:00 ... No 50.º aniversário da sua morte Era Cônsul de Portugal em Bordéus em Agosto de 1938 durante a última grande guerra. Quando judeus e outros fugitivos chegaram a esta cidade perseguidos pelos nazistas, a única forma de sobreviver era emigrar para o estrangeiro desde que obtivessem documentação portuguesa. Trinta mil pessoas obtiveram o visto para entrar em Portugal, dez mil das quais judias! «Eu lhes darei na Minha casa, dentro das Minhas muralhas, um lugar e um nome que valem mais do que filhos e filhas, dar-lhes-ei um nome eterno que nunca desaparecerá (Is. 56, 5). Cai a tarde na cidade santa de Jerusalém. Estamos no mês de Setembro. Um grupo de peregrinos da Madeira, acompanhado pelo seu bispo e um guia israelita, entram no memorial de Yad Vashem (Lugar e Nome) que recorda a morte de seis milhões de judeus, vÃtimas do regime nazista de Hitler. Vamos entrar na «Avenida dos Justos» que nos leva ao Memorial. Cada uma das árvores da Avenida tem um nome de uma pessoa, de uma famÃlia ou de uma comunidade que puseram em perigo a sua vida e salvaram crianças ou adultos, marcados com a estrela amarela de judeus condenados à morte. Estas pessoas renovaram o gesto heróico das parteiras do Egipto que, desobedecendo à s ordens do faraó, salvaram os primogénitos hebreus (Ex. 1, 15-17). Ao entrarmos nesta Avenida dos Justos lê-se a palavra «Lembra-te» gravada numa coluna. ‘Quem são estes justos de Yad Vashem’? São aqueles homens ou mulheres que salvaram judeus de morte certa, no tempo do nazismo, expondo a sua própria vida. Começamos a percorrer a Avenida, o guia fala de um dos nomes mais conhecidos devido ao filme que o imortalizara — A lista de Schindler. Paramos junto da sua memória, a inscrição esta coberta de muitas pequenas pedras, forma hebraica de substituir as nossas flores. Também colocamos ali uma pedrinha. Atenção, continua o guia, aqui está também o nome de um português. Ficamos orgulhosos e admirados. Vamos procurar a sua árvore e a sua memória. Encontramo-la facilmente; o nosso «Justo» chama-se Aristides de Sousa Mendes. Sobre a sua inscrição não havia nenhuma pedrinha o que significa que ninguém lhe colocou uma flor naquele dia. Quando deixamos o Memorial ficaram quarenta. 2 - Aristides César nascido no Concelho de Carregal do Sal em 1885 e falecido em Lisboa em 1954, casado com Maria Angelina R. de Abranches, pai de 14 filhos, era Cônsul de Portugal em Bordéus em Agosto de 1938 durante a última grande guerra. Quando judeus e outros fugitivos chegaram a esta cidade perseguidos pelos nazistas, a única forma de sobreviver era emigrar para o estrangeiro desde que obtivessem documentação portuguesa. Trinta mil pessoas obtiveram o visto para entrar em Portugal, dez mil das quais judias! As instruções do Governo de Lisboa e do primeiro ministro eram determinantes e claras, o cônsul Aristides sabia o que significava desrespeitar as ordens de Salazar, condenava-se a si mesmo. O Cônsul Aristides era um homem de fé, conhecia o Evangelho e o mandamento do amor: «o que fizerdes a um destes mais pequeninos é a mim que o fazeis». Obedecer à consciência ou à lei dos homens? «Prefiro estar com Deus contra os homens que com os homens contra Deus». Reuniu a sua famÃlia, esposa e filhos, expôs-lhos a situação, dizendo que estava disposto a desobedecer e salvar esta multidão de refugiados perseguidos por Hitler, sabia que seria destituÃdo do seu cargo, viveria pobre durante a sua vida, mas a sua consciência crista falava mais alto. Depois lança a terrÃvel pergunta à famÃlia: estais dispostos a acompanhar-me neste acto, uma vida pobre mas em paz com a nossa consciência e segundo a fé cristã? Todos disseram, SIM, estamos. Começou um trabalho ingente, dia e noite, cônsul, mulher e filhos mais velhos a preparar passaportes e a entregá-los aos refugiados em perigo de vida. No centro da bandeira portuguesa, estavam as cinco chagas de Cristo, a recordar o sangue do Salvador de todos os homens. Salazar foi duro e cruel, como em tantas outras vezes. Não perdoava uma falta diplomática e muito menos uma transgressão voluntária. Aristides foi obrigado a uma reforma compulsiva e não remunerada, proibido de praticar a advocacia. O prevaricador devia ser esmagado, arrastando a sua vida na pobreza com os seus familiares. Mas os judeus salvos engrandecerem o seu nome, comunicaram o seu feito de «justo» e o seu nome foi gravado no memorial da «Avenida dos Justos» na cidade santa de Jerusalém, onde o Justo dos Justos, Jesus de Nazaré foi morto e ressuscitou para com a sua Vida fortalecer novas gerações de justos. Vinte anos após a sua morte o seu nome foi reabilitado pelas organizações judias internacionais, começou a ser honrado e no 50.º aniversário da sua morte a 17 de Junho, a sua memória foi celebrada em 21 paÃses. As celebrações tiveram lugar em sinagogas e igrejas católicas nos cinco continentes. Os polÃticos portugueses foram obrigados pelas circunstancia a associarem-se à s comemorações, embora reticentes num ponto importante, a congruência de Aristides entre as suas obras e a sua fé. Numa reunião da Conferência Episcopal Portuguesa, em Fátima, o falecido bispo de Viseu, D. António Monteiro, levantou a sua voz protestando contra o aproveitamento da figura do grande português e cristão, por aqueles que esqueciam a fonte inspiradora do seu acto - o evangelho da caridade, «Amai-vos uns aos outros como eu vos amei». 3 — Continuamos a peregrinação ao longo da «Avenida dos Justos» e chegamos ao Memorial das crianças, vÃtimas inocentes da barbárie nazista. Quanta emoção e lágrimas. Fora estão crianças a sorrir, cheias de vida, dentro um labirinto de trevas, onde seguimos agarrados a um corrimão. Uma única chama de um cÃrio que se multiplica ao infinito com um complexo jogo de espelhos, ilumina a noite com uma multidão de estrelas. Caminha-se ao escuro ouvindo o nome, idade e nacionalidade de um milhão e meio de crianças, mártires do anti-semitismo! Quando saÃmos do Memorial alguns peregrinos, estavam prestes a desmaiar e foram atendidos por um médico. Yad Vashem. Lugar e Nome. Holocausto! Avenida dos Justos. Aristides de Sousa Mendes, o «Justo» português. Oh! Jerusalém! Funchal, 27 de Junho de 2004 †Teodoro de Faria Bispo do Funchal Migrações Share on Facebook Share on Twitter Share on Google+ ...