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Quarentena Penitencial

D. António de Sousa Braga
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Nota Pastoral de D. António Sousa Braga

Depois da exuberância própria do Carnaval, entramos na «quarentena penitencial», em preparação da grande festa da Páscoa da Ressurreição, fundamento da fé cristã e centro do ano litúrgico. Na Quaresma, a Igreja convida-nos a percorrermos um caminho de penitência e, portanto de conversão, isto é, de mudança de vida, segundo os critérios evangélicos e o espírito das bem-aventuranças. Este Ano da Eucaristia interpela-nos no sentido de reafirmar a nossa fé e adesão à Pessoa de Cristo, confessando, não só por palavras, mas também, e, sobretudo, por obras, que Ele é o Senhor, o Nosso Senhor, que queremos seguir, acolhendo-O no mistério da Sua Presença, tanto na Eucaristia, como no «sacramento do irmão». Fazendo memória dos quarenta dias, em que Jesus permaneceu no deserto, onde foi tentando e triunfou, também nós, nestes quarenta dias da Quaresma, queremos libertar-nos dos «ídolos modernos», que pretendem assenhorear-se da nossa vida: o materialismo consumista, o individualismo egoísta e a busca descarada do poder e domínio de pessoas e grupos… As tentações de Jesus no deserto são as tentações de toda a Sua vida. Já tinham sido as tentações do povo de Israel, ao longo dos quarenta anos de travessia do deserto em demanda da Terra Prometida. O povo de Israel sucumbiu diversas vezes às provações, a que foi submetido. Jesus venceu. Vencerá todo o discípulo que, como Jesus, se deixar orientar pela Palavra de Deus e conduzir pelo Espírito Santo. «Nem só de pão vive o homem, mas de toda a palavra que sai da boca de Deus» (Mt 4, 4). Jesus recusou sempre realizar a Sua missão, como busca de poderio humano e do milagre fácil e espectacular. Os milagres, que realizou, não foram em benefício próprio, mas gestos de compaixão humana. A Eucaristia é também projecto de solidariedade humana. O mandato de Jesus - «Fazei isto em memória de Mim» - não visa apenas o culto religioso. É também «lava-pés» de serviço e de amor efectivo, que de todos os irmãos, mesmo os distantes, se faz «próximo». A imane tragédia, provocada pelo maremoto do Sudoeste asiático, desencadeou uma onda de solidariedade, nunca vista, também entre nós. Após o socorro de emergência, é preciso garantir o apoio continuado à reconstrução. Não se podem também esquecer outros irmãos, também necessitados, de outras partes do mundo, nomeadamente os países de expressão portuguesa, a que nos ligam laços históricos e obrigações, que não podemos escamotear. Nesta conformidade, a Renúncia Quaresmal deste ano destina-se, metade aos projectos da Caritas em favor dos países atingidos pelo maremoto de Dezembro passado e a outra metade aos projectos da Ãfrica de expressão portuguesa, apoiados pela Conferência Episcopal Portuguesa. No caso concreto da Renúncia Quaresmal, não se trata apenas de uma expressão suplementar de generosidade e de partilha. Estamos perante a renúncia pessoal, durante a Quaresma, a algo, a que estamos habituados e cujo valor remetemos para o auxílio dos irmãos. É renúncia também da Paróquia e da Diocese, em favor de quem precisa mais do que nós. Esta é uma prática, que temos vindo a seguir e que queremos continuar, apesar das nossas necessidades. No ano passado, a Renúncia Quaresmal rendeu 27.402,44 euros, montante destinado à Guiné-Conacry e já entregue através da Conferência Episcopal Portuguesa. Pela prática do amor do próximo, passa a coerência da nossa vida cristã e a autenticidade das nossas celebrações eucarísticas. Como exorta o Papa, «o Ano da Eucaristia seja para todos ocasião preciosa para uma renovada consciência do tesouro incomparável que Cristo entregou à sua Igreja. Seja estímulo para a sua celebração mais viva e sentida, da qual brote uma existência cristã transformada pelo amor» (Mane Nobiscum Domine, 7 de Outubro de 2004, nº 29). + António, Bispo de Angra Angra, 02 de Fevereiro de 2005 Festa da Apresentação do Senhor.


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