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Santarém assinalou aniversário da tomada de posse do primeiro Bispo da Diocese

D. Manuel Pelino
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1. O Bispo garante da apostolicidade da Igreja Na celebração dos trinta anos da Diocese de Santarém temos hoje presente um acontecimento fundamental que constitui uma Diocese como presença da Igreja una, santa, católica e apostólica: a ordenação do primeiro Bispo, Dom António Francisco, realizada nesta Igreja de Santa Clara a 4 de Outubro de 1975. O ministério apostólico do Bispo é um dom do Espírito Santo concedido à Igreja para congregar e orientar os fiéis em nome do Senhor, com a cooperação do ministério presbiteral. Sem Bispo não há Igreja diocesana. A comunhão eclesial vivida com o Bispo é indispensável para estar integrado na Igreja de Jesus Cristo. É, sem dúvida, uma grande responsabilidade confiada à fragilidade de um homem. Quando aceitamos esta missão, é porque confiamos que somos apenas sinais e instrumentos do verdadeiro pastor Jesus Cristo que nos assiste com a força do Seu Espírito. A primeira leitura, do profeta Ezequiel, afirmava claramente a solicitude pessoal e a presença de Deus no meio do Seu povo: "Eu próprio irei em busca das minhas ovelhas... Eu apascentarei o meu rebanho". Nós, pastores terrenos, apenas O representamos, damos eco às Suas palavras, tornamos visíveis os Seus gestos de salvação. Não somos donos do rebanho. Não são nossas as ovelhas que apascentamos. Tomamos conta do rebanho do Senhor e devemos prestar-Lhe contas. Assim comenta Santo Agostinho, num sermão sobre os pastores, o trecho do Evangelho que ouvimos: "Quando confiou as suas ovelhas a Pedro como quem as entrega a outra pessoa diferente de si mesmo, quis fazer dele uma só coisa consigo. Por isso, para não parecer que as entregava a um pastor distinto de si mesmo, o Senhor perguntou-lhe: Pedro tu amas-me?! Apascenta as minhas ovelhas... Deste modo, o quis fortalecer no amor para o confirmar na unidade. Portanto é Ele só que apascenta nos pastores e é só Nele que os pastores apascentam". O Sr. Dom António Francisco viveu empenhadamente esta configuração com Jesus Cristo. Alicerçou a sua vida na fé que o levou a procurar sempre conhecer e cumprir a vontade de Deus. Esforçou-se por viver o evangelho na humildade, na simplicidade, na afabilidade, tendo como mestre de vida cristã, São Francisco de Assis. Como bom pastor esforçou-se por conhecer o povo de Deus que lhe foi confiado para levar a todos a luz do evangelho e a todos congregar na unidade. 2. São Francisco exemplo de comunhão e de missão. Esta Igreja dedicada a Santa Clara, irmã espiritual de São Francisco e encarregada por ele de orientar a ordem feminina franciscana, evoca a espiritualidade de São Francisco à qual a nossa diocese está ligada nas origens. O carisma de São Francisco, aliás, foi o de viver o evangelho de forma radical no meio do povo: na pobreza, na humildade, na hospitalidade, na oração e na pregação. A pobreza liberta das preocupações materiais e dá origem à alegria espiritual. São Francisco viveu e irradiou, de facto, essa alegria, experimentou e cantou, como ninguém, a beleza do mundo e das criaturas. A sua regra é uma proposta de bem aventurança, ou seja, de uma vida com ventura. Numa carta que escreveu a todos os fiéis, afirma este santo: "Como são felizes e abençoados os que amam o Senhor e praticam o que o mesmo Senhor diz no evangelho: Amarás o Senhor teu Deus com todo o teu coração e com toda a tua alma e ao teu próximo como a ti mesmo...Procuremos ser simples humildes e puros. Nunca devemos desejar estar acima dos outros, mas devemos antes ser servos e súbditos de toda a criatura humana por amor de Deus". Na origem da vocação de São Francisco está um apelo que hoje adquire um significado especial. Uma vez, que estava absorto em oração na Igreja de São Damião, ouviu ou sentiu este apelo: "Francisco reconstrói a minha Igreja que está em ruínas". Julgou, a início, tratar-se do edifício de São Damião. Depois compreendeu que o restauro que lhe era pedido era mais profundo e complexo: o restauro da Igreja de pedras vivas. Como se restaura esta? Pela fidelidade ao evangelho. A proposta franciscana não ia na o­nda da cultura da sua época nem do estilo de muitos responsáveis da Igreja. Apesar disso, este santo sempre se preocupou em viver a comunhão eclesial numa ligação forte e numa obediência total ao Papa e aos bispos do seu tempo. Quando renunciou ao mundo e se despojou das suas ricas vestes, foi perante o Bispo da sua diocese. São Francisco enviava os frades a pregar mas proibia-os de pregar sem licença do Bispo local. Fora desta comunhão não há Igreja de Jesus Cristo. Quando quis avançar com a ordem franciscana, foi pedir aprovação ao Papa Inocêncio III. Acompanhado dos seus primeiros o­nze irmãos dirigiu-se a Roma e foi recebido pelo Papa que deve ter achado muito estranha tanto a regra como a apresentação dos irmãos franciscanos. Mandou-os embora e eles, cheios de tristeza, foram passar a noite numa hospedaria vizinha. Mas, depois, o Papa voltou a chamá-los e, na segunda audiência, concedeu a Francisco a missão de pregar e de receber a obediência dos seus frades. Conta-se que, de noite, o Papa tinha tido um sonho em que via a sólida Igreja de São João de Latrão a desmoronar-se. Quando a ruína do edifício parecia sem remédio, surge um homem que sustenta a Igreja e não a deixa cair. O Papa reconheceu os seus traços: era aquele frade pobre que queria a aprovação da regra. 3. Viver a comunhão e a missão. "Reconstrói a minha Igreja". O convite feito a São Francisco de Assis foi também vivido pelo primeiro Bispo Dom António Francisco. Amou a Igreja diocesana de Santarém, gastou a vida ao seu serviço, viveu o evangelho na pureza franciscana, ou seja, na pobreza, na humildade, na afabilidade, no acolhimento fraterno de todos. É um exemplo que deve permanecer no nosso coração e orientar a nossa colaboração na missão da Igreja. Amemos a Igreja diocesana e colaboremos na sua construção. "Veja cada um como constrói" alertava-nos São Paulo na segunda leitura. Colaboremos com o nosso testemunho de vida evangélica, a exemplo de Dom António Francisco. Hoje, da parte da manhã, vós referistes como a Eucaristia nos leva a viver atitudes cristãs tão necessárias no mundo actual, como a capacidade de escuta, o acolhimento mútuo, a humildade e a vida em comunidade. Estas atitudes, tão recomendadas por São Bento, caracterizam também o perfil do actual Papa Bento XVI. Neste ano da Eucaristia somos chamados a cultivar empenhadamente estas atitudes eucarísticas e a irradiá-las no mundo. A Eucaristia faz a Igreja enquanto a congrega na unidade, a alimenta, a renova pela força do Espírito e a envia a levar ao mundo a novidade cristã celebrada nos santos mistérios. Da missa nasce a missão de sermos fermento da nova civilização do amor. D. Manuel Pelino, Bispo de Santarém


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