Dossier

A Festa do Trabalho

D. António de Sousa Braga
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D. António de Sousa Braga - Bispo de Angra

A Festa do Trabalho O trabalho domina o panorama da vida humana. Olhando para o mundo, criado por Deus, vemos que é continuamente transformado pela mão do homem que assim prolonga a obra da criação divina. Aqui reside a dignidade do trabalho humano. A Bíblia, ao descrever a criação, afirma que ao ser humano, criado à imagem e semelhança de Deus, foi confiado o domínio do universo. “Enchei e dominai a terra†(Gen. 1,28). A própria obra criadora de Deus é apresentada, em linguagem humana, “como trabalho de Deus†(cf. Gen. 2,2). E Jesus chega a afirmar: “Meu Pai trabalha continuamente e Eu também trabalho†(Jo 5,17). Quer isto dizer que o ser humano realiza-se como imagem de Deus, dominando a terra, através do trabalho. Este é uma necessidade para garantir o sustento e fonte de realização humana. Por vezes é penoso, mas foi redimido pelo Ministério Pascal de Cristo, que o transforma em oferta agradável a Deus e dom de serviço aos irmãos. Ao celebrar a memória litúrgica de S. José a 1 de Maio, a Igreja entende promover esta espiritualidade do trabalho. A “Festa do Trabalho†é data memorável da luta humana pela dignificação do trabalho. Hoje já está mais despedida de motivações ideológicas e de impulsos reivindicativos. Mas não podemos esquecer as orientações da Doutrina Social da Igreja, tão abundante e oportuna neste campo, acompanhando de perto os novos desafios, que se vão colocando constantemente ao mundo do trabalho, devido à evolução tecnológica e aos desenvolvimentos da economia de mercado, em que a competitividade se torna sempre mais agressiva. De facto, o processo de globalização tende a pôr em causa o que se considerava adquirido, como o emprego estável e o sistema de protecção social. De um momento para o outro - advertem os nossos Bispos - “o emprego existente tornou-se mais precário e instável. Paralelamente, a protecção social vê-se sujeita a reformas tendentes, sobretudo, a enfraquecer a defesa contra os riscos. A agravar este quadro, as finanças públicas debatem-se com dificuldades geralmente reconhecidas e que têm justificado medidas restritivas com inegáveis consequências sociais... Seja qual for a evolução efectiva, o que importa é reconhecermos que o período que o país atravessa coloca exigências que a todos dizem respeito†(Nota Pastoral, 3 (2002), n. 3). A economia está ao serviço do bem comum, que é por definição o bem de todos. São necessárias reformas legislativas e sociais. O Estado tem nisso papel determinante. Mas urge também promover, na sociedade civil, uma cultura solidária, que responsabilize os cidadãos pelo bem comum. Os problemas e as dificuldades dizem respeito a todos. E todos devem colaborar para a sua solução. “Nunca será admissível que aqueles que menos tem em tempos de prosperidade sejam o que, proporcionalmente, mais sofram em tempos de crise... Não seria correcto nem justo atribuir a baixa produtividade da nossa economia apenas ao comportamento dos trabalhadores. Diversos outros aspectos, tais como a organização do trabalho, a modernização das empresas, os métodos de gestão, baixos níveis de qualificação, quer dos trabalhadores quer dos empresários, pesam bem mais no conjunto de factores explicativos da baixa produtividadesâ€. (Id., Ibid., nn. 5 e 11). O cristão será luz que ilumina a vida da sociedade e sal que tempera os mecanismos da economia, na medida em que se deixar orientar pela Doutrina Social da Igreja, que, sem pretender dar soluções técnicas, fornece directrizes de acção. Só assim é que se poderá construir a “civilização do amorâ€, de que tantas vezes fala João Paulo II, uma utopia que, como o próprio termo indica, não existe completamente realizada em nenhum lugar, mas que o cristão tem fundada esperança de alcançar progressivamente, através de atitudes e comportamento, inspirados no Evangelho de Jesus, de que a Doutrina Social da Igreja é aplicação concreta e autorizada. D. António de Sousa Braga Bispo de Angra


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