Dossier

A lógica política da cooperação institucional

Francisco Sarsfield Cabral
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Cavaco Silva foi eleito Presidente à primeira volta, o que lhe dá força política. É bom para o país, assim como foi positivo - escrevi-o aqui - o Partido Socialista ter obtido uma maioria absoluta nas eleições legislativas de Março. Pela primeira vez desde o regresso da democracia há trinta anos, vamos ter um Presidente da República que não é de esquerda. Ora também na chefia do Estado é conveniente a alternância democrática. Aconteceu em eleições com plena tranquilidade, no que já ninguém repara - sinal de que a democracia está, de facto, consolidada em Portugal. Naturalmente que a pesada derrota de Mário Soares, candidato oficial do PS, traz alguns problemas ao seu secretário-geral, José Sócrates. Sobretudo porque Manuel Alegre, concorrendo sem o apoio de qualquer aparelho partidário, ficou bem à frente de Soares e a escassa distância de uma segunda volta. Afinal, quem dividiu os votos socialistas? A campanha de Alegre é um aviso aos partidos, mostrando que eles precisam de se renovar. E evidenciou também que os partidos não esgotam a vida política. O bom resultado de Alegre pode ter conse-quências no plano governativo. Não que esteja em risco a maioria de Sócrates na Assembleia da República. Mas as políticas do primeiro-ministro arriscam-se, a partir de agora, a serem contestadas mais abertamente dentro dessa maioria, pela voz de Manuel Alegre e dos seus próximos. Ora, em Belém, Cavaco Silva será um apoio para as medidas difíceis que o Governo terá forçosamente de continuar a tomar. Medidas no domínio orçamental, na segurança social, na saúde, etc., e que provocarão, como já provocaram, compreensível descontentamento em quem perde benefícios. Paradoxalmente, para quem via na vitória de Cavaco Silva uma ameaça à estabilidade governamental, um contra-poder ao executivo socialista e, até, a possibilidade de um golpe de Estado constitucional, o próximo Presidente contribuirá - estou convicto - para reforçar a capacidade do Governo no sentido de levar por diante a regeneração das finanças públicas e, a partir daí, relançar a economia. A minha convicção decorre de que o factor decisivo na vitória de Cavaco Silva foram os eleitores do centro político. Exactamente os mesmos que proporcionaram a José Sócrates a sua vitória nas legislativas, com maioria absoluta, em Fevereiro de 2005. A boa cooperação entre Presidente e primeiro-ministro é, assim, uma exigência da lógica política destas duas eleições. E, em princípio, só voltará a haver eleições daqui a quase quatro anos. Francisco Sarsfield Cabral, Director de Informação RR


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