Dossier

Apenas um golpe de Asa

D. António Marcelino
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Comentário de D. António Marcelino

Quando se abre o coração e se solta a língua, vêm à reflexão e ao diálogo uma avalanche de casos sociais e de experiências, vividas e sofridas, que nos tornam a todos mais realistas, compassivos e comprometidos. Ninguém esgota a vida, nem tem solução para todos os problemas. Cheia e variada como é, sempre nela haverá momentos de alegria e de esperança, de dor e até de morte. Momentos que tanto geram acção, como desânimo. Os serões de pastoral social realizados ao longo dos últimos dias mostram problemas sem conta, mas também o grande número de voluntários que se dedicam aos outros, com generosidade e regularidade. Mostram ainda que, apesar das muitas pessoas, grupos e instituições em campo, os problemas e as dificuldades de ordem social se multiplicam e se agravam, deixando pelo caminho vítimas de todas as idades e condições. Há casos em que a solução adequada parece depender apenas de um golpe de asa. Uma observação cuidada da situação e do que impede que o problema se resolva, faz pensar que, se houver um diálogo coerente e franco e a coragem indispensável, podem-se abrir portas já com ferrugem nos gonzos, e a solução nem será muito difícil. Um caso entre muitos outros. Os pais das crianças e dos adolescentes que frequentam as escolas dos três ciclos deparam-se com situações que, sendo iguais, não são objecto do mesmo cuidado, nem passíveis do mesmo apoio. Numa articulação entre as escolas, instituições, municípios ou associações de pais, surgiu a valência para a ocupação dos tempos livres, com base em acordos com os serviços sociais e a favor das crianças das escolas primárias, antes ou após as aulas. Para os mais velhos dos novos, só em casos raros ou por via de projectos, a tempo determinado. Porém, estes são tão vulneráveis como os mais novos e, às vezes, ainda o são mais, porque já presumem da sua liberdade e correm riscos de que não atingem as consequências. Acontece, porém, que, se alguém quiser organizar apoios locais, depara com uma dificuldade não pensada. Enquanto que nas escolas do primeiro ciclo os horários são certos, nas outros ciclos, os horários não são os mesmos para todos e, frequentemente, há tempos sem aula ao longo do dia. Diz-se que isto é assim por conveniência dos professores. Não será sempre assim, mas não custa admitir que o seja em muitos casos. Não deve a escola organizar-se em função dos alunos e não de outro modo, por mais que isso provoque incómodos normais a quem tem o dever de servir? Nem todas as escolas dispõem de condições para acolher nos tempos livres os seus alunos. Há que tranquilizar os pais que trabalham. Talvez que um golpe de asa proporcione uma solução. Para as crianças, a rua é perigosa.


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