Dossier

Experiência nova para uma vida com mais sentido

D. António Marcelino
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Ao ouvir um grupo de jovens que iam partir para um verão de trabalho voluntário em terras de África, uma senhora procurou-me no fim da missa, perplexa e com remorsos, porque dissuadira o seu filho universitário de igual aventura, por receio das doenças, privações e perigos que ele poderia ter de enfrentar. Ao ver a alegria, entusiasmo e libertação interior, como outros jovens da mesma idade falavam do seu projecto na hora da partida, para vários deles já não era a primeira vez, ela entristeceu-se. Afinal, o que queria para o seu filho era igual alegria e entusiasmo e privou-o disso. Reflecti com esta mãe o sentido desta "aventura juvenil" e a importância de tais experiências num período da vida em que a tentação do vazio e do mais fácil e seguro é muito forte. Os pais não podem cortar as asas aos filhos que querem voar mais alto. Um dia virá em que partir é inevitável. Então, é muito importante que eles se sintam fascinados por voos de águia, que os de ave de capoeira não fascinam gente nova ainda viva. Recordei a angústia desta mãe, quando há dias ouvia os nossos jovens missionários deste verão a dar conta do seu trabalho, a falar da sua experiência, a verbalizar as interrogações que os dias cheios, vividos em Angola, Moçambique e Brasil, puseram e continuam a pôr às suas vidas. O contraste de uma vida, sem dificuldades ou com as dificuldades normais, submetida ao consumismo que asfixia e faz juntar à sua volta montes de coisas supérfluas, não pode deixar indiferente quem encontrou milhares de pessoas adultas privadas do essencial, mas a lutar pela vida, crianças desnutridas, mas felizes com o pouco que lhes era dado ou ensinado, jovens e menos jovens, ansiosos por aprender, a perceber que passava por ali o adquirir de capacidades para enfrentar realidades novas. Quem tem a igreja ao lado de casa e rediz de mil maneiras a sua falta de tempo para ir alimentar a sua fé, fica baralhado quando se apercebe que há gente que anda dezenas de quilómetros a pé para participar numa assembleia eucarística ou de oração. Quem, por cá, vai medindo ou pesando o que dá aos outros, julgando-se sempre muito generoso quando ainda dá alguma coisa, não pode ficar insensível ao contactar com gente de fé que fez da sua vida um projecto de entrega incondicional, saiu da sua terra por anos, por vezes muitos, na disposição de viver como aqueles que ia encontrar e agora experimenta que as privações diárias lhe foram abrindo o espírito para novas e maiores generosidades. Um Deus distante passa, então, a experimentar-se, vivo e actuante, nas situações mais difíceis. Respira-se um ar novo de amor efectivo, que não se sonhava possível. É a experiência rica de quem, por amor, faz o bem. António Marcelino


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