Dossier

Impacto cultural do pensamento de João Paulo II

Pe. Alfredo Dinis
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O Papa João Paulo II foi um homem de uma invulgar coragem profética manifestada nas atitudes que tomou em diversas áreas, entre as quais a da cultura. Não muito tempo após a sua eleição como Papa, em 16 de Outubro de 1978, publicou a Encíclica Redemptor Hominis em 4 de Março de 1979, onde revelou os fundamentos antropológicos do seu pensamento. Um dos seus escritos filosóficos fundamentais foi publicado em 1960 e versa sobre a Avaliação das possibilidades de elaborar a ética cristã com base no sistema de Max Scheler. O personalismo filosófico marcou as suas intervenções como Papa, tanto no domínio da cultura em geral, como no que se refere às questões éticas em particular. Mas a sua coragem revelou-se de forma mais acesa ao enfrentar sem medo as duas grandes questões que ensombravam a relação entre fé e ciência - o processo de Galileu e o evolucionismo de Darwin. Em 10 de Novembro de 1979 decidiu reconhecer sem preconceitos os equívocos da Igreja Católica no processo de Galileu, por ocasião de um discurso à Pontifícia Academia das Ciências que celebrava o centenário do nascimento de Einstein. Em 3 de Julho de 1981 institui uma 'Comissão pontifícia para o estudo da controvérsia ptolemaico-copernicana dos séculos XVI e XVII', Comissão à qual concedeu toda a liberdade para investigar e esclarecer esta controvérsia. O Papa afirmou no seu discurso que não há contradição entre ciência e religião, e que ambas confluem para a verdade que todos devemos procurar acima de tudo. Em 31 de Agosto de 1992, João Paulo II agradeceu à Comissão a apresentação do resultado dos seus trabalhos. Nessa ocasião o Papa reconheceu lúcida e corajosamente 'os erros dos teólogos de então', sem deixar porém de colocar estes erros na complexa situação cultural do século XVII. No dia 1 de Maio de 1991 publicou a Encíclica Centesimus Annus onde afirmou, entre outras coisas, que a economia deve estar ao serviço do homem. João Paulo II teve sempre um discurso muito duro contra os sistemas económicos e políticos que sacrificam a dignidade humana aos interesses ideológicos ou económicos, tanto os de cariz marxista como os que se inspiram em formas injustas de capitalismo. Em 22 de Outubro de 1996, ano da celebração dos 350 anos da morte de Galileu, João Paulo II dirigiu uma alocução à Pontifícia Academia das Ciências na qual fez algumas importantes e corajosas considerações sobre o evolucionismo, declarando abertamente que 'a evolução é mais que uma hipótese' actualizando assim, à luz dos progressos em biologia, a mais prudente posição do Papa Pio XII que, na Encíclica Humani Generis, afirmara que a evolução era apenas uma hipótese à espera de confirmação. Em 14 de Setembro de 1998 João Paulo II publicou a Encíclica Fides et Ratio, na qual defendeu que fé e razão são como que duas asas pelas quais o ser humano se eleva à contemplação da verdade. Uma vez mais o Papa teve a coragem de abordar uma questão tradicionalmente controversa, a da possibilidade de conciliar fé e razão. A história cultural da Europa seria hoje certamente bem diferente sem o Papa João Paulo II. Foi ele que deu um impulso decisivo à queda da grande divisão que existia na Europa entre o leste e o oeste. O Papa foi um visionário ao descrever a Europa como um continente que devia respirar com dois pulmões, o oriente e o ocidente. Em 2003 publicou a Exortação Apostólica Ecclesia in Europa, referindo-se à Igreja como fonte de esperança para todo o continente - uma ideia que continua viva, hoje mais que nunca. Pe. Alfredo Dinis,sj - Professor UCP


João Paulo II