A recente carta pastoral da Conferência Episcopal Portuguesa, intitulada «Responsabilidade solidária pelo bem comum» enumerava sete pecados sociais ao nível do nosso país, a saber: egoísmos individualistas, pessoais e grupais, consumismo, corrupção, desarmonia do sistema fiscal, irresponsabilidade na estrada, exagerada comercialização do fenómeno desportivo e exclusão social.
No n.º 4 daquele documento da CEP faz-se uma apresentação sumária das vertentes dos designados «sete pecados sociais». Apresentamos em itálico o texto do documento do episcopado, seguido de algumas considerações interpelativas:
* Os egoísmos individualistas, pessoais e grupais, sem perspectiva do bem comum mais global.
É neste clima de egolatria que temos de saber discernir entre a liberdade individual e a responsabilidade inter-pessoal, criando mecanismos em que se olhe para o essencial, sendo a solidariedade apenas uma etapa do grande caminho da caridade.
* O consumismo, fruto de um modelo de desenvolvimento, fomentado pelos próprios mecanismos da economia, que gera clivagens entre ricos e pobres e gera insensibilidade a valores espirituais. As novas catedrais do consumo fascinam muitos fiéis (com dias de culto enquanto há dinheiro!), trucidando os mais desfavorecidos e gerando novos pobres, escondidos na vergonha da sua miséria moral e social.
* A corrupção, verdadeira estrutura de pecado social, que se exprime em formas perversas, violadoras da dignidade humana e da consciência moral pelo bem comum.
De forma passiva ou activa se vai dizendo à boca pequena que há corrupção (nas autarquias, no sector público ou na área privada), mas torna-se difícil encontrar os infractores e sobretudo fazê-los ressarcir quem prejudicaram, seja o Estado, seja alguém particular. Até quando viveremos este clima de suspeita sem rosto e/ou culpa formada?
* A desarmonia do sistema fiscal, que sobrecarrega um grupo, e pode facilitar a irresponsabilidade no cumprimento das justas obrigações.
Quantas vezes somos confrontados com a subtil e atentatória pergunta: ‘quer recibo?’ Diz-se que tanto o perguntar como o escusar-se a receber faz incorrer em infracção... Isto já para não falar da insinuação ‘de quanto quer que passe a factura!’... Parece que vivemos num incumprimento generalizado das nossas obrigações fiscais. Assim não é possível recuperar o país e viver a justiça social. Até quando se irão ufanar os que fogem aos impostos, aviltando os que cumprem?
* a irresponsabilidade na estrada, com as consequências dramáticas de mortes e feridos, que são atentado ao direito à vida, à integridade física e psicológica, ao bem-estar dos cidadãos e à solidariedade.
As vias de comunicações rodoviárias estão cada vez melhores, enquanto a prevaricação ao código da estrada reveste a forma de guerra civil, estado de terrorismo ou mesmo de suicídio colectivo... A vida joga-se numa incerteza permanente, tantos para condutores (directos ou indirectos) como para os peões. Estamos muito longe de viver num estado civilizacional responsável. As campanhas de prevenção ou de repressão lançadas pecam por decorativas. Temos de ser mais exigentes uns para com os outros, a começar pelos cristãos... condutores ou peões.
* A exagerada comercialização do fenómeno desportivo, que tem conduzido à perda progressiva do sentido do “jogo” como autêntica actividade lúdica, e a falta de transparência nos negócios que envolvem muitos sectores e profissionais dalgumas áreas do desporto.
Particularmente no sector do futebol nota-se uma promiscuidade entre vários actores (autarcas, governantes, empresários... comunicação social, políticos, clérigos, etc.) mais do que seria desejável, servindo, por vezes, o desporto de ante-câmara doutras pretensões. Será que o país está preparado para gerir novos desafios com o europeu de futebol? Esta indústria tem muitos escravos. Saberemos libertá-los, denunciando a situação vigente?
* A exclusão social, gerada pela pobreza, pelo desemprego, pela falta de habitação, pela desigualdade no acesso à saúde e à educação, pelas doenças crónicas, e que atinge particularmente as famílias mais carenciadas, as crianças e as pessoas idosas, e determinados grupos sociais.
Somos, de facto, um país onde as assimetrias regionais, sociais, culturais (e outras) crescem a olhos vistos, se os tivermos minimamente abertos! É importante denunciar, mas torna-se urgente construir respostas de índole mais profética. A Igreja continua a ser a voz tribunícia de muitos excluídos. Assim saiba continuar a sua missão.
Oxalá se reflicta melhor como educar os crentes na correcção destes pecados sociais.
A. Sílvio Couto