Dossier

Leigos, uma cara diferente da Igreja

Lígia Silveira
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Sociólogo Alfredo Teixeira ajuda a perceber que rostos católicos preenchem a opinião pública

Como é que as comunidades cristãs aparecem na sociedade portuguesa? Que mensagem passam essas comunidades? A opinião pública está consciente que a ideia de “igreja†contempla para além da hierarquia, um conjunto de leigos que, nas mais variadas dimensões, actuam na sociedade? Alfredo Teixeira, sociólogo e teólogo, explica à Agência ECCLESIA que, apesar do Concílio Vaticano II ter apontado o papel do leigo como fundamental na Igreja, falta uma reflexão, mais alargada sobre o que são as formas de participação das comunidades cristãs na sociedade e também sobre a sua diversidade ministerial. O sociólogo aponta que ocorre uma grande alteração na experiência dos cristãos leigos, que conduz à percepção de que “a sua experiência é minoritáriaâ€, aponta. No quotidiano das pessoas “as referências explícitas à identidade católica e cristã tornam-se mais difusas e difíceis de identificarâ€. Alfredo Teixeira aponta que a experiência das pessoas é paradoxal, “quando em termos macro sociais continuamos a dizer que a sociedade portuguesa é fundamentalmente católicaâ€. Quando na cena pública se fala de Igreja, o âmbito em que essa palavra é indicada refere-se à sua dimensão institucional, “onde esta dimensão de expressão laical não aparece distinta da hierarquiaâ€. O sociólogo acredita que “a condição laical enquanto tal, não tem expressão na cena públicaâ€. Revalorização laical Segundo Alfredo Teixeira, as sociedades contemporâneas hiperespecializaram-se o que traduz uma “dependência dos representantes dessas instituições públicas e das comunidades a que pertencemâ€. Apesar da revalorização laical, “quando queremos que alguém aponte a visão da Igreja sobre determinado problema, invariavelmente vamos parar aos actores eclesiais. É raro que um cristão leigo assuma esse papel na cena públicaâ€. O tipo de participação dessa condição laical, “nesse contexto de minoria, é por capilaridade, não tem a mesma visibilidade na cena pública que outro tipo de actuações têmâ€. Por isso “não é fácil delimitar o tipo de acção e intervenção dos leigos nos determinados sectores em que estão inscritosâ€. Alfredo Teixeira afirma que alguns leigos aparecem com frequência identificados como católicos e têm uma certa preponderância social, dada a sua formação intelectual ou pela sua inscrição em determinados sectores relevantes na sociedade portuguesa. “As suas intervenções são recebidas, em muitos casos, como inseridos numa determinada experiência cristãâ€, e conotados “com um quadro ideológicoâ€. “A sociedade tem dificuldade em perceber a diversidade interna da própria Igrejaâ€. Dentro da diversidade, “há que encontrar formas que conduzam à percepção de uma comunidade múltipla, com diferentes graus de integração, onde existem pessoas que assumem uma responsabilidade diferenteâ€. Alfredo Teixeira lamenta que na cena pública haja falta de expressão de diversidade. A expressão “ajudaria a estabelecer mais pontes entre a igreja e a própria sociedade no quadro desse pluralismoâ€. Os «opinion makers» são “sempre os mesmos e demasiado próximos de um universo ideológico, por vezes, próximo de um circuito político e que não traduz aquilo que é a diversidade da Igrejaâ€. O associativismo é uma realidade na sociedade, sendo resposta para organizações eclesiais e civis. Para o sociólogo as sociedades marcadas pelas culturas urbanas não reproduzem os modelos tradicionais de relação comunitária. “As pessoas não estabelecem laços entre si da mesma forma que estabeleciam dentro da comunidade camponesa e no contexto em que o modelo de paróquia católica foi criadoâ€. A forma associativa “tem uma capacidade de mobilização e de acompanhar as pessoas, criando novas formas de relação entre si, que em certas estruturas tradicionais não era possívelâ€. A forma associativa é uma resposta “à realização e também de pertença à comunidade cristãâ€. Alfredo Teixeira aponta duas formas bastante distintas de associativismo – “uma bastante comum, outra, infelizmente, não tão comumâ€. A primeira é a edificação de formas associativas a partir de instituições da Igreja, que em muitos casos são até reconhecidas canonicamente, e que têm como objectivo intervir em diversas realidades sociais. Outra realidade é a dos cristãos aproveitarem o que são as próprias estruturas existentes na sociedade ou até os instrumentos legais que permitem a criação de associações de todo o género para intervir na sociedade de diferentes formas, “em muitos casos até fazendo lobby†em ordem à mudança da sociedade. “Estas acções não estão necessariamente dentro das estruturas organizacionais da Igreja, são associações civis, embora com essa inspiração cristãâ€. O sociólogo lamenta uma carência deste segundo modelo de associações, tanto em número como em exposição. “A Igreja Católica precisaria articular-se com associações deste género, porque em muitos casos, quando uma determinada acção é recebida na sociedade apenas a partir da sua configuração confessional, ela é relativizadaâ€. Respostas associativas Alfredo Teixeira indica que seria benéfico valorizar respostas associativas que, mesmo fora do âmbito institucional eclesial, têm “inspiração cristã e capacidade de abertura, integrando pessoas com um maior ou menor grau de identificação cristãâ€. O caminho para o leigo está dependente da resposta à questão: como posso ser cristão nos diversos contextos em que a minha vida se envolve? “Esta é a pergunta fundamental a um cristão leigoâ€, aponta o sociólogo. Alfredo Teixeira afirma que “boa parte das espiritualidades mais comuns nas comunidades apontam para um centramento sobre a experiência emocional da fé, por vezes com alguma exibição do grupo, mas pouco orientado para pensar na participação das pessoas na sua vida e realidadeâ€. Sinal disso mesmo é a lacuna que existe nas gerações mais novas de “cristãos leigos que tenham um papel preponderante e para quem, essa questão seja central na sua identidade cristã e na sua experiência de féâ€. “Talvez haja um défice de reflexão e de desenvolvimento de uma espiritualidade laical que renove esta experiência do cuidado do mundoâ€, aponta o sociólogo. Um compromisso que estava “bastante presente na espiritualidade da acção católica – ver, julgar e agir†e que “precisa de ser actualizadoâ€.


Apostolado dos Leigos