"Neste contexto, e uma vez que «votar é escolher caminhos», só nos resta, perante a consciência perplexa, escolher o que nos pareça o mal menor" - afirma o director o do «Correio do Vouga»
1 - As mechas de optimismo que ainda fumegam no meu íntimo não me dão motivos de grande satisfação. Um dos apelos firmes dos nossos bispos - “É urgente criar uma onda de fundo de entusiasmo por Portugal, em que as legítimas diferenças se transformem em riqueza e não em obstáculo.” - caiu em saco roto. Até os “sábios” da política ajudaram a criar intriga, beneficiando a trama de interesses, gerando a confusão no povo, dando suporte a veleidades de propaganda e a falsas promessas. E ainda nos querem alijar com as culpas da eventual catástrofe!
2 – Um outro apelo se nos escapou das mãos - “Forcemos os partidos a porem o acento da sua intervenção na qualidade das propostas que nos fazem, na competência e dignidade das pessoas e não apenas nos discursos que o ambiente de campanha habitualmente inflama.” A maioria de nós só tem hábitos de reagir; falta-nos capacidade estruturante de agir. Não temos orgânica de sociedade civil que “ponha em sentido” as “máquinas partidárias”, nem processo eleitoral que responsabilize directamente os candidatos.
3 - Esboçaram-se alguns movimentos, com propostas sérias; alguns sectores promoveram esclarecimentos; emitiram-se boas declarações. Mas faltou o “timing”, a convicção na luta, a sinergia de iniciativa. E o processo eleitoral não dá a possibilidade de entrar numa dinâmica que confronte os partidos e os candidatos. Fizeram-se encontros... E os aparelhos partidários aproveitam ou rejeitam o que se disse ou sugeriu sempre na lógica do seu próprio interesse ou das clientelas, e não do bem comum.
Na verdade, o que nos é proposto escolher pouco ou nada diz das reais possibilidades do país - que as tem, dos compromissos dos agentes capazes de movimentar a sociedade, dos projectos objectivos em matéria de defesa da vida, da dignidade humana, da família, do bem comum, de uma economia social...
Só haverá menos Estado com: descentralização, iniciativa privada e cooperativa, superação do hábito de subsídios para tudo, subida da fasquia da vontade de trabalhar, elevação cultural... E quem tem unhas que toque guitarra, isto é, quem tem dotes que os ponha, mesmo com risco, ao serviço da comunidade. Solidariedade não é colectivismo! Liberdade não é liberalismo! Temos muito caminho a percorrer!
4 - Neste contexto, e uma vez que “votar é escolher caminhos”, só nos resta, perante a consciência perplexa, escolher o que nos pareça o mal menor. Só que isso tem de levar consigo o esforço de uma nova cultura da participação na vida pública, do exercício activo da cidadania; reclama comprometer-se no questionamento aos eleitos; sobretudo, impõe o compromisso da verdade na política, do amor fraterno e do serviço, da honestidade e generosidade, na procura do bem comum.
Nada vai mudar, mesmo que mude a cor política! Mas estou esperançado que, de facto, mude o ciclo político, por que anseio e que já vislumbro: o espírito empreendedor de muita gente, a iniciativa local, a garra de grupos e movimentos, que não deixem em paz os sequiosos do poder!
Querubim Silva