1. Não é difícil enumerar algumas sugestões para que os cristãos se comprometam mais na erradicação da pobreza e na solução de outros problemas sociais. Pelo contrário, é extremamente difícil estimular actuações pessoais e movimentos colectivos para a consecução desse objectivo. Três razões, já ancestrais, vêm impedindo este compromisso social, tão necessário: o predomínio do interesse particular sobre o geral; a transferência de responsabilidades para outrem (o Estado ou outras entidades); e a redução da intervenção social à esfera da assistência e das obras ou instituições sociais.
Apesar destes constrangimentos, vale a pena adiantar algumas sugestões que visam actuações em profundidade e de carácter geral.
Três proximidades
2. No domínio especificamente social, impõe-se incrementar três proximidades estruturantes: a básica, a inter-média e a central. A proximidade básica é a que se observa, no espaço de residência, entre as pessoas carentes, seus familiares, vizinhos, amigos e grupos de voluntários. É nesta proximidade que ocorrem o primeiro conhecimento dos problemas, a ajuda imediata e continuada e a mediação junto de outras entidades.
A proximidade intermédia é aquela em que intervêm organismos públicos e instituições particulares de solidariedade social e também entidades privadas prestadoras de serviços sociais. O acesso a estes conjuntos de entidades pode ser conseguido, directamente, pelas próprias pessoas carentes ou através da mediação de outras pessoas que fazem parte da proximidade básica.
A proximidade central é a que se observa (ou devia observar) entre representantes do Estado e das instituições sociais de âmbito nacional.
3. Para o conveniente funcionamento das três proximidades, seria indispensável que a básica e a intermédia utilizassem ao máximo os meios de solução disponíveis para os problemas diagnosticados, incluindo o recurso a serviços de saúde, ou outros, que só se encontram nas sedes de concelho ou noutras localidades, particularmente nos grandes centros urbanos. Seria também indispensável que, a nível central, fossem levados a efeito encontros regulares entre representantes do Estado e das instituições sociais de âmbito nacional, tendo em vista fundamentalmente: a tomada de consciência dos problemas sem solução, com os meios disponíveis; a procura das soluções possíveis e a preparação das medidas de política necessárias; e, ainda, o reconhecimento público dos problemas para os quais não se conseguem encontrar vias de solução adequadas.
As três proximidades não funcionarão convenientemente se a nível local (freguesia e município) e nacional, não existir uma verdadeira consciência colectiva dos problemas sociais, fomentadora da prática de co-responsabilidade para as respectivas soluções. As paróquias são espaços privilegiados de promoção da consciência colectiva e de co-responsabilidade solidária, pouco aproveitados por enquanto.
Desenvolvimento
integrado e inclusivo
4. Para além do fomento das três proximidades, a solução dos problemas sociais requer também o desenvolvimento integrado e inclusivo. O desenvolvimento integrado, implica, nomeadamente: a abrangência de todas as pessoas e as múltiplas dimensões da vida pessoal e colectiva, tais como a social, a económica, a cultural, a ecológica e a política. Implica, igualmente, a interacção dessas dimensões, com realce para a interacção permanente entre a económica e a social.
Daqui decorre que todas as políticas sectoriais deveriam ter em conta a sua incidência na solução dos problemas sociais, incluindo a sua capacidade para a estabilidade e a criação de empregos. Decorre também o imperativo de harmo-nização, à escala nacional, das diferentes políticas e actuações visando a atenuação e erradicação da pobreza e de outros problemas sociais.
Actuando-se deste modo, o desenvolvimento será efectivamente integrado e inclusivo: integrado, na medida em que abrange todas as pessoas e todas as dimensões da sua existência; inclusivo, na medida em que está permanentemente atento aos riscos de exclusão social, procurando evitá-la e erradicá-la.
5. O desenvolvimento integrado e inclusivo tem um espaço privilegiado de realização a nível de freguesia. Aí é relativamente mais fácil conhecer os problemas sociais e até pessoais, identificar potencialidades, congregar esforços e promover as iniciativas recomendáveis. As experiências de “desenvolvimento comunitário” (que ocorreram, nos anos 60 do século passado, com forte impulso da Profª Manuela Silva) e as iniciativas mais recentes de “desenvolvimento local” são referências inspiradoras da acção que pode realizar-se na generalidade das freguesias e concelhos.
As juntas de freguesia, as câmaras municipais, o associativismo, as instituições locais, os organismos públicos, bem como as empresas, têm papéis específicos a desempenhar no esforço de desenvolvimento local (também designado “sociolocal” para acentuar o peso das dimensões sociais).
6. Neste conjunto de entidades, é particularmente relevante a paróquia, atendendo ao seu enraizamento, à sua antiguidade, à cultura e prática de comunidade, mais ou menos consolidada, e à multiplicidade de iniciativas que têm caracterizado a sua história. Até se recomenda que – independentemente de aspirar à liderança – a paróquia tome a iniciativa de promover o desenvolvimento local e de suscitar o interesse de outras entidades.
7. No plano nacional, destaca-se o PNAI (Plano Nacional de Acção para a Inclusão) que, aliás, se integra numa iniciativa mais ampla, que abrange todos os países da União Europeia. Este Plano, baseando-se em preocupações de natureza social, procura ser integrado e inclusivo. Procura também suscitar a participação das populações locais e dos diferentes organismos, instituições, grupos e outras entidades que possam contribuir para o desenvolvimento integrado e inclusivo.
O PNAI ainda se encontra muito distante das populações locais. Muitas nem sequer têm conhecimento da sua existência. Tal facto, porém, não constitui motivo para não ser tido em conta; pelo contrário, é desejável que o PNAI seja objecto de ampla e profunda participação, e que esta venha a contribuir para o seu melhor ajustamento às realidades, necessidades e potencialidades sociais.
Acácio F. Catarino