Dossier

Os caminhos por andar

Pe. Joaquim Cardozo Duarte
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Pe. Joaquim Cardozo Duarte, antigo director do Secretariado Nacional das Comunicações Sociais

A edição do n.º 1000 do Agência Ecclesia acontece na proximidade da festa da Anunciação. A memória do que podemos classificar de novo génesis da história da salvação – a celebração é este ano, por força da lógica da liturgia, deslocada para um pouco mais tarde, já na Páscoa – é um bom pretexto para reflectirmos, ousadamente se bem que rapidamente, sobre o estado da comunicação social da Igreja em Portugal. A recriação ou o renascimento é que nos há-de ir mostrando o que está já lá escondido, no ventre da maternidade da solicitude pastoral, desde o anúncio que precede o nascimento primeiro e deve depois inspirar todos os renascimentos. O Cardeal Carlo Martini, na altura à frente da pastoral da comunicação para a Europa, disse, em Fátima e por ocasião do 1.º Encontro europeu de Comissões episcopais que então organizámos em Portugal, que o mistério da anunciação ou do anúncio era, por si mesmo, uma boa referência ou um bom paradigma para, primeiro, compreender e, depois, gizar e concretizar, um Plano para este sector, porque implicava e sugeria uma antropologia, uma teologia e uma profecia. O momento e ocasião não dão agora para aprofundar a sugestão, a qual se deve compatibilizar com as outras linhas de orientação teológica dos Documentos sobre este tema, as quais apontam, ora para as “maravilhas†de Deus, ora para Jesus como o perfeito comuni-cador, ora, depois, para a presença, em rede, da Igreja, na complexidade e co-implicações deste mundo da massificação da comunicação, em busca da utopia da transparência, em rápido desenvolvimento. Alguns dos que estão de fora, dirão que o que temos, sempre é melhor do que nada, até para nos anestesiarem a reflexão e nos deixarem entretidos com o nosso quintal à beira das auto-estradas plantado… Alguns dos de dentro, viverão ainda dos medos quase reverenciais, próprios dos começos e da distância, cultivada, face à transcedência deste fenómeno, deixando a outros, tidos por mais sabedores e quase omniscientes, a exclusividade de pensar a fundo este sinal maior dos tempos… Os pastores, terão a tentação de desertar perante os técnicos e os especialistas, invertendo, neste caso e neste campo, aquela forma de relação que sabiamente praticam noutras áreas do apostolado. Uma das (pequenas ou grandes) tragédias da pastoral da Igreja, tem sido a de esquecer a especificidade e a originalidade que devem marcar a forma da sua presença em qualquer um dos campos em que reivindica o seu direito à visibilidade: na educação ou na assistência, na saúde ou no turismo, na política ou na comunicação, na arte ou na filosofia, até na forma de fazer teologia ou de defender a natureza, na família e junto dos idosos, na sexualidade ou na afectividade. Uma reflexão em profundidade está por fazer, neste campo da massificação da comunicação, pelo menos a dois níveis: o da radicalidade dos fundamentos e da forma da sua vivência cultural entre nós e o da operacionalização de propostas e de estratégias, hoje e aqui. A radicalidade dos fundamentos não dispensa da inevitabilidade de ter de optar por estratégias, tal como a opção por certas estratégias não pode ferir a fidelidade aos fundamentos, nem estreitar o campo das ousadias. Mais do que a escassez de meios ou de pessoas, o que pode estar a faltar é uma re-visão em profundidade e a capacidade de integrar e de convocar para a missão os que andam distraídos ou desatentos e de amavelmente questionar os que se habituaram às habituações dos seus hábitos e a isso reduzem a novidade da Boa-Nova. O desencanto anda muitas vezes paredes meias com as rotinas e com as auto-satisfações, em circuito fechado ou em círculos reduzidos, que tendem a se auto-reproduzirem e que infindavelmente se auto-alimentam. Os caminhos por andar são talvez muito simples e certamente muito belos, com a marca da ousadia e da novidade e feitos de confluências certamente não sincréticas. O Agência Eclessia não existe sozinho, nem apenas por si próprio ou para si próprio. A Igreja e o mundo são a rede em que se integra, reticular por natureza e por missão. Como alguém dizia: a Igreja tem de voltar a co-responder, para não se sentir culpada perante Quem lhe dá a força de se manifestar. Pe. Joaquim Cardozo Duarte


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