Dossier

Para uma paróquia mais comunitária

D. Manuel Madureira Dias
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Manuel Madureira Dias, Bispo do Algarve

O Vaticano II deu um forte contributo para a vida comunitária, no interior a Igreja. Embora tenhamos de registar muitos e fecundos esforços, ainda antes do Concílio, no sentido de ajudarem a Igreja a rever-se nas suas estruturas e na prática da sua acção pastoral, foi o Vaticano II que, com a autoridade que lhe cabe, deu o maior impulso a uma nova maneira de olhar para as nossas comunidades cristãs, sejam elas paróquias ou outras. De facto, se estivermos atentos ao ensinamento conciliar, damo-nos conta dum conjunto de princípios base que, uma vez postos em acção, provocarão uma imagem completamente diferente daquela que ainda hoje, quarenta anos depois, teima em persistir. A paróquia é-nos apresentada como «sinal» e «instrumento» da presença da Igreja, implantada no meio das casas dos homens; é considerada como unidade pastoral de base, como célula da Diocese, como expressão visível mais imediata da Igreja num local. Ora, a Igreja, segundo a doutrina do Vaticano II é, para além de mistério, Povo de Deus e comunhão. Com estas duas caracterizações essenciais, não pode haver mais espaço para uma Igreja a viver, com lideranças individuais centra-lizadoras de toda a vida comunitária. A paróquia, hoje, tem de ser vista como comunidade de fiéis e não como o rebanho dum Pároco. Uma paróquia, renovada com este espírito, dará um papel de relevo, muito acentuado, ao serviço da Palavra da Bíblia, como base da renovação interior para todas as camadas etárias. Privilegiará, por isso, a catequese e a missão, dando prioridade a uma Pastoral de Iniciação e ao Catecumenado. Quanto à vida litúrgica: atribuirá um papel de muito relevo aos fiéis leigos da comunidade e celebrá-la-á sempre com um acentuado pendor catequético. Privilegiará as celebrações sacramentais de índole comunitária. A Liturgia será festiva. Dará prioridade ao Baptismo de adultos e terá muito a peito a acção pastoral da juventude, criada à volta do sacramento da Confirmação. Do ponto de vista do regime vigente: o Pároco actualiza-se e está próximo do Povo; a paróquia abre-se à liderança dum grupo, com tendência a chegar à corres-ponsabilidade dos mais variados membros da comunidade. A economia está confiada a um Conselho efectivamente interveniente, sob a presidência do Pároco, mas diz respeito a todos. Emergem ministérios diversificados no interior da comunidade. Quanto ao compromisso social: Cultiva-se a preocupação missionária, atende-se, comunitariamente à promoção e beneficência em favor dos mais carenciados. A comunidade, como tal, integra bem as diversidades e atende aos pequenos grupos e aos bairros, como pequenas comunidades, integradas na comunidade mãe. A paróquia é, antes de mais, uma comunidade de fiéis; assim a define o Código; é uma família de Deus em fraternidade como refere a própria Lumen Gentium (28); ou ainda, como escreveu João Paulo II : casa que se abre para todos e está ao serviço de todos, fontanário da aldeia a que todos acorrem para matar a sede. (cf. Ch. L. 27). Tendo em conta todos estes princípios doutrinários temos de reconhecer situações muito diversificadas, preocupados, contudo, com uma mudança em ritmo crescente, que ajude a atingir o ideal de paróquia que nos é proposta pela própria Igreja. Deste modo, podemos afirmar que muitas das nossas comunidades eclesiais, (paróquias e outras), são ainda comunidades marcadamente verticais, assentes em lideranças muito individualizadas, e, consequentemente, demasiado clericalizadas. A missão dum Pároco, a quem cabe sempre, a presidência da comunidade paroquial, para não deixar que ela se torne acéfala, é a missão do Pastor que indica caminhos, mas não substitui os membros do rebanho; que chama e guia, mas não impõe; que coordena e congrega, mas não impede a criativi-dade; que sabe descobrir os dons dos membros das comunidades e lhes atribui responsabilidades, em ordem à comunhão de todos, como um corpo. É também a missão do Educador da Fé, que garante a formação dos membros das comunidades, formando formadores, por si ou por outros, dando apoio de modo especial aos responsáveis pelos diversos serviços. É o Representante de Cristo na presidência da comunidade, a quem cabe a missão de garantir a presença de Cristo ressuscitado, no meio do seu Povo, que é chamado a conduzir à perfeição da vida cristã, pela oração e pela vida sacramental, como Servidor do Povo a si confiado. Deste modo, é óbvio que a maioria das nossas comunidades cristãs, em suas estruturas, ainda se encontram longe dos dinamismos comunitários, e dos trabalhos de conjunto (em equipa) que tendem a tornar-se norma, mesmo na sociedade civil. Temos bem clara a doutrina sobre esta matéria. Mas não é fácil passar da doutrina à sua prática. Há muitas barreiras a vencer: requerem-se novas atitudes, quer no clero, quer nos fiéis leigos. Aqueles precisam de progredir, e muito em espírito comunitário; estes têm ainda de descobrir variados aspectos da sua missão na Igreja e no mundo e de se colocarem cada vez mais, ao serviço das comunidades, com consciência da responsabilidade que lhes cabe, pelo facto de serem membros da Igreja, numa determinada comunidade de fé e amor. A entrega, de comunidades, a leigos, ainda que sob a responsabilidade última de algum Pároco, é muito positiva e abre a experiências de prática comunitária futura, que se prevêem bastante eficazes. Quando faço esta afirmação, não me refiro apenas à animação de celebrações dominicais, na ausência de Presbítero. Estou a pensar em algumas experiências levadas a cabo, no interior algarvio, por leigos que assumem a orientação da vida das comunidades. Esta opção surgiu, por circunstâncias que Deus colocou no nosso caminho, já lá vão mais de dez anos, quando a carência de clero ainda não era tão acentuada como hoje. Mas independentemente do número de sacerdotes, reputo de muito importante que caminhemos na direcção duma cada vez maior responsabilidade laical, simultaneamente, com um grande empenho na promoção de vocações sacerdotais. Precisamos de ter uma Igreja que seja mais comunhão, na qual tenham papel activo, tanto os sacerdotes como os leigos, cada um segundo a missão que lhe cabe, no interior da Igreja e no mundo, onde importa lançar o fermento do Evangelho. Manuel Madureira Dias, Bispo do Algarve


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