Dossier

Um certo maquiavelismo da campanha anti-tabágica

A. Silvio Couto
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Fumar causa elevada dependência. Não comece a fumar; Fumar mata; Fumar provoca o cancro pulmonar mortal; Fumar prejudica gravemente a sua saúde e a dos que o rodeiam; Os fumadores morrem prematuramente

Eis alguns dos slogans da campanha que está em curso, em Portugal, adstrita às embalagens (vulgo maços) de tabaco, enquanto se vai falando de uma outra campanha ainda ‘mais agressiva’ através de fotografias com as consequências dos malefícios do tabaco. De referir que, numa sondagem recente, oitenta e quatro do por cento dos portugueses concordam com a campanha anti-tabágica em curso. Entretanto, os fumadores, recorrendo à dificuldade em aceitarem o impacto da referida mensagem, estão a revestir/transferir os maços de tabaco para cigarreiras, por forma a ‘iludirem’ a campanha. As vendas destes adornos de fumadores cresceram, nalgumas lojas, em quase cem por cento. Outros ainda, servindo-se das potencialidades da internet, propagandeiam outros slogans como: «fumar tira o stress, emagrece e acalma os nervos» ou «adoro fumar»!... Não está em causa julgar as razões que leva um cada vez maior número de pessoas – dizem as estatísticas que o (ab)uso do tabaco está a subir mais entre a população feminina! – a optar pelo recurso ao tabaco nem tão pouco alinhar em considerações moralistas do incremento do consumo do tabaco em cigarro, charuto ou cachimbo... Cada um saberá das suas razões, desculpas ou até motivações. Com efeito, a ‘opção’ de fumar tem diversas matizes, sendo difícil tanto dizê-las de forma simplista como aceitá-las de modo acrítico. Mesmo que de modo descritivo poder-se-ão encontrar facetas do ‘ser fumador’: afirmação de personalidade, questões do foro psicológico-afectivo, impacto social e de meio ambiente, mecanismo de substituição... onde nem sempre a saúde (do próprio e de quem o rodeia) são tidas na devida atenção. De facto, temos estado, nos últimos anos, a consciencializar-nos das implicações do tabaco na saúde pública. Já lá vai o tempo em que um fumador puxava do cigarro e o acendia em qualquer lugar. Hoje temos espaços ‘delimitados’ (ao menos na forma tentada) para fumadores e não-fumadores. Hoje há restrições (algumas delas exigentes, mas nem sempre cumpridas) a que se possa fumar em espaços públicos, transportes ou serviços de atendimento/espera, onde, por vezes, um cigarrito até serviria para queimar a impaciência! Hoje os fumadores, pelo menos os que não respeitam as regras em voga são olhados como perigo para a saúde dos que não fumam, pois, segundo dizem os entendidos, o ‘fumo fumado’ é duas vezes mais perigoso do que o directo. Num entendimento cristão da vida – seguindo os princípios do quinto mandamento da Lei de Deus: ‘não matar nem causar outro dano a si mesmo ou ao próximo’ – este hábito de fumar insere-se na linguagem de atentar contra a própria vida por parte de quem fuma ou de causar dano na saúde dos outros, por parte de quem é vítima do fumo dos outros. Nisto, como noutras formas de comportamento, importa saber estar com os outros, respeitando e sendo respeitado. A. Sílvio Couto


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