Voluntariado na humanização dos cuidados em saúde mental
A experiência de Maria Teresa Gonzalez
Maria Teresa Gonzalez colabora há oito anos como voluntária numa clínica psiquiátrica ligada às Irmãs Hospitaleiras do Sagrado Coração de Jesus, em Lisboa, onde organiza momentos de oração comunitária.
“Todos nós precisamos de atenção e de afecto, e quando nos juntamos para fortalecer esses laços na presença de Deus, o que se dá é algo muito parecido com um milagre, porque é um momento de grande alegria e profundidade” sublinha a escritora, em declarações ao programa ECCLESIA.
Com um vasto trabalho na área da escrita infanto-juvenil, autora da aclamada obra “A lua de Joana” e com participação em colecções como o “Clube das Chaves” e “Profissão Adolescente”, são poucas as pessoas que conhecem a faceta “voluntária” desta especialista em línguas e literaturas modernas, nascida em Coimbra há 53 anos.
Uma ligação que remonta aos seus tempos de estudante, na Casa das Irmãs Doroteias, em Évora, onde todas as alunas eram encorajadas a reservarem um pouco do seu tempo livre para ajudarem famílias carenciadas.
“A partir daí, começou logo a nascer em mim esse gosto por poder fazer alguma coisa de útil nesse tempo dito livre, que no fundo, todo o tempo é livre” defende Maria Teresa Gonzalez, recordando uma missão que depois se estenderia a pessoas toxicodependentes e, mais recentemente, a doentes psiquiátricos.
Uma vez por semana, ela organiza a chamada “Oração da Misericórdia”na capela da Casa das Irmãs Hospitaleiras, convidando cada uma das utentes, através dos mistérios do terço, a falarem directamente com Deus, a exporem os seus problemas, a pedirem por si e pelos outros.
A voluntária, ligada à Pastoral da Saúde, explica que “o objectivo foi que, todas no grupo se sentissem como intercessoras dos outros” a realça que rezar pelo próximo “é algo que dá uma alegria e uma paz muito grande”, mesmo para quem, no seu dia-a-dia, vive momentos de muito sofrimento.
“Às vezes podemos pensar que quem está com uma grande dose de sofrimento não pensará no sofrimento dos demais, bem lhe basta o que já está a passar. Mas não é assim, tenho verificado que há esse interesse, essa abertura ao outro, que é uma grande lição para mim”, revela.
A Congregação das Irmãs Hospitaleiras do Sagrado Coração de Jesus, fundada em Espanha em finais do século XIX, é uma instituição religiosa que se dedica a fornecer cuidados de saúde a pessoas abandonadas ou em situação de exclusão social, especialmente na área da saúde mental.
Desempenha esta missão seguindo o lema da abertura e do acolhimento do outro, independentemente da sua situação, algo que está definido pelo conceito da verdadeira hospitalidade.
O voluntariado é visto como uma parte importantíssima para a concretização deste trabalho e as Irmãs contam no nosso país com cerca de 200 colaboradores.
Mais do que cumprirem uma função técnica, os voluntários transportam sobretudo humanidade, gratuidade e entrega à vida de cada doente.
“Os rostos transfiguram-se quando vêem as voluntárias” revela a irmã Isabel Morgado, que trabalha na Casa das Irmãs Hospitaleiras, em Lisboa, e que considera o voluntariado como algo “importantíssimo em instituições como estas”.
Basta um exemplo para confirmar esta “regra” – “Se alguma vez não posso vir, ou se há alguma actividade que impeça que haja este momento de oração, as utentes perguntam-me ‘Não vieste, o que é que aconteceu?’”, conta Maria Teresa Gonzalez, para quem também “é difícil não levar dali os rostos, os sorrisos, às vezes os problemas ou pedidos que são feitos”.
Apoiando-se numa experiência de muitos anos de serviço ao próximo, a escritora acredita que mesmo o “pouco” que faz, tendo em conta os problemas que afectam os doentes, pode fazer a diferença.
“Começa no nosso próprio coração, abre logo as nossas fronteiras, deixamos de estar tão centrados em nós mesmos”, aponta a autora, defendendo que “educar para sensibilidade é fundamental”.
Já com dois livros publicados sobre esta matéria, desde que começou a colaborar neste projecto, Maria Teresa Gonzalez tem já outras ideias em mente para pôr em prática na Casa das Irmãs Hospitaleiras: dinamizar a biblioteca da instituição.
“Convidar um conjunto de utentes e conversar um pouco sobre os livros, fazer algumas leituras em voz alta, fazer da leitura um prazer, que é o que deve ser”, sustenta a escritora.
Desta forma, Maria Teresa Gonzalez vai procurar aliar a sua paixão pela escrita e pelos livros com o seu amor pelo serviço aos outros.
PTE/JCP
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