Editorial

A reconstrução da cidade

António Rego
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Os vencedores reconfirmarão a ideia que sempre suporta o júbilo da vitória política:”o povo é, não só soberano mas também inteligente, perspicaz, leitor atento das entrelinhas da campanha eleitoral”. Os vencidos, embora digam que não conseguiram fazer passar a sua mensagem, acabam por se confortar, amargamente, com os últimos estudos sobre o baixo grau de escolaridade do povo, as tabelas que ocupa no ranking cultural europeu. E ainda essa trágica consolação de o país não merecer tanta competência e generosidade. Os derrotados muito frequentemente pensam que o país não os merece. Enfim. Tal como na final duma grande taça, as razões atabalhoam-se como as esferas aos saltos na caixa mágica do euro-milhões. Estamos, pois, em tempo de serenar o espírito, duramente fustigado pela verborreia, por vezes histérica, de algumas intervenções na campanha eleitoral. Os tons foram sendo puxados em níveis cada vez mais estridentes. E arrastaram-se uns aos outros. Ninguém se assustou em demasia e apenas alguns cardíacos deram imagem pública de total vulnerabilidade face ao prélio de palavras e encenações. O tempo é de interiorizar os restos de palavras, escritas na areia da nossa pequena história. Estamos, afinal, mesmo com camisolas diferentes, embarcados na mesma viagem. E sabemos que as ondas podem chegar-nos do outro lado do planeta. E que todos somos poucos para, nas dimensões limitadas da nossa barca, nos aceitarmos e apoiarmos na complexa travessia que nos espera. Aprendendo sempre melhor as lições que a história nos dá e que damos à história. E acendendo a coragem da reedificação da cidade que a todos nos compete. Esta teoria não é de direita, centro ou esquerda. Verte do Evangelho com a naturalidade com que se constrói o Reino. É preciso fazer contas e edificar a nossa casa comum sobre a rocha. A cidade está sempre em reconstrução. António Rego


Reflexo