Editorial

Cansaço

Octávio Carmo
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Octávio Carmo, Agência ECCLESIA

O Papa fez esta semana um notável discurso sobre Economia Social de Mercado, o futuro do sindicalismo, a necessidade de retirar horas de trabalho aos que estão mais perto da reforma e abrir espaço para a entrada dos mais jovens no mundo laboral. Em 2013, tal discurso teria sido divulgado imediatamente nas redes sociais, nas televisões, mereceria comentários nos jornais dos dias seguintes. Mas hoje já não. O motivo é simples: cansaço.

Nosso, não do Papa Francisco, que fique claro. Cansamo-nos depressa nesta era da hipervelocidade, da hiperinformação, da necessidade permanente de novidade. Não conseguimos estar a olhar muito tempo para o mesmo sítio, de dar atenção, de ponderar, filtrar, avaliar. Vivemos para reagir, de preferência com veemência, até porque parecemos sempre ser donos da razão.

Esta longa introdução serve para alertar para o óbvio, no caso dos recentes incêndios: para quem sobreviveu, tudo continua por fazer. Provavelmente, o mais difícil até começa agora, em termos de luto e de luta.

As manifestações de solidariedade, até ao momento, têm sido extraordinárias, mas vivemos neste risco constante do cansaço. Num concerto que recolheu mais de um milhão de euros em donativos, a atenção das redes sociais concentrou-se rapidamente num momento menos feliz - reconhecido pelo próprio - de Salvador Sobral. Estamos prontos para largar a “conversa dos incêndios”, não há dúvida. Mas é pena, porque deixar de lado este tema, sobretudo no inverno, tem tido custos muito elevados em cada verão.

As vítimas destas tragédias não podem ser vítimas da “impersistência da memória”, nos nossos dias. Deste enxame de abelhas que produzem o seu fel (leu bem, não é erro) saltando de polémica em polémica. O cansaço dos bons, como sabemos, tem sido a oportunidade dos maus. Vamos combatê-lo.

Octávio Carmo

Octávio Carmo

Agência ECCLESIA



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