Futebol ao rubro António Rego 19 de Outubro de 2004, às 12:41 ... Tornou-se praticamente causa perdida separar o desporto profissional – mormente o futebol – de uma grande empresa com “accionistas†que todas as semanas realizam, em pleno estádio, a sua “assembleia geralâ€, com votos expressos de apoio e protesto. Os clubes são Sades que ninguém se atreve a contestar por falta de imaginação para criar outros meios de sobrevivência, com nomes mais poéticos ou desportivos. O desporto converte-se, assim, em empresa de espectáculo, com os seus atletas que, de arena em arena, vão tentando imolar outras vÃtimas até que, cumprido o calendário, um é aclamado rei pelo somatório de vitórias conquistadas. Nada tem de irónico esta breve crónica. O desporto inscreve-se na lista dos temas não racionais mas nobres, da vida, desenvolvidos pelos povos ao longo dos tempos. E é tão legÃtimo como a arte e as representações que preenchem o lúdico, o imaginário, o estético e o competitivo do ser humano. Do nosso lado nem temos muito a queixar-nos. Governantes e governados, operários e camponeses, soldados e marinheiros, intelectuais e iletrados, ricos e pobres, vestem a mesma camisola e defendem as suas cores com semelhante paixão e muito poucas variantes de vocabulário. E assim os jornais, rádios e televisões dão todo o tempo, meios e atenção aos eventos desportivos. Possivelmente apenas as mulheres – cada vez menos – olham este todo com um sorriso complacente, cientes de que muitos dos berros que escutam contra os árbitros e adversários desportivos são pedras atiradas janela fora que nem partem vidros do vizinho nem voltam para trás. Com tudo isso, o futebol é uma grande festa. Sentimo-lo particularmente no último Euro. Todos do mesmo lado, no fracasso como no êxito, do desporto extraÃmos o melhor que ele pode dar como espectáculo, festa ou catarse exorci-zante das nossas rotinas. Os nossos dirigentes desportivos têm responsabilidades éticas e sociais na gestão da complexidade dos mecanismos humanos que o futebol envolve. Não lhes compete esmorecer o entusiasmo dos adeptos. Mas não o podem alimentar à custa de quezÃlias primárias que podem gerar graves explosões, de consequências imprevisÃ-veis. Mesmo com os descontos que se dá aos acervos de linguagem, há riscos que se não devem correr. A lição principal veio mais uma vez do povo. Mesmo sob os violentos fogos cruzados dos dirigentes, soube viver o futebol como festa, sobrevoando a agressividade das palavras e ameaças. António Rego Reflexo Share on Facebook Share on Twitter Share on Google+ ...