Editorial

Mais que um lamento

António Rego
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Porque será que tão rapidamente passamos da nacional euforia de sermos os melhores do mundo, à depressão colectiva do último lugar, com o peito rasgado por culpas como pedras? Possivelmente tanto num como noutro extremo tomamos demasiado a sério a nossa originalidade tanto de sublimes como de medíocres. O que nos acontece repete-se em centenas de lugares do planeta e multiplica-se por situações que em peso, cultura e medida, se assemelham a nós. Acresce que os guindastes de elevação e as escavadoras de fossos têm o mesmo fabrico de origem. Isso tem como consequência as mesmas causas produzirem os mesmos efeitos. Mesmo que o fado queira dizer fatalismo, destino marcado, (quase sempre em rota de colisão com a festa e a liberdade) muito mais do que pensamos está nas nossas mãos. Ou seja: há falsos clamores plangentes tal como muitas das nossas histerias se alicerçam no fogo-fátuo que sempre embala os sentimentos de superfície. A nossa história, obviamente original, envolve-se, nos novos tempos, com muitas outras histórias, com elas se cruza no campo cultural, religioso, económico e político. Já percebemos que, orgulhosamente sós, não vamos a nenhum lugar de destino, a não ser ao beco das nossas obsessões de megalomania ou pequenez que, por vezes, se alternam nos pequenos êxitos ou fracassos que cruzam os nossos céus e a nossa terra. A história é mesmo mestra da vida. Não apenas a história do passado, perdida na penumbra dos tempos, mas a que construímos todos os dias. Precisamos aprender com os nossos desaires no campo desportivo, político, empresarial. Precisamos olhar o que fizemos e fazemos bem feito nestes recentes anos. Precisamos olhar alongadamente para o lado, para o longe, e interpretar os sinais em todas as direcções, compreender as conjunturas que nos envolvem e condicionam, as poten-cialidades e mediações que a Europa e o mundo nos oferecem. Não está escrito em nenhum livro, ou na palma da mão de qualquer feiticeiro, o nosso sucesso ou a nossa condenação.Com a fé de quem entende o passar do sopro de Deus em todos os tempos, temos de procurar, solidariamente as energias e as potencialidades que nos oferece cada situação. A vida é muito mais que um lamento ou um grito de estádio. António Rego


Reflexo