Ou talvez não António Rego 09 de Fevereiro de 2005, às 11:16 ... O cidadão comum ouve o pregão. Vem à janela e espreita. Tenta ouvir melhor. Quando começa a entender a lenga – lenga, eis que outro pregoeiro levanta a voz. Diz algo de semelhante em tom diferente sobre o género de produto que tem para vender. E antes de terminado o seu discurso, outro pregão se interpõe, tentando dizer mais do mesmo, e mais alto. E assim sucessivamente. O cidadão, que pode ter o nome de qualquer um de nós, pensa fechar a janela. (Na maior parte das casas as janelas têm outro nome: televisão). Mas há uma espécie de impulso interior ou rebate, a dizer que não se pode fechar todas as janelas, há que olhar o mundo, sentir-se responsável …e isso também passa pela escolha certa face à variada gama de produtos. Viver de costas para o mundo sem opção clara, é uma clausura forçada e, no mÃnimo, inútil. Passam, pelas nossas portas e janelas virtuais, discursos exaltantes que, mais que nos tempos comuns, nos interpelam por várias razões. Há uma construção especial de mensagens em tempo de campanha. Estão em causa pessoas, rostos, vozes, trajes e discursos que diariamente entram nas nossas casas e que, sem nos apercebermos, se tornam amigos ou inimigos, aliados ou adversários, simpáticos ou detestáveis. E que se não afaste a dimensão de jogo ou clubismo, camisola de amar ou repudiar, candidato a uma vitória ou derrota em que seremos envolvidos. Acresce que esses senhores se propõem ser gerentes dos nossos haveres e representantes do povo e da terra que somos. Tudo isto ganha particular ênfase em campanha eleitoral. Teoricamente é um tempo de excelência para lançar projectos, pessoas e programas que respondam à s inquietações a que a polÃtica tem por dever, dar saÃda. Na prática, porém, pode dar-se exactamente o contrário: o tempo em que nada do se diz merece ser escrito pois existe uma espécie de cumplicidade de o pregoeiro vender mentiras e o cidadão, sem escândalo especial, apenas as não comprar. As coisas sérias da vida ficam para outra altura. Não é imperioso que se bata com a porta ou a janela na cara do pregoeiro. Talvez seja útil deixá-lo esticar as cordas vocais. Mas o melhor é escolher outra altura para o tomar a sério. António Rego Reflexo Share on Facebook Share on Twitter Share on Google+ ...