Editorial

Pré-Natal

António Rego
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Quase sempre se diz, escondendo possivelmente, um pouco de medo, que a novidade é pagã. Sei lá, o comboio, o carro, a passarola voadora, o cinema, o telefone de Bell ou a rádio de Marconi. Ainda não nos encontramos a grande distância do lançamento dessas descobertas e já vemos que, na sua forma inicial, não passam de peças de museu. O seu desenvolvimento, porém, conjugado com outras descobertas tecnológicas, na área da comunicação e do digital, alterou completamente o nosso mundo. É quase incrível o que se faz no campo da medicina, da cirurgia, engenharia, com a panóplia infindável de novas tecnologias da comunicação, nessa cumplicidade progressiva entre informação e informática. A ecografia ou a ressonância magnética, entre outros, por exemplo, permitem visualizar zonas recônditas do corpo humano. A ecografia, que pode ser vista em família como qualquer vídeo, permite hoje observar um novo ser no ventre materno desde as primeiras semanas, perceber o seu movimento e, logo depois, observar os membros, os órgãos, enfim, uma vida cada vez mais próxima e parecida com a nossa. E assim se estabelece uma relação humana cada vez mais precoce. E, de forma tão sublime, que há pais que começam muito mais cedo a amar os seus filhos, mesmo quando se apercebem da existência de alguns elementos complexos no processo de crescimento. O amor começa como que mais cedo. Trata-se de uma relação cada vez mais pessoal e menos de observação de um fenómeno genético. “A mulher é dona do seu corpo”, diz-se por vezes em argumentação rápida. Mas aquele ser não é o seu corpo. É outro corpo e outra pessoa. Como dizia Kahlil Gibran:”os vossos filhos não são vossos filhos. São filhos da vida que há em vós… Apesar de estarem convosco, não vos pertencem”. As novas tecnologias parecem confirmar a intuição deste profeta budista, sufista e cristão. Universal. António Rego


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