Por muito que a gente queira, não pode deixar de falar daquilo que nos acontece. A questão reside, muitas vezes, na importância dos acontecimentos, na sua proximidade e no significado profundo que escondem, para além do ruído circunstancial de aparente evidência que ostentam.
Temos, por assim dizer, os ouvidos cansados da palavra terrorismo, mesmo aqui à porta, na vizinha Espanha. Mas nunca, como agora, os atentados terroristas estiveram tão próximos de nós. A ETA era uma espécie de entidade abstracta, claramente condenada, mas sem consequências visíveis e imediatas para nós ou para o resto do mundo. Ou, talvez, à força de ouvirmos falar da aproximação do lobo perdemos-lhe o medo e deixámos de gritar.
Mesmo sem estarem clarificados por inteiro os autores do atentado de Madrid do passado dia 11, começamos a perceber que se abre um novo cenário de risco para nós, não tanto por sermos vizinhos de Espanha, mas por sermos membros da Europa, a porta real que parece ter sido arrombada. Mas, ou a história foi mal contada pelos media, ou deu-se uma transição demasiado brusca do pranto para a festa, como quem se sente”vingado” com o castigo infligido ao governo cessante. Em apenas quatro dias o mundo deu voltas a mais e, sobretudo, cumpriu o grande desiderato de qualquer pretensão terrorista: alterar o procedimento dos alvejados, para além da chacina que produz. E, neste caso, os terroristas, ou alguém em nome deles, já se orgulharam de terem alcançado o que pretendiam. Todos os analistas foram unânimes em reconhecer que o morticínio de Madrid alterou o resultado das eleições.
Tudo isto se prende com a maturidade da opinião pública que, mesmo observadora atenta dos factos, não pode andar em dobadoira de sequências imediatas e mediáticas. Nesta, como noutras matérias, a Igreja pode e deve ajudar ao discernimento dos diferentes sinais.
Não está em jogo qualquer juízo sobre a opção política dos espanhóis. Mas não deixa de ser preocupante a rotação rápida de quatro dias que só o tempo dirá como, e se, realmente, mudaram o mundo…espanhol e europeu.
António Rego