Editorial

Terramoto e Congresso em Lisboa

António Rego
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Os congressos não têm grande fama. São por vezes acontecimentos diletantes, testemunhos de finas teorias sobre qualquer tema, com traduções simultâneas e gente a dizer que sim quando passa a câmara de televisão a captar assistência. Com um pouco de sorte, dois anos depois surgem publicadas as actas que já apanham esmorecido o entusiasmo inicial, ou mesmo em comprovação de que fazer discursos é uma coisa, transformar as vidas é outra. Nesse sentido, o que ora se realiza em Lisboa, depois de Viena e Paris, e antes de Bruxelas e Budapeste, é outro acontecimento. É um movimento, um dinamismo eclesial que se confronta com o ritmo do próprio mundo urbano e se questiona e o questiona nos porquês da distância e da aproximação, nos amuos e nos afectos, nos caminhos por andar no encalço duma troca generosa e desarmada de aprendizagens. O que a Igreja tem para oferecer é apenas Cristo. O Congresso de Lisboa tem uma particularidade: vive do discurso experimentado e celebrado e não apenas de teoria académica sobre o Evangelho e a urbe. Segue o itinerário duma inquietação pastoral que não tolera distâncias primárias entre a Igreja e o nosso mundo. Pretende, do lado da Igreja, atravessar a cidade com as tochas luminosas do Evangelho, sem conflito com o tecido moderno, diríamos mesmo, pós-Pombalino, que alterou a configuração de Lisboa, mas também todo o seu modo de estar perante o mundo e a Igreja. Já percebemos que o Terramoto de Lisboa não apenas destruiu e motivou a reedificação de grande parte da Capital Portuguesa. Fez estremecer a Europa. Lançou relações novas entre a Igreja e a sociedade, com a expulsão dos Jesuítas, o controle das escolas, uma nova presença da Igreja e do religioso na sociedade. Duzentos e cinquenta anos depois ainda vivemos a réplica desse sismo e muitas vezes fechamos as análises em pessoas e factos estreitos que antes se deveriam enquadrar nos movimentos telúricos das placas da história. O presente Congresso sobre a Nova Evan-gelização não é um novo terramoto para Lisboa. Nem é apenas uma festa. Mas, como diz com lucidez o Cardeal Patriarca, “é um momento duma peregrinação, dum caminho que queremos percorrer… A força da Igreja reside na unidade entre a sua visibilidade e a dimensão misteriosa e invisível… Lisboa tem alma própria†. Não é um acontecimento académico. São mil formas de dizer a cidade e a fé. António Rego


Reflexo