Editorial

Um poeta do Evangelho

António Rego
...

A celebração do Jubileu Episcopal do Patriarca de Lisboa foi, para além de um olhar respeitoso e terno da Igreja em Portugal para um homem invulgar de talento, fé e sensibilidade, um tempo para o olhar perspicaz e corajoso sobre os sinais dos tempos e um conjunto de aquisições do maior acontecimento eclesial do século XX que foi o Concílio Ecuménico Vaticano II. Recordar a nossa história nas suas raízes profundas, na sua matriz cristã, entrosar os elementos culturais e religiosos que os tempos e as gentes foram tecendo, reconhecer os teólogos, poetas e santos que nos precederam e ritmaram os mares navegados e os caminhos por abrir, lembrar os embarques sucessivos no eterno cais que é Lisboa; compreender os ventos e mudanças que deram outras referências e achegas aos múltiplos fenómenos de hoje ainda por explicar; olhar o mundo como “um lugar do Evangelhoâ€, dialogar com a cultura contemporânea, integrar a inteligência e o coração na leitura da história una de Deus e do homem; tratar a modernidade com o mesmo respeito com que se trata a tradição; perceber que, em tempo de globalização, “as religiões se cruzam nas mesmas praças, Deus ouve a oração de todos os crentes, todos podem rezar em conjunto ainda que não da mesma maneiraâ€. Deste escrito, nem sei o que me pertence, o que foi ouvido ou apenas é reinventado. O certo é que “não lerá o Evangelho na história quem não lê a história no Evangelhoâ€. Os 235 textos do Cardeal José Policarpo incluídos nas Obras Escolhidas são o memorial vivo dum homem que olha o cristianismo com um fascínio constante, vê a história repassada de Deus, enfrenta alegre e corajosamente a cultura contemporânea, junta com invulgar harmonia a inteligência e o coração, e não teme revelar a paixão do amor que dinamizou toda a sua vida. As homenagens que lhe foram prestadas, em vez de um mero exercício reverencial, converteram-se num serviço de reflexão sobre a Igreja, o tempo, a cultura, a modernidade. E não foi menos importante o fio de simplicidade “da fé tornada cultura†que percorreu todas as palavras e gestos que este homem, de Deus e dos homens, soube transmitir no seu Jubileu Episcopal.

Reflexo