Entrevistas

Cantar o que não se vê

Agência Ecclesia
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São várias as iniciativas ligadas à música que, ao longo do verão, procuram transmitir uma mensagem de interioridade e fé

São várias as iniciativas ligadas à música que, ao longo do verão, procuram transmitir uma mensagem de interioridade e fé através de palavras, mas também de espaços de oração e silêncio, como acontece com a próxima edição do Festival Jota, em Braga, dos dias 20 a 22 deste mês. Uma realidade que merece o olhar atento do padre Jorge Castela, da Banda Jota, que há vários anos acompanha e participa nestes eventos.

Agência ECCLESIA – Como avalia o atual cenário da música cristã em Portugal?

Padre Jorge Castela – Na realidade, não é que estejamos bem. Relativamente há 20 anos estamos um bocadinho melhor, há maior quantidade de bandas e de grupos cristãos ou católicos. Penso que para isso contribuem também os festivais e as oportunidades que, a nível da pastoral juvenil, têm bandas deste cariz, mas mesmo assim temos muito por fazer. Notou-se mesmo uma certa quebra, no ano passado, pelo facto de não ter havido Festival Jota [decorreram as Jornadas Mundiais da Juventude, em Madrid]. Por outro lado, se é difícil viver da música, mais difícil ainda o é nesta área, não é uma vida fácil em Portugal, neste momento.

 

AE - Esta dificuldade de afirmação passa pela falta de ouvintes?

JC – Estou plenamente convencido de que a mensagem de Jesus, por si tão excelente, sendo utilizada e comunicada com música mais excelente se torna, porque este é um veículo privilegiado para chegar às pessoas. Comunicar assim a mensagem mais importante do mundo, a Palavra de Deus, é meio caminho para chegar ao coração.

Este é um estilo de música que leva a mensagem cristã para concertos, CD, direcionada para gente mais jovem, entusiasta.

 

AE – A música tem uma vocação de cantar o invisível…

JC – As coisas de Deus não precisam de ser muito visíveis, aliás, toca-se o coração sem muitas vezes se saber bem o motivo. Este estilo de música [de inspiração cristã] passa uma mensagem sub-reptícia, que chega mais facilmente: há melodias que pegam, que as pessoas cantam e é da Palavra de Deus que se trata, de facto.

AE – Por onde passa este esforço de adaptar uma espiritualidade, um apelo de silêncio, compondo e recompondo músicas sobre algo que é, por natureza, interior?

JC – Penso que, a esse respeito, é preciso dar um salto qualitativo, porque até é perigoso cantar uma letra e não pensar na profundidade daquilo que se está a transmitir. Alguns preocupam-se pouco com isso e é preciso estar qualquer coisa, por trás, uma espiritualidade profunda. As melhores músicas surgem de momentos de oração e alguns artistas têm mesmo um estilo intimista, de oração, e aí é mais fácil identificar essa espiritualidade.

Costumo dizer que o trabalho que se faz a este nível tem de ser completamente de evangelização, senão não valeria a pena: já há muita gente a fazer música por fazer.

 

AE – Em eventos com grande concentração de pessoas, como é que se procura conciliar a busca e a oferta de espaços de silêncio com a agitação de um festival e todas as suas atividades?

JC – Quem se inscreve, sabe à partida para o que vai e pode recorrer a todos esses momentos. O que se procura criar é um sentido comum, que muitas pessoas já têm, com uma série de espaços que levam à atualidade. Há também momentos de oração, celebrações e não podemos esquecer que ser Igreja é ser comunhão: contrariamente a outros festivais de verão, em que as pessoas vão assistir a qualquer coisa, aqui nota-se essa comunhão.

 

AE – O que fica destas experiências de verão?

JC – Há duas realidades a ter em atenção nestes eventos: algumas pessoas vão ver, estão a iniciar uma caminhada e, a partir dali, há um clique, permitindo-lhes inserir-se mais facilmente num percurso de fé; por outro lado, há aqueles com um rumo mais profundo, organizado e que vêm num encontro como este o culminar de uma etapa.