Entrevistas

Carmelo de Coimbra na hora da despedida

Agência Ecclesia
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Poucos dias antes da trasladação dos restos mortais da Irmã Lúcia para a Basílica de Fátima, a Prioresa do Carmelo de Coimbra, Ir. Maria Celina, revela à Agência ECCLESIA o que sente a comunidade pela partida da Vidente de Fátima

Agência ECCLESIA - Que importância teve, para as irmãs, a permanência do corpo da Irmã Lúcia no Carmelo de Coimbra? Irmã Maria Celina - Claro que foi de muita importância para nós esta permanência, pois por vivermos uma vida de fé, isso não anula a sensibilidade, pelo contrário, na clausura a sensibilidade apura-se muito mais. O facto de termos dentro do recinto do Mosteiro o cemitério onde ficam aquelas a quem o Senhor abre as portas da Vida, ajuda-nos a viver uma nova relação na "presença da ausência". Sabemos que agora a Irmã Lúcia não está ali. Mas está aquele corpo no qual ela viveu, sofreu, amou e viu algo do que agora vê em plenitude. Por ali passamos muitas vezes ao dia e outras ali vamos de propósito para uma visita, ao visitarmos o Sacrário que fica a poucos metros desse "relicário". Tem sido uma forma de continuarmos com ela… Teria sido muito doloroso para nós se tivesse ido para Fátima logo após a sua morte. É certo que vamos sofrer uma nova despedida, um novo desprendimento... Na sua descrição da subida do Monte Carmelo, S. João da Cruz diz-nos que para uma subida mais rápida e perfeita é preciso não se apegar nem aos bens da terra nem aos bens do Céu. Então, vamos aprender a viver com ela na dimensão da fé, embora doa à sensibilidade, desprendidas de referências materiais, com os olhos postos na eternidade. Parece-nos ainda escutar o que ela muito gostava de cantar: "O Céu é minha morada…" Lá nos reencontraremos. AE - Que sentimentos preencheram os dias seguintes à sua morte? IMC - Muita saudade! Aquela cela visitada com tanta assiduidade e agora vazia, era para nós uma lembrança dolorosa. Faltava-nos algo muito importante e que fazia parte da nossa vida. Estar com ela era já tão habitual! Instintivamente aconteceu-me várias vezes dirigir-me para a cela dela para lhe fazer uma visita, como costumava sempre que interrompia algum trabalho… mas não estava lá!... Agora continuamos a visitá-la e será sempre um lugar das nossas peregrinações. AE - Sentem responsabilidades por serem as testemunhas e as herdeiras de muitos anos de vida de Lúcia, a vidente de Fátima? IMC - Sim, foi connosco que ela viveu a maior parte da sua vida e nós fomos recebendo quase sem nos darmos conta gota a gota a sua espiritualidade. Dentro de uma Ordem já de si profundamente mariana, a Mensagem de Fátima não teve dificuldade em entrar, pois o que Nossa Senhora pediu, é o que a nossa Regra nos propõe como fundamental para a nossa vida - oração e penitência, vida de união com Deus, de adoração e reparação em favor dos irmãos. A Irmã Lúcia viveu connosco um mesmo carisma ao mesmo tempo que vivia o que a Senhora pediu, sem se ver obrigada a fazer nenhuma "sobreposição", pois tudo caía natural. Ela foi para nós exemplo dessa vivência, que nós sempre guardaremos como ponto de referência. AE - O processo de canonização da Irmã Lúcia poderá iniciar. Que importância tem ver declarada a santidade da Irmã Lúcia? IMC - Quando uma pessoa é canonizada é apresentada como modelo e a sua vida traz-nos sempre uma mensagem. Um santo fica a ser pertença de todos. No caso da Irmã Lúcia, assim como acontece com os já Beatos Francisco e Jacinta, uma canonização é mais um selo na veracidade das aparições de Fátima e será um impulsionador da Mensagem. Numa canonização quem beneficia somos nós, mas tudo deve ser canalizado para a glória de Deus. AE - A transladação dos restos mortais da Irmã Lúcia altera a proximidade e o carinho que as Irmãs do Carmelo de Coimbra expressam pela Irmã Lúcia? O que fica diferente? IMC - Continuaremos muito irmãs e ela continuará a fazer parte da nossa comunidade espiritualmente. A partir da sua morte ficou diferente a forma de nos relacionarmos; agora será mais radical, o que nos levará a desprender-nos mais da terra. Mas ela será sempre a "nossa" Irmã Lúcia. AE - A tumulação da Irmã Lúcia no Santuário de Fátima poderá fazer crescer a veneração dos fiéis pela vidente de Fátima? IMC - Não digo que faça crescer, pois sou testemunha que essa veneração é já muito grande desde há muitos anos. O que vai facilitar é haver visitas dos fiéis à sua sepultura e certamente com muita afluência, o que aqui não podia acontecer. AE - Que memórias da Irmã Lúcia permanecem no Carmelo de Coimbra? IMC - No coração de cada irmã permanecerá para sempre a memória viva dos anos que a cada uma foi dado partilhar com ela esta proximidade; na casa ficam inúmeras referências à sua pessoa, direi que toda a casa é uma relíquia. Por todos os lados por onde nos movimentamos, temos dela alguma lembrança, seja dentro de casa ou no jardim, ficando como coração de todos os espaços que a lembram, a sua cela, o pequeno santuário da Carmelita, o lugar da maior intimidade com o Senhor. Foi aí que a Mãe a veio buscar para a levar para a Pátria há tanto tempo desejada.


Pastorinhos de Fátima