Entrevistas

Famílias chamadas a caminhar juntas na construção de um futuro melhor

Paulo Rocha
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Casal coordenador do Departamento da Pastoral Familiar da Igreja Católica em Portugal apresenta a Semana da Vida 2013, iniciativa que decorre até ao próximo domingo

Agência ECCLESIA (AE) – Em que é que consiste s Semana da Vida, iniciativa dinamizada pelo Departamento da Pastoral Familiar?

Luís Lopes (LL) – A Semana da Vida nasceu em 1994 por iniciativa do Santo Padre João Paulo II para chamar a atenção sobretudo para as questões ligadas à vida, nomeadamente o aborto e a eutanásia, mas também a situação das famílias e a necessidade de repensarmos a vida.

Este ano a Semana da Vida tem como lema “Dá mais vida à tua vida”, no sentido em que é preciso fazer um esforço para a Pastoral da Família e também realçar a importância das famílias na nossa sociedade que, com esta crise estão a ser tão afetadas.

E portanto queremos redescobrir forças neste amor que nos une, das famílias, para que possamos transmitir uma mensagem mais positiva, um olhar mais positivo sobre a vida, e ter mais esperança, sobretudo porque estamos a celebrar o Ano da Fé, também quisemos ligar a isso.

A renovação do Concílio, agora também a eleição do novo Papa, Francisco, há imensos motivos. Ainda por cima, esta Semana da Vida tem caraterísticas muito especiais, porque é no mês de maio, porque está sempre ligada ao dia 15, que é o dia internacional das Famílias, mesmo no centro d um mês muito especial, mês de coração, mês de Maria, dias depois do 13 de maio, num quadro litúrgico muito importante que é a Páscoa, este ano começou no dia 12 da Ascensão e que vai terminar no dia 19, dia de Pentecostes.

 

AE – Acaba por ser um tempo de vida.

LL – Exatamente.

 

AE – Esta semana nasceu, como disse, muito ligada à defesa da vida, no seu início e no seu fim. O contexto de crise, o contexto atual, faz com que esta dinâmica de defesa da vida tenha de incidir sobretudo em outros momentos da existência?

LL – O aborto e a eutanásia continuam a ser problemas gravíssimos, mas hoje a questão da natalidade, o inverno da natalidade é muito preocupante, esta rutura da família tradicional, natural chamemos-lhe assim, para outras formas artificiais, e também esta cultura de morte onde vivemos, onde estão a pôr em perigo o futuro da humanidade.

Temos de equacionar e também apresentar soluções, pela positiva, para esses problemas novos.

 

AE - Esta inspiração num quadro litúrgico, num quadro de fé, ajuda a que alguns horizontes mais sombrios que possam existir para a vida, para a família, possam ser ultrapassados?

Fátima Lopes (FL) – Penso que sim, porque a Semana da Vida realça as boas práticas das famílias e essa é a nossa intenção, dar a conhecer, mobilizar as famílias.

Bento XVI dizia que as famílias tinham de se mobilizar numa cultura e numa política da família e que isto tinha de ser feito de uma forma organizada. O nosso pequeno contributo é de começar a organizar um bocadinho estas boas práticas.

 

[[v,d,3946,]]AE – Quais são essas boas práticas, em que é que consistem?

FL – Coisas muito simples, que as famílias fazem, rezar em família, terem um jantar de família, visitar os idosos.

LL – Ou se não for visitar, contatar os idosos, porque há 80 por cento de idosos que estão em lares que não são visitados. Como dizia Jesus, temos de ir aos doentes, aos que estão na prisão, aqueles que estão cativos, os vizinhos em casa que não podem sair à rua, visitá-los, também a Semana da Vida é feita com estes gestos.

FL – Essas boas práticas são um incentivo a outras famílias, coisas muito simples que muitas vezes fazem sair daquilo que é circunstancial. Nós muitas vezes, em termos das famílias, temos muitas preocupações, a educação dos filhos, as questões financeiras, económicas, que hoje estamos a passar.

E isto dá um bocadinho de alternativa, é uma pequena luz para as pessoas poderem dizer: podemos celebrar as coisas de uma outra forma e dar um sentido à nossa vida – dar mais vida à nossa vida, isto é muito importante.

 

AE – Esta temática da vida é proposta para que se reflita precisamente no espaço familiar?

LL – Sim mas não só, é a primeira vez que, como responsáveis do departamento, estamos a levar isto para a frente, com uma enorme ajuda das dioceses e de muitos movimentos, e portanto nós quisemos tocar as várias dimensões.

Dar mais vida à tua vida, ou seja, o indivíduo é fundamental nesta história da salvação, mas depois a família, depois a paróquia, os movimentos, as dioceses, há imensas iniciativas em todas as dioceses, em quase todas temos notícia de iniciativas, muitas paróquias estão a pegar nas sugestões que demos, o mês de maio também é o mês do rosário e portanto muitos grupos fazem a oração do terço.

Podem aproveitar as sugestões que também damos no guião, que penso que está a ser noticiado. Esse guião está disponível na página da Conferência Episcopal e na do departamento.

 

AE – São conteúdos que estão disponíveis no site leigos.pt.

LL – Exatamente. Portanto quisemos que todo o panorama da vida, desde o individual ao coletivo, ao comunitário, ao paroquial, fosse tocado.

 

AE – Que capacidade existe, com estas ou outras iniciativas, para intervir ou para transformar por exemplo famílias que estão no desemprego há muito tempo, que estão afetadas pelo contexto que vivemos, onde a sobrevivência acaba por ser a palavra de ordem?

LL – Creio que a fé move montanhas, portanto nós somos pessoas de fé, temos de fortalecer a nossa fé.

 

AE – Também ajuda a conquistar emprego…

LL – Também e de facto temos de pedir muita ajuda a Deus para que nos ajude a encontrar outra luz para que possamos caminhar e desenvolver essa sensibilidade ao próximo, ao vizinho que está a passar por dificuldades, porque muitas das vezes essas dificuldades são envergonhadas.

Nós apelamos nesta semana da vida sobretudo que olhem para essas situações, que as encontrem.

É evidente que a solução não vem só dos responsáveis, muitas vezes nós confiamos demasiado nas instituições internacionais, muito grandes, a família pode encontrar boas soluções e entre as famílias podem-se encontrar boas soluções.

Nós aqui também damos atenção à questão da prevenção e da formação dos noivos, dos namorados, e apelamos muito aos jovens, em colaboração com os departamentos da educação e da juventude.

A Semana da Vida não é só uma questão da pastoral familiar, é uma questão para ser vivida por toda a Igreja, queremos que a Igreja seja uma família de famílias e que se reúna a celebrar esta Semana da Vida.

FL – Parece-me que é importante sublinhar a experiência do voluntariado na família, que ela própria pode ser voluntária em pequenas experiências dessas, em que se conhece um ou outro casal que vive com dificuldades.

Muitas vezes nós dizemos que há muita pobreza envergonhada, mas também há muita que é evidente e que nós não chegamos lá, ficamos indiferentes.

E eu acho que é cada vez mais necessário envolver a família neste espirito voluntário em cadeia de fazer o bem uns aos outros, isso começa a ser fundamental porque é na medida em que damos aos outros que percebemos aqui o sentido da vida, a nossa vida ganha mais sentido.

Aquele caráter às vezes egoísta do voluntariado, em que nos sentimos tão bem que nos damos aos outros, é extremamente importante e a família pode fazer essa prática, se ajudar, como nós fazemos durante esta semana, a estabelecer estes laços entre as pessoas. Depois é para continuar.

 

AE – Esta iniciativa e outras que desenvolvem podem ajudar também a uma própria reorientação das prioridades no interior da família. O sentido que se pode dar à existência pode ser a grande mais-valia.

LL – Exatamente, por isso mesmo estes materiais que fizemos, também é bom dizê-lo, foram uma receita caseira, o cartaz, o guião, tudo nasceu da iniciativa dos elementos do departamento, com essa perspetiva e com a ajuda do Espirito Santo, claramente.

Mas se dermos profundidade ao mais, à Cruz, percebemos que a vida também tem a ver com o pegarmos na nossa cruz e ajudarmos os outros a levarem a sua cruz.

E portanto, é esse o convite que fazemos, de nos ajudarmos uns aos outros e buscarmos as receitas caseiras, não só para o jantar de dia 15, Dia Internacional da Família, mas também outras receitas caseiras para, na paróquia, nas famílias amigas, na sua própria família, não estarem à espera de receitas vindas do céu ou do governo ou de quem quer que seja.

 

AE –Folheando este guião, há iniciativas concretas que propõem ao longo da semana. Quais são elas?

LL – Temos no final sempre a base, a recitação do rosário.

 

AE – São dinâmicas de oração essencialmente para a família?

LL – Exatamente, mas depois, sobretudo no segundo dia, a oração em família. Voltamos novamente, porque também no primeiro dia, 13 de maio, temos de ensaiar orações, as tais soluções caseiras, em família.

Terça-feira a seguir é para divulgar pelos amigos, termos esta questão pelas redes sociais, pelos emails, por sms, mandar mensagens a desejar uma boa semana da vida e a lembrar que no dia seguinte é o Dia Internacional da Família. Nesta quarta-feira nós temos também a refeição com a receita caseira típica da família.

 

AE –Sugerem alguma?

LL – Não, o que nós pedimos é que nos enviem as receitas que cozinharam para esse dia.

 

AE – Portanto a ideia é cada família criar uma receita específica para esse dia?

LL – Ou ter, porque há a receita da avó, biológica ou não, mas cozinhar nesse dia e depois enviarem-nos para o email do departamento, famílias@leigos.pt. De facto, queremos recolher isso e talvez para o ano possamos fazer um livro de receitas, porque de facto as pessoas reúnem-se á volta da mesa mas também da comida.

No dia seguinte (quinta-feira), temos a preocupação das vocações, lembrar que a Igreja, e a pastoral geral da Igreja, são daqueles que são chamados. Sentir no nosso coração que somos chamados, como família e cada um em si, e muitas vezes as famílias acolherem também as vocações consagradas, ou seja, terem capacidade para acolher essas vocações.

 

AE – E a sexta-feira, dia 17?

LL – É dedicada àquilo que também já falámos, ligar à família, sobretudo aos mais idosos ou então um tempo de namoro do casal, porque também é muito importante que os casais se encontrem, tenham um gesto particular, um tempo de namoro, e se possível também com os filhos e com os mais idosos. É um dia dedicado a gestos em família.

FL – Penso que também é importante porque chama a atenção para a família ficar reunida em casa. A questão da casa é cada vez mais importante, porque é na casa que nós vivemos a nossa intimidade e é importante viver essa experiência, porque muitas vezes temos muita coisa, os filhos e os pais, e as pessoas dizem que não têm tempo para se encontrar.

É preciso começar a criar essas raízes com a casa, de modo também a construirmos na nossa sociedade a nossa casa, temos de começar pelas células mais pequenas.

 

AE – Depois a semana termina de facto nessa festa do Pentecostes.

LL – Temos propostas também para a vigília, creio que já falámos também das orações que propomos, nomeadamente da oração dos fiéis, muitas paróquias têm, ou em família ou em paróquia, de recitar o terço e portanto temos aqui sugestões concretas para esta semana.

Esperamos que de facto esta semana da vida também seja o arranque para uma caminhada de fé.

Estamos no Ano da Fé e que temos como horizonte em outubro a peregrinação a Roma, porque as famílias de todo o mundo vão reunir-se em Roma com o Papa Francisco, a 26 e 27 de outubro, e estamos já a propor uma caminhada de fé para que as famílias continuem a aprofundar a sua fé.

 

AE –Até que ponto é que estas iniciativas têm de ser vividas em ligação com o trabalho, com a escola. A família não é uma instância isolada, está em relacionamento com as estruturas do dia-a-dia, onde estão pais, filhos, avós, etc. Que mais valia é que estes contributos têm para a valorização da família?

 FL – Acho que é muito importante, até porque a família tem de aprender a educar-se, em todas as instâncias em que vive, em todas as dimensões, e sobretudo a família tem de começar a inquietar-se com a sociedade onde vive, nomeadamente as famílias cristãs, que muitas vezes reclamam, dizendo que a sociedade está desta ou daquela forma, é preciso começar a ser interveniente na sociedade.

Os cristãos têm propostas, novas lógicas de humanidade, a Igreja em Portugal tem um sentido, uma prestação de serviço muito grande para a sociedade e os cristãos não podem silenciar este direito a viver com mais vida.

 

AE – É a luta contra a indiferença de que há pouco falava…

FL – Lutar contra a indiferença e sobretudo afirmar aquilo em que acreditamos, porque é muito mau quando sabemos coisas que são muito importantes, que fazem as pessoas mais felizes, e não as divulgamos.

 

AE – No texto introdutório ao guião da semana fala-se de um quadro cultural que é reconhecidamente desfavorável a esta cultura da vida. Que radiografia é que fazem nesse sentido?

LL – Já várias vezes dissemos que esta economia não é amiga da família. As pessoas andam preocupadas com outras coisas e às vezes esquecem o fundamental, a pedra angular.

Realmente, a família precisa de condições, de um ambiente social favorável, de uma cultura de vida para poder ser estável, educar os seus filhos, ter uma certa estabilidade.

Estamos num tempo de grandes mudanças, mas se não há coisas estáveis, coisas sólidas, é tudo gasoso, de facto as coisas não têm sustentabilidade e nós corremos esse risco, de vermos a implosão da Europa, de uma economia, e portanto para salvaguardar isso temos de fazer esta pedagogia, esta prevenção, e portanto reforçar os laços de família, fazer os jovens acreditar que o casamento é uma coisa maravilhosa, - é das coisas mais bonitas viver um grande amor - e para isso é preciso trabalhar.

Também é um dos temas que vamos continuar a trabalhar porque vem do encontro mundial de milão, dedicado à festa e ao trabalho, e nós no primeiro ano fizemos sobre a festa, sobre a eucaristia, e agora vamos sobre a dignidade do trabalho.

Aqui nós temos de trabalhar quer profissionalmente mas também na educação dos filhos, trabalhar comunitariamente, pormo-nos a ajudar, a encontrar soluções e as tais receitas caseiras podem trazer muitas ajudas para estes tempos de crise.

 

AE – Há pouco falou dessa peregrinação a Roma, em outubro. É a próxima grande atividade que o departamento promove?

LL – Estamos a construir e vamos construir com as dioceses e com os movimentos, uma caminhada no sentido de aprofundar a fé e vivermos também o Ano da Fé com essa dimensão, e depois teremos também as nossas jornadas em outubro, que vão reforçar isso, que será no fim-de-semana antes, 19 e 20 de outubro, em Fátima.

E portanto queremos que as pessoas aprendam a fazer essa caminhada, a união faz a força, só unidos é que nós poderemos encontrar respostas adequadas para os momentos difíceis que estamos a viver.

 

AE – Qual será a importância e o significado de Fátima e desse encontro de famílias de todo o mundo com o Papa Francisco?

FL – Vai ter um significado muito importante, também porque é o primeiro encontro do Papa Francisco com as famílias. Depois, eu penso que é importante dizer que todos estes esforços do departamento servem para unir as próprias dioceses, os movimentos, eu acho que isso é fundamental.

Muitas vezes os movimentos, as dioceses, as paróquias encontram-se muito fechados, acham que a sua parcela de salvação encontra-se ali naquele local geográfico, quando de facto a Igreja é muito grande.

Temos de estabelecer outras pontes e divulgar o que as dioceses fazem, todas fazem coisas ótimas, que as dioceses tenham também essa humildade de serem capazes de divulgar aquilo que fazem e as paróquias também.

Penso que é muito importante criar aqui um movimento nacional mais organizado que tenha uma política comum, em termos daquilo que se pretende para a família.

 

AE –Ainda sobre esse encontro em Roma, quem quiser participar, de que forma é que o pode fazer?

LL - Em breve diremos como é que se pode fazer, temos tido contactos com a revista Família Cristã e com a Rádio Renascença no sentido de preparar essa divulgação, porque é muito importante que a caminhada, a peregrinação, seja também um exercício de saída da nossa zona de conforto.

Os cristãos têm uma cultura de rutura, nós rompemos com o judaísmo, rompemos com o Império Romano, rompemos com muita coisa e portanto, muitas das vezes, e neste tempo de crise, é preciso ser capaz de sair da zona de conforto e unidos, juntos, caminharmos e irmos.

Agora, com alegria, porque esse é também o tema da peregrinação, as famílias com alegria, e portanto é na alegria que descobrimos realmente que podemos fazer uma caminhada juntos.

PR/JCP



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