Entrevistas

Igreja traz olhar humano à cultura digital

Agência Ecclesia
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Presidente do Conselho Pontifício para as Comunicações Sociais (CPCS) esteve em Portugal, a convite do Secretariado Nacional. Em entrevista à Agência ECCLESIA, diz que o Papa e a Igreja Católica se preocupam com o lado "humano" e não apenas tecnológico da nova "cultura digital".

Agência ECCLESIA (AE) – Quais são os principais desafios que se colocam à Igreja Católica numa nova era de comunicação?

D. Claudio Maria Celli (CMC) – O primeiro desafio que temos de enfrentar como Igreja, hoje, é o diálogo com a cultura digital, originada pelas novas tecnologias. Penso que este é um dos pontos mais delicados de compreender: os meios de comunicação já não são um mero instrumento, por causa das novas tecnologias, pois estas mudaram o estilo de vida do homem e da mulher dos nossos dias.

Estas tecnologias já não são apenas instrumentos de comunicação, transformaram-se em ambientes de vida, favorecem a comunicação, um conhecimento de maior alcance, a relação entre as pessoas. Isso, inegavelmente, cria outra perspetiva de vida.

Estes instrumentos são caraterizados pela multimedialidade, enquanto leio o jornal posso ouvir música, posso ter videoconferências continuamente, e isso quer dizer que a minha vida mudou. A Igreja deve enfrentar este desafio com a cultura digital.

AE – O que é que a Igreja deve fazer, nesse sentido?

CMC – O próprio Papa Bento XVI pediu, repetidamente, que desenvolva uma diaconia da cultura, ou seja, compete à Igreja fazer ressoar, no contexto das novas tecnologias, o anúncio daquela palavra de verdade de que o homem de hoje tem necessidade. Nesse sentido, surge o desafio da linguagem, porque as novas tecnologias têm uma linguagem própria, cada uma. Para anunciar o Evangelho – essa é a missão da Igreja – devemos conhecer profundamente essas linguagens próprias, para fazer com que a palavra de verdade ali possa ressoar abundantemente e com clareza.

Há depois uma problemática, da linguagem antropológica, porque o homem de hoje tem uma linguagem própria, ligada à sua realidade existencial. É facilmente imaginável que uma criança tenha problemáticas existenciais diferentes das de um adulto e a Igreja deve ter a consciência de falar a linguagem adequada para poder ser escutada e compreendida. Aqui, na verdade, existe um grande desafio para a Igreja, que é mãe e mestra, que se aproxima com respeito do ser humano e quer acompanhá-lo no seu caminho, consciente das problemáticas que ele transporta no seu coração.

AE – Basta pensar numa alteração de linguagem para abordar este tempo de mudanças?

CMC – Nós comunicamos o que somos, é um estilo de vida. A Igreja deve ter consciência de ser possuída pela verdade e deve ajudar o homem nesta busca e acompanhá-lo, para comunicar os valores. Aí então teremos uma Igreja que compreende o homem, que o procura conhecer, estar ao seu lado, num serviço discreto e respeitoso, mas verdadeiro, do anúncio da palavra que não é dos homens, mas de Deus.

AE – O tema escolhido pelo Papa para o próximo Dia Mundial das Comunicações Sociais parece sair do âmbito de preocupações com as novas tecnologias.

CMC – É um tema desafiante: «Silêncio e Palavra, caminho de evangelização». Mas não sai desse âmbito: nas outras mensagens, o Papa tocou de forma atenta, precisa, o tema das novas tecnologias e da cultura digital, lembrando continuamente o tema humano, porque a comunicação é um homem que se dirige a outro homem ou então à comunidade de homens.

O Papa quer tocar um tema muito delicado, que é o da escuta, o silêncio que não é negação de vida, isolamento, abstração da realidade, mas uma atitude positiva, de disponibilidade, porque o diálogo tem necessidade não só de alguém que fala, mas também de alguém que escuta.

Há necessidade de que o homem volte a saborear o valor positivo do silêncio, porque hoje, na nossa sociedade, estamos submergidos por vozes e as pessoas não sabem discernir qual é a voz que conta, qual é a palavra que tem valor para elas. Assim, este silêncio é discernimento, criando critérios capazes de valorizar, exatamente, o que significa colocar-se à escuta do outro, do Outro [Deus].

Penso que o Papa escolheu este tema porque em outubro de 2012 vai haver um Sínodo de bispos dedicado ao grande tema da evangelização. Evangelizar é anunciar a palavra, no contexto de hoje, ao homem de hoje, o que exige escuta, não só de quem recebe a mensagem, mas também de quem a propõe, porque a Igreja deve estar continuamente à escuta do que o homem tem no seu coração, o que deseja. Diria que aqui entram os grandes temas da solidão, das dificuldades da vida, da inquietude, da falta de sentido para a vida, do afastamento dos grandes valores e, ao mesmo tempo, uma profunda nostalgia de Deus.

AE – No âmbito dos trabalhos do Conselho Pontifício, nota-se uma maior colaboração com os órgãos de informação do Vaticano.

CMC – Sim, particularmente com a grande iniciativa que foi a abertura do portal «news.va», com o qual conseguimos um certo sucesso. Estamos satisfeitos.

Hoje o portal pode ser seguido em três línguas (italiano, inglês e espanhol), mas esperamos estar presentes, até final do ano, em francês e, no início do próximo ano, também em português. É um portal multimédia, que permite ver notícias que dizem respeito à vida da Santa Sé, a começar pelo que o Papa faz, bem como notícias do mundo e da Igreja no mundo, que muitas vezes não se encontram nos media laicos – usemos este termo para nos entendermos.

Penso que este portal pode ser, verdadeiramente, um instrumento de comunicação, que permite ter em tempo real notícias, imagens e sons dos acontecimentos que envolvem a pessoa do Santo Padre. Quem quiser ter uma informação, mesmo inicial, do que somos e do que fazemos, tem tudo à sua disposição neste novo site.



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