Entrevistas

S. Francisco Xavier pela arte

Luís Filipe Santos
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Entrevista a Natália Correia Guedes, Comissária das Comemorações dos 500 anos de Nascimento de S. Francisco Xavier.

Agência ECCLESIA (AE) – Estamos a comemorar os 500 anos do Nascimento de S. Francisco Xavier. Como comissária para estas comemorações que iniciativas destaca? Natália Correia Guedes (NCG) – As comemorações são uma iniciativa governamental – estão envolvidos quatro ministérios (Cultura, Defesa, Negócios Estrangeiros e Economia) – e tiveram o seu início a meados do ano transacto com uma publicitação na Exposição Universal de Aichi, Japão. No Pavilhão de Portugal desta exposição estiveram expostos vários painéis fotográficos, textos e uma publicação sobre a perspectiva cristã relativa à natureza. Depois, o segundo passo foi organizar a exposição «Arte e Espiritualidade» que decorre, desde Novembro passado, na Cordoaria Nacional, em Lisboa. Esta Exposição reúne um conjunto de 30 pinturas e esculturas de artistas consagrados. AE – Artistas Contemporâneos? NCG – Sim. E dou-lhe alguns exemplos: Siza Vieira, José de Guimarães, Emilia Nadal, Pe. João Marcos. Por outro lado, há uma série de 50 obras seleccionadas (pintura, escultura, fotografia, registos sonoros) que foi o resultado de candidaturas a um concurso lançado pelas comemorações. Há um confronto «pacífico» entre os artistas consagrados e os concorrentes. AE – Os artistas aderiram ao vosso apelo? NCG – Considero que foi uma boa adesão porque recebemos cerca de 400 obras de artistas. Sendo a primeira vez que se lança um concurso nacional nesta temática foi uma adesão excelente. Independentemente de serem cristãos ou não, na prática foi um concurso feito em homenagem a S. Francisco Xavier precisamente porque ele se abriu ao diálogo com as outras religiões. AE – Mas nota-se a «semente» cristã nas obras? NCG – Não tivemos a preocupação de testar a adesão a qualquer religião. Ou está expressa no trabalho, claramente, ou de modo mais simbólico. Liberdade total à expressividade; mas entendi que era interessante solicitar a cada um dos artistas uma memória descritiva para comunicar na exposição o que lhe ia na alma quando criou a obra. AE – Para além desta exposição existe também outra subordinada ao tema “S. Francisco Xavier – a sua vida e o seu tempoâ€? NCG – É uma exposição histórica com objectos de arte que envolve pintura, escultura, paramentaria e artes decorativas. Através destas obras proporciona-se uma leitura da vida de S. Francisco desde que sai do Castelo de Xavier (local de nascimento); passando pelo Colégio de Santa Bárbara, em Paris, (onde de formou); a passagem por Itália e adesão à Companhia de Jesus e a viagem até Lisboa (viveu um ano na Mouraria). AE – Uma exposição que percorre vários campos da arte? NCG – No sentido de que não são apenas objectos relacionados com o cristianismo - com a prática e a evangelização que ele vai lançar ou intensificar no Oriente – mas também todas aquelas religiões que ele encontra naquelas paragens. Entendi que era muito interessante – sobretudo para as escolas – entenderem o esforço enorme que ele fez de adaptação, de convivência pacífica e do diálogo inter-religioso. AE – S. Francisco Xavier foi dos pais do diálogo inter-religioso. NCG – Não foi o único mas foi um dos pais deste diálogo. AE – Ao longo deste 500 anos, como é que o homenageado foi retratado na arte? NCG – É muito curioso verificar que desde os finais do século XVI – morre em 1552 – começa a ser representado. Temos pintura sobre tábua (madeira) e também, ao longo do século XVII, pintura e escultura proveniente de todas as dioceses portuguesas. AE – Quer dizer então que a devoção a S. Francisco Xavier ia do Minho ao Algarve? NCG – Deve-se também à expansão da Companhia de Jesus. Aliás, na exposição temos uma base de dados que demonstra bem esse facto. Uma «base» que se refere à arquitectura jesuítica, com umas dezenas largas de indicações de casas, colégios, residências e igrejas directamente relacionadas com a Companhia de Jesus, por todo o país. AE – S. Francisco Xavier teve também um papel preponderante no levar o nome de Portugal além fronteiras. NCG – Talvez tenha sido dos missionários mais empenhados em divulgar a missionação pela mão portuguesa, atendendo que ele era estrangeiro. Em determinada altura do seu percurso no Oriente, ele escreve uma carta para a Europa – anualmente os jesuítas enviavam uma carta para o provincial – onde relatava que éramos três portugueses mas no fundo eram todos estrangeiros. Ele ajuda e publicita a acção portuguesa e assume-se como «português». Para além deste ponto, S. Francisco Xavier teve também a preocupação de se inculturar. AE – As peças de arte expostas podem ser um modo de evangelização? NCG – Podem e devem ser. Não podemos esperar que a evangelização seja apenas verbal e auditiva. Cada vez mais, a expressão visual é importante. Faz parte da educação de qualquer criança a arte e a expressividade nas suas diversas manifestações. AE – Olhando para a história da Igreja, a arte foi sempre uma prioridade? NCG – Especialmente, numa época em que o analfabetismo era quase de 100%, esta teve sempre a preocupação de decorar e apresentar nas suas naves «uma história aos quadradinhos» (Vida de Jesus, história do orago e vida de Nossa Senhora). Uma história contada em pedaços para alguém que era analfabeto. AE – Gostaria de destacar algumas das peças presentes nas exposições? NCG – Duas pela sua importância artística – uma escultura com cerca de três metros de altura (do século XVII/XVIII) da Sé Nova de Coimbra e um sacrário de prata, também da Sé Nova de Coimbra, que representa numa das ilhargas S. Francisco Xavier. Não tivemos a intenção de colocar na exposição somente obras primas. Há peças que valem apenas pela iconografia mas não têm grande qualidade estética. AE – Para além destas duas exposições existem mais actividades comemorativas? NCG – Está em estudo uma peregrinação a Goa (Ãndia) - em princípio será dia 3 de Dezembro - , promovida pela Universidade Católica Portuguesa, com o total apoio do comissariado. Estamos também a promover um colóquio – em princípio a realizar em Macau – e uma ligação muito estreita com Navarra (Espanha). AE – Depois do encerramento das comemorações S. Francisco Xavier passará a ser mais conhecido? NCG – Estamos a fazer o levantamento de toda a iconografia de S. Francisco Xavier, independentemente de ser portuguesa ou não. Como não há nenhum museu sobre a Companhia de Jesus era bem interessante que Portugal tivesse essa oportunidade. AE – O nascimento do museu será um dos «filhos» destas comemorações? NCG – Neste momento ainda não estão reunidas as condições.


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