Entrevistas

Sociedade subestima os jovens

Octávio Carmo
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O Irmão Emile, da Comunidade de Taizé, passou vários meses em Portugal, dando a cara pela organização do Encontro Europeu de Jovens. No final da iniciativa, fala à Agência ECCLESIA da aposta em Lisboa e das lições que se podem tirar

Agencia ECCLESIA – A opção por Lisboa foi uma aposta ganha? Ir. Emile - Penso que ainda será necessário algum tempo para recolher as impressões gerais do Encontro, porque numa iniciativa destas só podemos ver aspectos muito parciais. Aquilo que posso dizer, desde já, é que os ecos que nos chegaram são de pessoas muito comovidas pelo acolhimento português. Não podemos esquecer que, se nas comunidades locais havia pessoas com possibilidades de acolher participantes, também houve bairros muito, muito pobres – como Prior Velho – que também quiseram acolher. Os jovens que estiveram nesses locais mais pobres ficaram surpreendidos pelo facto de as comunidades terem querido participar nesta iniciativa e acolhê-los. AE – Que reacções é que a Comunidade de Taizé quis provocar com este Encontro? IE – Quando uma cidade acolhe um Encontro Europeu de Jovens a primeira reacção é sempre a do espanto, penso que isso foi mesmo título de um artigo jornalístico. O espanto está em ver uma juventude que não conhecemos. Aquilo que o Encontro pode ajudar a mudar é este olhar sobre os jovens: muitas vezes, quando falamos na juventude, fazemo-lo para enumerar problemas como a droga, a delinquência, com desconfiança. Estes grandes momentos são consagrados aos jovens que querem construir alguma coisa, que têm esperança. Para nós é importante trazer este olhar positivo sobre os jovens. AE – O espaço dado à espiritualidade ajuda a essa reacção de espanto? IE – Sem dúvida que há um espanto por causa da oração. Para muitos é surpreendente descobrir que a oração pode mobilizar os jovens, tocar o seu coração. Pensamos muitas vezes que é preciso propor aos jovens coisas mais “superficiais†para os atrair e isso pode ser verdade em algumas circunstâncias. A verdade, porém, é que quem esquece estas iniciativas com mais profundidade não conhece bem a juventude: há nela uma busca, verdadeiras questões de fundo que aguardam por uma resposta. Em Taizé há uma mistura entre o “sério†– silêncio, oração, reflexão – e a informalidade, porque não há uma atmosfera de imposição nem lavagem de cérebros. Há o espaço para que cada um encontre alguma coisa e quando chegamos à cidade há, verdadeiramente, a surpresa de constatar que os jovens são verdadeiros seres em busca de Deus, de paz, de esperança. AE – A cidade foi inundada por jovens europeus, sobretudo durante as tardes. Houve a intenção de não os concentrar apenas na FIL? IE – Os encontros temáticos tiveram lugar em muitos locais diferentes e tiveram uma participação muito boa. Procurámos falar sobre temas espirituais como a oração, é claro, mas também sobre a paz, a imigração, a pobreza, a cultura e a história portuguesa. Esta mistura entre a oração e os momentos mais festivos tocou todas as pessoas, mesmo na cidade. AE – É importante apresentar este tipo de propostas? IE – A nossa sociedade, muitas vezes, duvida de si própria, tem medo de não ser capaz de fazer frente aos novos desafios que se levantam constantemente. Por isso mesmo, ela parece olhar sem cessar para os problemas, sem que haja, por outro lado, a capacidade de ver os recursos, as fontes de solução que nela existem. Eu penso que em cada Encontro Europeu podemos ajudar a recuperar a confiança nas fontes de solução que nos são oferecidas para sermos, antes de mais, homens e mulheres de compaixão, de solidariedade, de esperança... Isso é fundamental, hoje em dia, perceber que não somos órfãos abandonados neste mundo, mas que há fontes de esperança: o Evangelho, a oração, a vida em comunhão na Igreja. É tudo isso que aparece num Encontro Europeu. AE – Passar o ano a rezar, nas paróquias, é a marca mais distintiva deste Encontro? IE – Essa opção por grupos mais pequenos, em cada paróquia de acolhimento, visa fazer da vigília de oração e da festa das nações que se lhe segue um encontro mais pessoal, familiar. Quem acolheu os participantes pode estar lá, reconhecer os seus jovens, receber tudo aquilo que eles oferecem. Uma grande multidão anónima, além de poder ser perigosa, não cumpre esse objectivo de simplicidade e de alegria.


Taizé