Cinema: Capitão Phillips
Em Abril de 2009, o cargueiro Maersk Alabama é tomado de assalto por um grupo de piratas somalis a quinhentos kilómetros da costa da Somália. Apesar dos pedidos de socorro do comandante do navio, capitão Richard Phillips, inicialmente desvalorizados, a ajuda não chega a tempo de evitar a tomada de reféns entre os vinte membros da tripulação. Com o passar dos dias o ambiente adensa-se, exigindo de Phillips capacidades inesperadas de comando e altruísmo a fim de evitar o descontrolo total da situação e preservar a vida dos homens que tem a seu cargo. Por eles, dará a vida, se necessário.
Baseado num caso verídico que encheu as páginas dos jornais ao longo de quatro penosos dias e deu origem ao romance biográfico que o próprio comandante escreveu juntamente com o jornalista Stephan Talty, “A Captain’s Duty: Somali Pirates, Navy SEALs and Dangerous Days at Sea”, ‘Capitão Phillips’ é a versão cinematográfica dos acontecimentos dirigida por Paul Greengrass.
Greengrass, que iniciou a sua carreira atrás das câmaras em séries TV e telefilmes, domina bem os ambientes de ação e tensão como bem tem provado ao longo de ‘Supremacia’, ‘Voo 93’ ou ‘Ultimato’. Aqui volta a demonstrar as suas capacidades, gerindo a tensão crescente da narrativa de modo seguro, num ritmo tantas vezes trepidante e com uma capacidade assinalável de ‘mergulhar’ o espetador no centro nevrálgico dos acontecimentos, contagiando-o com a ansiedade vivida a bordo.
Com uma interessante conjugação de estilo documental, maioritariamente favorecido por uma câmara tão vibrante e tensa quanto o clima da ação, o realizador consegue tirar partido do óptimo desempenho de Tom Hanks, naquele que é já considerado um dos seus melhores trabalhos na já bem longa carreira de ator.
Pese embora o facto de este ser um olhar ocidental sobre a pirataria na costa africana, passível de levantar questões sobre os direitos e deveres de navegação, de exploração e circulação de bens a partir de um continente com índices de pobreza, injustiça e desigualdade significativos, sem evidentemente legitimar atos ilícitos, a abrangência do tema é no filme preterida em favor do, justamente, heróico papel do comandante que assume plenamente o seu papel de zelador do navio e dos seus homens.
Colocando a sua própria vida em risco, Phillips é na verdade, no filme como na vida real, um notável exemplo de heroismo e entrega nos nossos dias: no seu firme e destemido compromisso de quase se ‘esquecer de si próprio’ para salvar os outros, e apenas sobreviver para garantir, com o seu discernimento, a redução significativa dos efeitos colaterais que uma situação limite deste género poderia facilmente ter produzido.
Margarida Ataíde
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