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Cinema: Se eu fosse ladrão... roubava

Margarida Ataíde
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Um ano após a morte do cineasta português Paulo Rocha, a Cinemateca Portuguesa apresenta em antestreia o seu derradeiro filme, ‘Se eu fosse ladrão… roubava’. A exibição ocorre no próximo dia 31 às 21h30 e espera-se que percorra outras salas do país, seja em circuito comercial ou cultural.

Construção complexa com referências autobiográficas implícitas, ‘Se eu fosse ladrão… roubava’ é, nas palavras de Jorge Silva Melo, autor do texto que acompanha a divulgação oficial do filme a nível internacional, ‘uma imensa despedida, não com arrependimento, mas com vitalidade’.

Partindo de uma evocação da infância e juventude do seu pai, no início do século XX, do ímpeto e do desejo por tantos portugueses partilhado de procurar no Brasil aquilo que Portugal então não lhes daria, Rocha olha a sua vida, história e identidade, como pessoa e cineasta, entrecruzando família e obra, com o mesmo desejo de procura de um emigrante. Alguém a quem a geografia e biografia terrena não bastaram para se cumprir e se prepara para passar fronteira, deixando para trás o registo do espaço habitado, revisitação e reinterpretação da obra cinematográfica incluídas, e lançando adiante uma enorme interrogação. Uma interrogação tocante e por vezes dolorosa, que destemidamente perscruta a vida, enfrenta a morte, a doença, não se limitando à individualização mas antes ampliando-se ao olhar sobre um país, o que de resto sempre fez no seu cinema.

Nascido no Porto em 1935, Paulo Rocha iniciou a licenciatura em Direito que abandonaria para se dedicar inteiramente ao cinema. Na década de cinquenta, anos antes da fundação da revista ‘O Tempo e o Modo’ mas dentro do mesmo espírito não-conformista e progressista que vibrava num grupo significativo de jovens da Acão Católica de que não fez parte mas de que se aproximou, funda o Cineclube Católico e o Centro Cultural de Cinema, juntamente com Nuno de Bragança, Pedro Tamen, Duarte de Almeida e Alberto Vaz da Silva. O cinema pulsa assim em Lisboa como motor vivo de transformação.

Em 1963, após concluir os estudos de cinema em Paris e ter participado como assistente na realização de Jean Renoir em ‘O Cabo de Guerra’ , realiza ‘Os Verdes Anos’, marco do Cinema Novo português e de pelo menos uma geração de público. Um olhar límpido, corajoso e revolucionário sobre o Portugal de então.

No entanto, para alguns realizadores nacionais, como Joaquim Sapinho ou Raquel Freire, que assim o expressam em testemunho divulgado no ‘Público’ aquando da sua morte, ‘Mudar de Vida’ (1966) é o seu melhor filme, um dos melhores da cinematografia nacional e o mais inspirador para a sua própria obra.

João Salaviza, o jovem realizador das curtas ‘Arena’ e ‘Rafa’ reconhecidas com a Palma de Ouro de Cannes e o Urso de Ouro de Berlim, afirma ter recebido de ambas as obras de Paulo Rocha um legado de cinema como ‘veículo de observação da realidade, apaixonado e comprometido’.

Quase cinquenta anos depois, ‘Se eu fosse ladrão… roubava’ é um olhar a longe e para longe sobre um Portugal de que todos somos parte.

Margarida Ataíde



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