Nacional

A Páscoa de Leste

Octávio Carmo
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Os novos fluxos migratórios trouxeram até ao nosso país usos litúrgicos que até agora nos eram desconhecidos

A Páscoa é a primeira festa cristã em importância e antiguidade, pelo que não admira que já no Concílio de Niceia no ano 325, haja prescrições sobre o prazo dentro do qual se pode celebrar a Páscoa, conforme os cálculos astronómicos (primeiro Domingo depois da lua cheia que se segue ao equinócio da primavera): de 22 de Março a 25 de Abril. Estas datas têm como referência, entre nós, o chamado “calendário gregoriano”, introduzido em 1582 pelo Papa Gregório XIII. Contudo, as Igrejas de rito Bizantino, para a celebração da Páscoa, seguem até hoje o “calendário juliano”, que apresenta um atraso de 13 dias em relação ao nosso calendário civil. Em 2004 dá-se a coincidência de celebrar a Páscoa no mesmo dia, isto é, em 11 de Abril do calendário civil. Em Portugal, são muitos os imigrantes de Leste greco-católicos ou da Igreja Ortodoxa que celebram, muitas vezes em conjunto, de acordo com este rito. Em Lisboa, a celebração da Vigília Pascal para os Ucranianos de rito oriental terá lugar neste sábado, na Igreja de S. Domingos ao Rossio, animada pela Capelania dos Ucranianos. TRÍDUO CONCLUSIVO DA SEMANA SANTA Na quinta-feira, a Missa é celebrada conforme o formulário de São Basílio, usado somente dez vezes durante o ano. Este é mais extenso do que o formulário de São João Crisóstomo, usado habitualmente. O Evangelho que se proclama é composto de uma série de trechos extraídos dos vários evangelistas, sendo a perícope mais longa do ano e compreendendo a narração completa da última Ceia, a traição de Judas e a prisão nocturna de Jesus no jardim das Oliveiras. A cerimónia do lava-pés, que se faz logo em seguida, é reservada às Catedrais, onde o bispo lava os pés de doze sacerdotes. Na noite da Quinta-feira Santa antecipa-se o ofício das Matinas da Sexta-feira Santa, isto é, o “Ofício dos Doze Evangelhos da Paixão”, com grande participação dos fiéis que escutam a leitura segurando na mão uma vela acesa. SEXTA-FEIRA Na Grande sexta-feira não se celebra nem a liturgia eucarística. O Coordenador Nacional do trabalho pastoral com ucranianos, Pe. Bonifácio, revela à Agência ECCLESIA que a partir das 10 horas terá lugar a exposição do “Sudário” – o santo Epitáphion, rectângulo de pano que leva pintada e bordada a figura do Cristo Morto. “Estamos em adoração durante o dia todo e na noite de Sábado também”, explica. A parte mais característica das celebrações é o ofício das Matinas (= órthros) com os célebres Enkómia (elogios). Junto ao sepulcro do Cristo, representado no Epítáphion, a liturgia sugere elogios e lamentações, intercaladas a versículos do salmo 118 e a outros textos. Nas “Matinas de Jerusalém” em que se fazem três leituras vetero-testamentárias e a leitura do evangelho (composição de trechos tirados de Mateus, Lucas e João), dá-se o rito da Sepultura. O Epitáphion, após colocado sobre o altar, é depositado sobre uma mesa (ou túmulo), preparada no centro da igreja, onde permanecerá até o início da Vigília Pascal. VIGÍLIA PASCAL Na Vigília Pascal tem lugar a tradicional “Bênção da Páscoa”, que consiste, como explica o Pe. Bonifácio, “na apresentação de alimentos que são benzidos pelos sacerdotes”. A solenidade da Ressurreição de Cristo possui uma importância única no Oriente cristão e ocupa por si um lugar, acima mesmo das "Doze grandes festas." É precedida por 10 semanas de preparação, cujos ofícios litúrgicos estão contidos no Triódion penitencial, ao passo que as 8 semanas que se seguem à festa da Páscoa - até Pentecostes e ao Domingo de Todos os Santos - estão contidos no Triódion luminoso ou Pentikostárion. A Páscoa é o apogeu do ano litúrgico bizantino: é a "festa das festas," a "rainha das festividades," o "primeiro e oitavo dia"; só para repetir algumas expressões da celebração litúrgica. É essa a razão pela qual ela não está na lista das Grandes festas, pois tudo converge para ela. AS IGREJAS PARTICULARES E OS RITOS O Concílio Vaticano II explica no Decreto Orientalium Ecclesiarum (sobre as Igrejas do Oriente) que tanto no Oriente como no Ocidente há católicos que, “sob o governo pastoral do Romano Pontífice, que sucede por instituição divina a São Pedro no primado sobre a Igreja Universal”, têm diferenças entre si nos seus ritos: “Liturgia, disciplina eclesiástica e património espiritual.” Esta diversidade de ritos, diz o mesmo documento, “não só não prejudica a unidade da Igreja Católica como a explicita”. O rito bizantino, portanto, não significa uma separação de Roma, mas traz consigo uma riqueza espiritual que ajuda compreender e concretizar a universalidade da Igreja. CALENDÁRIO JULIANO É um calendário solar criado em 45 a.C. pelo imperador romano Júlio César para trazer os meses romanos a seu lugar habitual em relação às estações do ano, confusão gerada pela adopção de um calendário de inspiração lunissolar. César impõe 12 meses com duração predeterminada e a adopção de um ano bissexto a cada 4 anos. No ano da mudança, para fazer a concordância entre o ano civil e o ano solar, ele inclui no calendário mais dois meses de 33 e 34 dias, respectivamente, entre novembro e dezembro, além do 13º mês, o mercedonius, de 23 dias. O ano fica com 445 dias distribuídos em 15 meses e é chamado de ano da confusão. Esse calendário começa a ser substituído pelo calendário gregoriano a partir do século XVI - a Rússia e a Grécia só fazem a mudança no século XX.


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